A comissão especial da Câmara dos Deputados que analisa o Projeto de Lei 399/15 adiou, para data a definir, a votação do parecer sobre a legalização do cultivo no Brasil – exclusivamente para fins medicinais, veterinários, científicos e industriais – da Cannabis sativa, planta também usada para produzir maconha.
A decisão foi tomada no início da tarde desta terça-feira (18) pelo presidente do colegiado, deputado Paulo Teixeira (PT-SP), após mais de cinco horas de debate. Ele acatou o pedido do relator, deputado Luciano Ducci (PSB-PR), de ter mais tempo para uma complementação de voto ao substitutivo apresentado no último dia 10.
Segundo o relator, serão incorporadas sugestões oriundas das discussões desta terça-feira (18). Houve troca de acusações entre os parlamentares – em resumo, de obscurantismo, preconceito, submissão a lobbies ou apoio a drogas –, e também defesa da ciência e do acesso amplo a medicamentos novos ou caros.
No momento mais tenso da reunião, aconteceu contato físico entre o deputado Diego Garcia (Pode-PR), contrário ao parecer, e Paulo Teixeira, por causa de um requerimento rejeitado. Ambos afirmaram, ainda durante os trabalhos, que recorrerão à gravação em vídeo e a testemunhos para eventuais providências.
Restrições
Como está atualmente, o parecer legaliza o cultivo da Cannabis, porém impõe restrições. O plantio poderá ser feito apenas por pessoas jurídicas (empresas, associações de pacientes ou organizações não governamentais). Não há previsão para o cultivo individual. Seguirão proibidos cigarros, chás e outros itens derivados da planta.
Luciano Ducci reiterou que o foco é a aplicação medicinal da Cannabis sativa, presente hoje em 50 países. “Nunca foi premissa discutir a legalização da maconha para uso adulto ou individual”, afirmou. Criada em 2019, a comissão especial fez 12 audiências públicas, além de recolher informações no Brasil e no exterior.
Alterações
Foram várias as mudanças em relação ao projeto original, do deputado Fábio Mitidieri (PSD-SE). Ele, que sugeriu uma alteração na Lei Antidrogas apenas para autorizar no Brasil a venda de medicamentos oriundos da Cannabis sativa, aprovou o parecer do relator. “Salvará vidas”, ressaltou.
“Algumas moléstias podem ser tratadas com sucesso, de modo eficaz e seguro, em relação a outras drogas que não apresentam respostas satisfatórias em determinados casos”, disse Mitidieri. No combate a convulsões, afirmou, é expressiva a redução de dezenas por dia a só uma ocorrência por semana.
Legislação
Atualmente, a Lei Antidrogas proíbe em todo o território nacional o plantio, a cultura, a colheita e a exploração de vegetais e substratos dos quais possam ser extraídas ou produzidas drogas, com exceção para aquelas plantas de uso exclusivamente ritualístico religioso e no caso de fins medicinais e científicos.
Autoridade sanitária dos Estados Unidos, a Food and Drug Administration (FDA) aprovou produtos oriundos da Cannabis sativa. No Brasil, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) não classifica esses itens como medicamentos, mas autoriza a importação com receita médica e poderá avaliar a fabricação no País.
Polêmicas
Durante os debates, deputados como Osmar Terra (MDB-RS) e Hiran Gonçalves (PP-RR) apoiaram a autorização ao canabidiol, derivado da Cannabis sativa cujo uso medicinal ambos reconheceram, mas refutaram o cultivo da planta no País. Gonçalves sugeriu a importação do Uruguai – a legalização lá ocorreu em 2013.
Outros avaliaram que o cultivo de Cannabis deve baixar custos e favorecer, entre várias, pessoas com câncer, epilepsia, esclerose múltipla e doenças autoimunes. O deputado Alexandre Padilha (PT-SP) defendeu a autossuficiência brasileira em medicamentos ao citar as atuais dificuldades na vacinação contra a Covid-19.
Com votos em separado, os deputados Diego Garcia e Dra. Soraya Manato (PSL-ES) disseram que normas atuais tornam o projeto desnecessário; Aureo Ribeiro (Solidariedade-RJ) cobrou precauções contra desvios; e Sâmia Bomfim (Psol-SP) e Talíria Petrone (Psol-RJ) pediram atenção às associações de pacientes.
Tramitação
A proposta tramita em caráter conclusivo. Se aprovada pela comissão especial, poderia ser enviada diretamente ao Senado; nesta terça-feira, porém, formou-se a convicção no colegiado de que haverá recurso para análise do Plenário.