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Deputados e debatedores divergem sobre cultivo de Cannabis no Brasil

Presidente da comissão que analisa projeto sobre o uso medicinal da planta acredita que, se Legislativo não aprovar a proposta, solução será dada p...

Redação
Por: Redação Fonte: Agência Câmara de Notícias
26/05/2021 às 20h38

A Câmara dos Deputados realizou nesta quarta-feira (26), por mais de quatro horas e 30 minutos, uma comissão geral para debater o cultivo no Brasil, exclusivamente para fins medicinais, veterinários, científicos e industriais, da Cannabis sativa, planta também usada para produzir maconha.

O presidente da Câmara, deputado Arthur Lira (PP-AL), considerou o debate histórico. “Com o enfrentamento da questão, o Brasil se somará a outros que se debruçaram sobre ela e encontraram, na medida das possibilidades, a melhor solução”, disse, em mensagem lida pelo deputado Eduardo Bismarck (PDT-CE).

 

 

 

A participação do ativista Norberto Fischer, pai da primeira brasileira autorizada pela Justiça a importar produtos terapêuticos a base de Cannabis, em 2014, resumiu o debate no Plenário. “Se pararmos para ouvir os discursos, todos reconheceram e aceitam o uso medicinal, o gargalo está no plantio”, disse.

A comissão geral sobre o cultivo e uso medicinal de Cannabis foi realizada a pedido do deputado Paulo Teixeira (PT-SP), presidente da comissão especial sobre o Projeto de Lei 399/15, e mais 12 parlamentares (REQ 1116/21).

Teixeira defendeu o substitutivo apresentado pelo relator, deputado Luciano Ducci (PSB-PR), ao texto original do deputado Fábio Mitidieri (PSD-SE). Devido ao caráter conclusivo, o texto, se aprovado na comissão especial, poderia seguir para o Senado, mas deverá haver recursos para a análise em Plenário.

“Se o Parlamento se negar a aprovar este projeto de lei – e não acredito que o fará –, concederá ao Poder Judiciário a solução do problema dos medicamentos a base de Cannabis”, disse Teixeira. Ainda não foi marcada a votação do parecer de Luciano Ducci. Antes, o relator deverá apresentar complementação de voto.

Posições distintas
Ao realizar uma comissão geral, os parlamentares reúnem-se no Plenário da Câmara dos Deputados para discutir assunto relevante. São convidados para o debate autoridades, especialistas com notório conhecimento, integrantes de entidade da sociedade civil e pessoas com experiência no tema em questão.

Nesta quarta-feira (26), parlamentares e convidados acabaram formando dois grandes blocos. Embora tenha havido amplo apoio ao uso medicinal, houve divergências, já que a parte contrária ao substitutivo de Luciano Ducci só aceita o uso do canabidiol, uma das cerca de 480 substâncias presentes na Cannabis.

Na visão dos deputados David Soares (DEM-SP), Dra. Soraya Manato (PSL-ES), Eros Biondini (Pros-MG), Francisco Jr. (PSD-GO), Greyce Elias (Avante-MG), João Campos (Republicanos-GO), Osmar Terra (MDB-RS) e Pastor Eurico (Patriota-PE), a proposta ainda em análise na comissão especial é desnecessária.

Esses parlamentares argumentaram que produtos derivados do canabidiol já são regulamentados no País pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Bastaria assegurar a oferta no Sistema Único de Saúde (SUS). João Campos afirmou que já existe discussão neste sentido com o Poder Executivo.

Já os deputados Alex Manente (Cidadania-SP), Alice Portugal (PCdoB-BA), Chico D'Angelo (PDT-RJ), Eduardo Costa (PTB-PA), Jandira Feghali (PCdoB-RJ), Natália Bonavides (PT-RN), Rafafá (PSDB-PB), Sâmia Bomfim (Psol-SP) e Zacharias Calil (DEM-GO) afirmaram que só o plantio poderá baixar os custos.

Eles saíram em defesa do parecer de Luciano Ducci, ressaltando que não há no texto nenhuma linha tratando da legalização da maconha, do cultivo individual ou do uso recreativo da Cannabis. Para Ducci, quem se opõe ao parecer tenta confundir a população, pratica desonestidade intelectual e propaga mentiras.

Os deputados Capitão Alberto Neto (Republicanos-AM), Caroline de Toni (PSL-SC), Diego Garcia (Pode-PR), Eli Borges (Solidariedade-TO) e Pastor Marcos Feliciano (Republicanos-SP) manifestaram-se totalmente contrários à proposta. Em linhas gerais, acham que será o início da liberação das drogas no País.

