Entidades ligadas a profissionais da segurança pública cobraram ações coordenadas que ampliem os mecanismos de prevenção ao suicídio e doenças mentais entre os policiais. O impacto do estresse diário na saúde desses profissionais foi debatido nesta terça-feira (1) em audiência virtual da Comissão de Segurança Pública da Câmara dos Deputados, que analisa projetos de lei sobre o tema.
Um deles (PL 4815/19) já foi aprovado no Senado e inclui a promoção da saúde mental e a prevenção ao suicídio no Pró-Vida, o Programa Nacional de Qualidade de Vida para Profissionais de Segurança pública criado em 2018 (Lei 13.675 /18).
O presidente da Federação Nacional dos Policiais Federais, Luiz Antônio Boudens, defendeu a proposta e informou que a instituição já executa programas de atendimento psicológico para a detecção prévia de problemas entre os agentes. “Você entra para a polícia com aquela vontade de atuar mais, de ser o paladino da justiça e de ser super-homem ou super-mulher, mas internamente você encontra várias dificuldades de gestão, de aceitação do público, do próprio comportamento da sociedade em relação ao policial. Então, é ideal que haja um grupo preparado dentro da polícia para tratar desse policial”, defendeu.
A mais recente edição do Anuário Brasileiro de Segurança Pública, relativa a 2019, mostrou que os casos de suicídio entre policiais militares e civis (91) superam o número de policiais mortos em serviço (62). O Instituto de Pesquisa, Prevenção e Estudos em Suicídio (Ippes) relembrou uma sondagem de 2014 com 18 mil policiais, na qual 3,6% disseram já ter tentado suicídio e outros 18% admitiram ter pensado em tirar a própria vida. Levantamento mais recente da Federação Nacional dos Policiais Rodoviários Federais identificou estresse ocupacional de médio a elevado em 94% do efetivo, além de 36% com algum tipo de doença mental em variados graus.
Socióloga do Ippes e coautora do livro “Por que policiais se matam?”, Fernanda Cruz apontou múltiplos fatores para esse quadro, principalmente adoecimento psíquico, uso abusivo de álcool e drogas, relacionamento interpessoal e insatisfação profissional. O Ippes recomendou a implantação de uma “cultura de saúde nas instituições policiais” que inclua uma rede de atendimento psicológico e acolhimento, além de correções nas atuais lacunas que provocam a subnotificação de suicídio.
Tenente coronel do Corpo de Bombeiros Militar do Ceará, José Edir de Souza admitiu que a atenção à saúde mental deve estar presente em todas as fases da vida profissional dos policiais. “A gente observou que estar na reserva ou aposentado era um fator de risco para suicídio”, relatou.
Paraíba
A audiência também mostrou resultados positivos do Espaço Viver Bem do Policial Militar, criado em 2016 na Paraíba, com assistência social e psicológica fora dos quartéis. Desde 2019, o estado não registra suicídio de PM nem de bombeiro militar.
Representante do Ministério da Justiça, o coordenador geral de políticas para os profissionais de segurança pública, Paulo Silva Pena, informou que, entre 2019 e 2020, o governo federal repassou R$ 311 milhões para os estados aplicarem em ações como essa da Paraíba. Segundo Pena, há ações em curso para a criação de um protocolo de tratamento de estresse pós-traumático e da disciplina de qualidade de vida no currículo de formação profissional.
Relatora da proposta de inclusão da prevenção ao suicídio no Pró-Vida, a deputada Policial Kátia Sastre (PL-SP) prometeu ampliar o debate antes da apresentação do seu parecer na Comissão de Segurança Pública. “Quanto mais equilibrado o policial está, melhor a sociedade vai receber os serviços. Precisamos olhar com carinho para a saúde mental dos nossos policiais”, ressaltou.
Esse projeto de lei tramita em conjunto com uma proposta semelhante (PL 6355/16) do deputado David Miranda (Psol-RJ). O deputado Subtenente Gonzaga (PDT-MG) também defendeu a aprovação das propostas (PL 6326/19 e PL 718/21) que tratam da proteção especial para policiais ameaçados de morte em função do trabalho.