Participantes de videoconferência promovida pela Comissão de Legislação Participativa da Câmara dos Deputados criticaram, nesta sexta-feira (11), a realização da Copa América no Brasil. A avaliação de um médico, uma pesquisadora e representantes dos estudantes e das torcidas é que o evento pode prolongar e agravar a pandemia de Covid-19 no País.
O torneio continental está previsto para ocorrer de 13 de junho a 10 de julho, após as desistências de Colômbia (por questões políticas) e Argentina (devido ao agravamento da crise sanitária) sediarem o evento. No Brasil, os jogos ocorrerão no Rio de Janeiro, em Cuiabá, em Goiânia e em Brasília.
O deputado Rogério Correia (PT-MG), que sugeriu a audiência, observou que o País está perto de atingir as 500 mil mortes por Covid-19 e lamentou a realização do evento. “Pelo que sei, hospitais ainda andam cheios. Há riscos de uma terceira onda, de novas cepas”, afirmou o parlamentar.
O médico e membro do comitê de enfrentamento da Covid-19 da prefeitura de Belo Horizonte, Unaí Tupinambás, classificou a Copa América como “um evento desnecessário”.
“Estabilizamos num patamar de mortes muito alto. É inaceitável ter 1,7 mil mortes, numa média móvel, por dia no Brasil”, observou Tupinambás. “Essa sinalização que é feita mostra o para a população ‘olha, a pandemia acabou’, mostrando realmente um descaso muito grande com todas as vítimas de Covid no Brasil inteiro.”
Segundo pesquisa do PoderData, mais da metade da população brasileira (55%) é contra a realização do campeonato no País. O caso, que foi parar na Justiça, recebeu aval do Supremo Tribunal Federal para acontecer.
Protocolos
O governo defende a realização do torneio e sustenta que os jogos não terão público e serão adotados protocolos sanitários.
Presente à videoconferência, o coordenador operacional da Copa América, André Pedrinelli, disse que, das dez equipes que virão ao Brasil, oito já estão vacinadas. Ele também destacou cuidados que serão tomados, como a testagem das delegações a cada 48 horas; o isolamento de atletas e comissões técnicas nos hotéis das cidades-sede, sendo liberada a saída apenas para treinos, jogos ou questão de saúde; e a contratação de um seguro médico internacional.
“Não haverá conflito com a rede pública de hospitais. Temos dois hospitais credenciados em cada cidade-sede. Temos uma boa cobertura médica preparada. Além de ter um oficial médico específico em cada sede, nós criamos a figura do oficial médico de Covid, que estará voltado para todas essas relações: higienização do estádio, conferência do pessoal que trabalha, checagem dos exames”, listou Pedrinelli.
Na avaliação da pesquisadora aposentada da Fiocruz Cláudia Travassos, porém, a contratação de seguro de saúde para os participantes da competição pouco ameniza os perigos do campeonato. “Os leitos existentes são os leitos existentes. As pessoas com seguro de saúde, o que elas vão conseguir é passar na frente.”
Fora dos estádios
Para o presidente da Associação Nacional das Torcidas Organizadas do Brasil (Anatorg), Alex Minduín, o problema é outro e está longe dos estádios.
“Lidar com futebol é lidar com a paixão desenfreada de um dos esportes mais apaixonantes do planeta. No Brasil, não seria diferente. Em uma Copa América, em que você tem astros internacionais chegando ao território nacional, é evidente que essa paixão aflora cada vez mais. Um torcedor quer ver de fato os jogadores que atuam sobretudo no cenário europeu aqui no nosso território”, disse Minduín.
Por sua vez, o vice-presidente regional Sudeste da União Nacional dos Estudantes (UNE), Diego Carlos Ferreira, observou que, em diversas cidades, os bares serão aglutinadores de torcedores. Ele chamou a atenção para o fato de que o número atual de mortes por Covid-19 no Brasil equivale a dez estádios lotados.
Ausência do governo
Rogério Correia criticou a ausência, no debate, de representantes do Ministério da Cidadania, apesar de terem sido convidados. A pasta alegou que o prazo para atender à demanda era curto.
“Ficamos sem nenhum representante do governo. Talvez isso esteja em sintonia com o que o presidente Jair Bolsonaro disse, que não está nem aí”, disse o parlamentar. “O governo perde a oportunidade de dizer ao povo brasileiro o porquê da Copa América no Brasil.”