“Quem produz droga para vender como uso recreativo não pedirá autorização da Anvisa”, comentou o deputado Tiago Mitraud (Novo-MG), em reação aos críticos da proposta. “Isso é igual ao argumento que o governo Bolsonaro aplica para liberar armas, de que o criminoso não vai pedir porte na Polícia Federal.”

O deputado Ricardo Izar (PP-SP) aproveitou a participação na comissão geral para oferecer um depoimento pessoal. “Luto contra a doença de Parkinson há dez anos. Já experimentei o canabidiol. Nas vezes em que usei o medicamento, a qualidade do meu sono e os tremores melhoraram muito”, afirmou.

Mais depoimentos
Entre os 28 convidados que compareceram ao debate, houve depoimentos de familiares de pacientes que usam medicamentos ou sofrem com dependência química, de representantes de entidades favoráveis e contrárias à proposta, de médicos com estudos sobre Cannabis e resultados positivos ou negativos.

“São 77 milhões com dor crônica no Brasil que poderiam se beneficiar, e o SUS não tem de pagar”, disse Carolina Nocetti, da Academia Americana de Medicina Canabinoide. “A diferença de remédio para droga é a dosagem, que só médicos podem definir”, afirmou Sergio Paulo Guimarães, teólogo e advogado.

“O Conselho Federal de Medicina não concorda com o plantio de Cannabis em território nacional”, disse Emmanuel Fortes Silveira Cavalcanti, do CFM. “São os mesmos que autorizam ivermectina e cloroquina”, afirmou Leandro Cruz Ramires da Silva, da Associação Brasileira de Pacientes de Cannabis Medicinal.

“Um deputado contra a penicilina nos anos 1930 estaria fora da realidade da época”, disse o neurocientista Sidarta Ribeiro, sobre a evolução das pesquisas sobre Cannabis. “Não podemos confundir boas intenções com boas práticas médicas”, afirmou Marcelo Allevato, da Associação Brasileira de Psiquiatria.

“Mesmo que haja pena de morte, continuaremos plantando, porque traz saúde e qualidade de vida”, disse Margarete Santos de Brito, da Associação de Apoio à Pesquisa e Pacientes de Cannabis Medicinal. “Famílias estão sendo usadas por quem quer legalizar as drogas”, afirmou Michele Colins, vereadora em Recife.

“Preocupa a aprovação de mais uma droga lícita, já temos o álcool”, disse o delegado Aristóteles Sakai de Freitas. “Atendemos 19 mil pessoas, são juízes, políticos, artistas, médicos”, afirmou Cassiano Teixeira, da Associação Brasileira de Apoio Cannabis Esperança (Abrace), apontada como referência nacional.

“Por falha de governo, a regulação é deficiente”, disse Rodrigo Mesquita, da Comissão Especial de Assuntos Regulatórios da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). “Precisamos clareza sobre as regras, para seguir à risca, de modo ético”, afirmou Tarso Araújo, da Associação Brasileira das Indústrias de Canabinoides.

Plantio restrito
O parecer de Luciano Ducci legaliza o cultivo da Cannabis no Brasil, mas impõe restrições. Poderá ser feito apenas por pessoas jurídicas (empresas, associações de pacientes ou organizações não governamentais). Seguirão proibidos no País o cultivo individual, bem como cigarros, chás e outros derivados da planta.

A versão original de Fábio Mitidieri liberava a venda de medicamentos oriundos da Cannabis ao alterar a Lei Antidrogas (Lei 11.343/06). “Algumas moléstias podem ser tratadas com sucesso, de modo eficaz e seguro, em relação a outras drogas que não apresentam respostas satisfatórias em determinados casos”, defendeu.

Atualmente, a Lei Antidrogas proíbe em todo o território nacional o plantio, a cultura, a colheita e a exploração de vegetais e substratos dos quais possam ser extraídas ou produzidas drogas, com exceção para aquelas plantas de uso exclusivamente ritualístico religioso e no caso de fins medicinais e científicos.

Autoridade sanitária dos Estados Unidos, a Food and Drug Administration (FDA) aprovou produtos oriundos da Cannabis. Outros 50 países já autorizam o uso terapêutico. No Brasil, a Anvisa não classifica os itens como medicamentos, mas autoriza a importação com receita médica e poderá avaliar a fabricação no País.

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