O auxílio emergencial pago entre o ano passado e este ano a pessoas em situação de vulnerabilidade alcançou os trabalhadores sem renda formal, porém os altos índices de pagamentos indevidos resultaram em desperdício de recursos públicos. Essa é a principal conclusão da fiscalização do Tribunal de Contas da União (TCU) sobre a concessão do benefício.
O balanço parcial da fiscalização foi apresentado nesta quinta-feira (10) em audiência pública da Comissão de Fiscalização Financeira e Controle da Câmara dos Deputados. O evento foi solicitado pelo presidente do colegiado, deputado Aureo Ribeiro (Solidariedade-RJ).
Segundo a corte de contas, R$ 54,7 bilhões foram pagos indevidamente, ou seja, os beneficiários que sacaram o auxílio não estavam dentro dos critérios de elegibilidade. São, por exemplo, servidores públicos (civis e militares) ou beneficiários da Previdência Social.
O cruzamento de dados em cadastros governamentais e nas pesquisas do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), feito pelo TCU e outros órgãos de controle, como a Controladoria-Geral da União (CGU), permitiu o cancelamento de 3,7 milhões de benefícios, resultando em uma economia de R$ 8,8 bilhões.
O auxílio emergencial foi criado inicialmente pelo Congresso Nacional. A boa recepção entre a população levou o governo federal a baixar medidas prorrogando o benefício.
Critérios
“De certa forma, isso já era esperado”, admitiu o secretário de Controle Externo da Previdência, do Trabalho e da Assistência Social, João Ricardo Pereira, um dos convidados para o debate.
Segundo ele, o alto índice de fraudes teve como razão principal o desenho da política de concessão do auxílio, que determinou que os critérios de elegibilidade seriam aferidos apenas no pagamento da primeira parcela. Nos meses seguintes não houve uma nova rodada de verificação dos beneficiários.
“Ao longo dos meses centenas de milhares de pessoas ficam inelegíveis. A gente pode citar pessoas que conseguem seguro-desemprego, conseguem benefícios do INSS e até pessoas que vêm a óbito”, disse Pereira. “Em um país continental como o nosso, há uma mudança significativa das condições das pessoas de um mês para o outro.”
Outra causa apontada por ele é a deficiência dos bancos de dados públicos sobre o público-alvo. O técnico do TCU citou como exemplo as mães chefes de família, que tiveram direito a cota dupla do auxílio emergencial. Não há cadastro governamental que identifique esse público. O tribunal estima que existam no País 4,4 milhões de mães de família com base em pesquisa do IBGE, mas o benefício foi pago a 10,8 milhões.
O TCU fez uma série de recomendações ao governo federal, dos quais parte já foi implementada. O governo também corrigiu distorções por meio de medida provisória. A corte deverá divulgar em breve um novo balanço da fiscalização, com dados finais de 2020 e a situação das medidas propostas anteriormente.
Servidores
Durante o debate o deputado Elias Vaz (PSB-GO) se disse “estarrecido” com o número de funcionários públicos civis e militares que receberam indevidamente o auxílio emergencial. Ele também defendeu a integração dos bancos de dados dos diversos órgãos públicos brasileiros. “Fica parecendo que não há comunicação entre os entes. Isso é muito grave”, disse Vaz.
O coordenador-geral de Controle Externo da Área Econômica e das Contas Públicas do TCU, Tiago Dutra, afirmou que a solução para as questões apontadas pelo deputado é a criação de um sistema nacional com dados dos salários de todos os servidores públicos brasileiros (incluindo inativos), e dos beneficiários da Previdência e de programas sociais. O sistema está previsto na Constituição.
Ele disse também que a declaração do Imposto de Renda relativa ao ano passado, cujo prazo de entrega acabou em maio, permitirá a identificação dos servidores que receberam o auxílio emergencial. “Se a pessoa não informar, ela [Receita Federal] tem condições de confirmar. Estamos falando de alguns milhões de pessoas que estão nessa situação”, afirmou Dutra.