Representantes dos produtores rurais defenderam a aprovação de projeto de lei em discussão na Câmara dos Deputados que prevê indenização para proprietários afetados com a criação de unidades de conservação (PL 2001/19). A possibilidade de pagamento antecipado de indenização a donos de propriedades privadas que virarem unidades de conservação foi debatida nesta sexta-feira (25) em audiência pública da Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável.
A proposta em análise na comissão determina que novas unidades de conservação de domínio público, quando incluírem propriedades privadas, só poderão ser criadas se houver recursos orçamentários para a indenização aos proprietários afetados, e dá prazo de cinco anos para o pagamento, desde a data da criação da unidade de conservação, sob pena de o ato perder validade.
O especialista em direito ambiental, Leonardo Papp defendeu durante a audiência pública que a instalação de uma unidade de conservação deve considerar os danos patrimoniais ao proprietário de terra. Ele considera inadequado afirmar que o direito à preservação ambiental se sobrepõe a outros direitos, como o de propriedade. "Para que a política ambiental faça sentido, o poder público deve priorizar, a sociedade deve priorizar a política ambiental, que, no caso das unidades de conservação, significa destinar também os recursos necessários à desapropriação”, defendeu.
Segundo Papp, são rotineiros atos do poder público que restringem o direito de propriedade antes de concluir a indenização nas unidades de conservação de domínio público. Ele apontou uma série de discussões na Justiça em que imóveis não desapropriados sofrem restrições na esfera administrativa e penal como se já tivessem virado unidade de conservação. “É inegável que há efeitos imediatos com o mero ato de criação da unidade de conservação, ainda que não se tenha perspectiva pagamento da indenização que constitucionalmente é devido", ressaltou.
O coordenador de meio ambiente da Confederação Nacional da Agricultura (CNA), Rodrigo Justus de Brito, afirma que o assunto tem preocupado os produtores e cobrou uma solução do Legislativo para o problema. Ele citou o exemplo do Parque Nacional do Itatiaia, em que proprietários de terra não foram indenizados. O parque foi criado na década de 30 e, em 2014, uma decisão judicial prejudicou os proprietários de terras inseridas nos limites ampliados da unidade de conservação. O pedido de indenização por danos materiais e morais por causa das restrições impostas pela criação do parque também foi julgado improcedente.
Segundo o coordenador de meio ambiente da CNA, apenas na teoria a criação de uma unidade de conservação não afeta o direito de propriedade das terras, pois há bloqueios à comercialização de produtos produzidos naquelas áreas. “Não sei se todos aqui sabem, mas a ferramenta que faz acontecer a atividade agropecuária é o crédito. A partir do momento em que há a criação de uma unidade de conservação, acaba qualquer possibilidade de o proprietário dar essa terra como garantia do financiamento bancário", destacou.
Documentação
A secretária-executiva da Rede Pró-Unidades de Conservação, Angela Kuczach, afirmou que o maior problema para as indenizações não é a falta de recursos, nem o procedimento de pagamento, mas a documentação solicitada. “A aferição da cadeia dominial dos imóveis privados a serem desapropriados é muito difícil de localizar para poder fazer a regularização fundiária", revelou.
Ela considera o projeto em discussão insuficiente para solucionar o problema. "A gente tem que olhar pra isso com seriedade, não é colocando dois artigos num projeto de lei que vai resolver a situação”, criticou.
O coordenador do grupo de trabalho de unidades de conservação do Ministério Público Federal, Leandro Mitidieri, também criticou o projeto de lei por não especificar a abrangência de unidades de conservação antiga. "Aprovado o projeto de lei, você pega uma situação como a de Itatiaia, em cinco anos, não regularizou, então ela some. Isso vai acontecer, pelos nossos cálculos do GT, com praticamente todas as unidades de conservação federais. Quase nenhuma tem consolidação territorial”, ressaltou. Mitidieri avalia que, se aprovada, a proposta vai prejudicar o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza (Snuc).
O pesquisador em direito agrário, ambiental e aplicado ao agronegócio, Pedro Puttini Mendes tem opinião oposta. “Não há ameaça, tragédia ou ataques nesse projeto de lei. Não estamos discutindo aqui atos ambientais, mas, sim, questões administrativas da criação das unidades de conservação", ponderou. Ele alertou ainda para a possibilidade de reeditar decretos que vão renovar a utilidade pública e o interesse social dessas unidades de conservação, evitando a caducidade em cinco anos.
O relator da proposta é o deputado Rodrigo Agostinho (PSB-SP). Ele espera que a legislação garanta a eficiência do sistema de regularização dessas unidades de conservação. “Muitas vezes, como já foi dito, os recursos existem, você tem problemas do ponto de vista de pra quem transferir a indenização, como fazer essa administração. Você tem uma série de dificuldades. Temos que fazer com que a máquina funcione um pouco melhor, temos que garantir eficiência para que essas regularizações possam acontecer, que os valores sejam valores justos, porque a gente sabe que muitas vezes quando as pessoas vão ao Judiciário pedem além do que é justo, para encontrar uma conciliação”, afirmou.