Os deputados da Comissão de Defesa do Consumidor da Câmara conversaram com representantes do governo, de bancos, correspondentes bancários e consumidores sobre como adotar medidas para evitar problemas na contratação de empréstimos consignados.
Com o aumento da margem para créditos consignados desde outubro do ano passado, também cresceu o número de fraudes, especialmente com aposentados e pensionistas. Em alguns casos, os consumidores podem receber empréstimos sem ter solicitado, ou então passam a ter descontos na sua aposentadoria sem nem ver a cor do dinheiro.
As duas instituições financeiras com o maior número de reclamações, os bancos C6 e Pan, recusaram o convite de participar da audiência pública. A ausência deixou indignado o presidente da comissão, deputado Celso Russomanno (Republicanos-SP). "Infelizmente os dois bancos campeões de reclamação não estão presentes nesta audiência pública. Um total desrespeito ao Congresso Nacional. Eles se escondem por trás dos e-mails que não respondem", irritou-se.
Celso Russomanno anunciou que a comissão deve votar requerimentos ao Ministério Público, à Polícia Federal e ao Banco Central para responsabilizar criminalmente os diretores das instituições financeiras, seus prepostos ou correspondentes bancários. "Nós não estamos falando de reclamação, estamos falando de crime. Cada empréstimo colocado na conta de um consumidor sem solicitação é estelionato", definiu.
O presidente da comissão lembrou que, de acordo com o Código de Defesa do Consumidor, o empréstimo depositado indevidamente deveria ficar na conta do consumidor, já que seria considerado uma "amostra grátis" de um produto ou serviço. "Muitas vezes essas pessoas nem sabem que fizeram um empréstimo consignado na sua conta, nem têm acesso à informação de qual banco fez o depósito", completou.
Atendendo a pedido do deputado Celso Russomanno, o presidente do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), Leonardo Rolim, prometeu que o telefone 135 vai passar a receber denúncias sobre crédito consignado. Segundo o INSS, há 36 milhões de operações ativas de crédito consignado de aposentados e pensionistas, que equivalem a um volume de R$ 185 bilhões de empréstimos. "É uma forma de acesso ao crédito a juros mais baixos, de injetar recursos na economia, importante para famílias em momentos de maior necessidade", comentou.
Regulação
O deputado Capitão Alberto Neto (Republicanos-AM) apontou para a necessidade de regular o mercado e propôs a criação de um Código do Consignado. Ele foi relator da Medida Provisória (MP) 1006/20 (Lei 14131/21), que aumentou a margem de empréstimo consignado de 35% para 40% do benefício de aposentados e pensionistas. "Achei um absurdo o banco poder acessar meu crédito e congelar para tentar obter o empréstimo", disse. "Temos que dar um exemplo para que o crédito consignado não entre numa vala comum como este banco C6 tem feito. Isso é criminoso", ressaltou.
A chefe do Departamento de Supervisão de Conduta do Banco Central do Brasil, Andreia Lais Vargas, observou que parte das reclamações deve-se a operações registradas indevidamente por correspondentes bancários que desejam receber comissão. Ela afirmou que o aumento de contratações digitais tem reduzido as reclamações e auxiliado a punir os maus correspondentes. Isso teria levado a uma diminuição de 43% sobre crédito consignado no primeiro trimestre deste ano, em comparação com o último trimestre de 2020.
O diretor-executivo de Sustentabilidade, Cidadania Financeira, Relações com o Consumidor e Autorregulação da Federação Brasileira de Bancos (Febraban), Amaury Oliva, disse que o mercado tem buscado a autorregulação do crédito consignado, para combater o assédio comercial, melhorar o atendimento ao cliente e dar maior transparência.
A Febraban criou um indicador de qualidade de correspondentes bancários, com certificação para equipe de atendimento. Pelas regras, consumidor pode desistir da operação em até sete dias úteis. Contratações por telefone estão vedadas. Correspondentes bancários não podem receber comissão quando a operação for refinanciada em menos de um ano. "O objetivo é evitar o assédio dos correspondentes bancários", apontou.
Já o presidente da Associação Nacional dos Profissionais e Empresas Promotoras de Crédito e Correspondentes no País (Aneps), Edilson João da Costa, reclamou das regras definidas pela Febraban, que segundo ele não ouviu os correspondentes bancários. Ele criticou o mecanismo que possibilita a liberação da margem sem a assinatura do consumidor e a concessão de crédito sem assinatura. "Pedimos a punição da instituição financeira que facilita isso", cobrou.
Multas
O diretor do Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor, da Secretaria Nacional do Consumidor do Ministério da Justiça, Pedro Aurélio Queiroz, informou que cinco dos dez processos administrativos contra instituições financeiras estão na fase de alegações finais na Justiça. Os dez processos alcançam as principais instituições bancárias: Safra, BMG, Caixa Econômica Federal, Olé Bonsucesso Consignado, Itaú Consignado, Banrisul, Pan, Cetelem, Bradesco Financiamentos e Bradesco. Ele lamentou que, entre 2017 e 2018, não houve recolhimento de multas. No entanto, multas de R$ 10 milhões foram aplicadas no ano passado.
Pedro Aurélio Queiroz considera que o teto para sanções do Código de Defesa do Consumidor está ultrapassado, por impor um limite de R$ 11,5 milhões. Ele anunciou que o Ministério da Justiça deve impor sanções por meio do Marco Civil da Internet, já que muitas operações são contratadas por meio eletrônico. Neste caso, as multas podem chegar a 10% do faturamento bruto do grupo econômico.
Vazamento de dados
O presidente do Instituto Nacional de Defesa do Consumidor (Inadec), Arthur Rollo, denunciou a utilização indevida de dados dos consumidores a partir de vazamento de informações do INSS. Ele lamentou a demora no julgamento de processos administrativos contra instituições financeiras e pediu providências contra a concessão de crédito sem assinatura.
"Não dá esta oferta indiscriminada de crédito, com utilização indevida de dados dos consumidores. Que a concessão de empréstimo seja feita na instituição bancária", sugeriu.
O diretor de Relacionamento e Negócios da Empresa de Tecnologia e Informações da Previdência (Dataprev) disse que tem trabalhado para reduzir riscos de mau uso e práticas incorretas na concessão de créditos consignados. Ele lembrou que metade das operações passam por processo de renegociação, refinanciamento e portabilidade.