A criação do juiz das garantias pelo novo Código de Processo Penal (PL 8045/10) dividiu opiniões entre deputados e entidades representativas de categorias profissionais do Judiciário. O tema foi objeto de audiência pública nesta quinta-feira na comissão especial da Câmara dos Deputados que discute o projeto.
O juiz das garantias, segundo o texto, será responsável pelo andamento do processo – prisões cautelares, diligências, escutas telefônicas e outras provas. Quem vai definir se o réu é culpado será outro juiz. Atualmente, o mesmo juiz acompanha o processo e dá a sentença. O Congresso chegou a aprovar essa alteração no pacote anticrime, mas esse ponto foi suspenso pelo STF.
O relatório do deputado João Campos (Republicanos-GO) mantém o novo cargo, dando prazo de cinco anos para a adaptação da Justiça. Campos disse se tratar de um “prazo razoável” e reforçou que a aprovação anterior do tema pelo Congresso sinaliza maioria para aprovação do juiz das garantias no Plenário.
“Ainda nesta legislatura, em 2019, a Câmara e o Senado aprovaram a criação do juiz das garantias, sancionado pelo presidente da República. Se propusesse algo diferente, poderíamos ter a rejeição do texto e retomada do juiz das garantias no Plenário”, disse.
Debates
O presidente da Associação Nacional dos Procuradores da República, Fábio Jorge, criticou a ampliação das atribuições comuns do juiz das garantias, além de considerar insuficientes os cinco anos previstos no texto para adaptar o sistema.
“O juiz das garantias é o responsável pelo controle de legalidade da investigação e da salvaguarda de direitos constitucionais. É ele que decide sobre afastamento de sigilo bancário, fiscal e telefônico e sobre pedidos de busca e apreensão, mas não é ele que toma atitudes de ofício e se envolve de maneira aprofundada na investigação”, criticou.
Para o representante da Associação dos Magistrados do Brasil, Pedro de Araújo Yung Tay-Neto, a criação do juiz de garantias não vai trazer os resultados esperados e vai aumentar os custos do Judiciário. “O juiz das garantias trará lentidão e uma imensa dificuldade para que se possa prestar uma jurisdição de qualidade, a que o povo brasileiro tanto anseia”, disse.
A Associação dos Juízes Federais (Ajufe) é favorável à criação do novo cargo, segundo o juiz Walter Nunes da Silva Júnior. “Desde nota técnica divulgada em 2018 somos favoráveis à criação do juiz das garantias, nós apenas alertamos sobre a necessidade de um espaço temporal razoável para a mudança”, disse.
Já o representante da Associação Nacional de Defensores Públicos da União, Eduardo Kassuga, é favorável à criação imediata do juiz das garantias como ferramenta contra condenações injustas. Para ele, só assim haverá de fato a imparcialidade dos julgadores brasileiros.
“O juiz que tem contato com as evidências fica enviesado naquela versão acusatória. Quando chega na parte processual, a defesa pode fazer o que for, mas simplesmente não conseguirá convencer o juízo da inocência do sujeito”, disse.
Divergência entre deputados
O deputado Subtenente Gonzaga (PDT-MG) afirmou que votou a favor do juiz das garantias no pacote anticrime, mas agora defende mais tempo para a criação do novo cargo e adaptação do sistema. “Tenho simpatia pelo juiz das garantias, mas não vejo como implantar de imediato em um país da complexidade do Brasil”, disse.
Já o deputado Paulo Teixeira (PT-SP) rebateu que os ganhos judiciais com o juiz das garantias superam em muito os custos de sua implantação em todo o País. Ele fez questão de destacar a suspeição de Sérgio Moro no âmbito da Operação Lava Jato como prova de que é preciso reformar o sistema judicial brasileiro.
“Não podemos ter retrocesso, o Brasil precisa do juiz das garantias, porque é uma maneira de implementar o princípio da imparcialidade do juiz, questão essa que está na agenda pública quando o STF declara a suspeição de um juiz”, disse.
O deputado Hugo Leal (PSD-RJ), no entanto, disse que o sistema judiciário brasileiro não está preparado para o juiz das garantias. “Em termos de conceito, todos nós vamos aplaudir; mas na realidade não é aquilo que nós esperamos”, argumentou.
Ele defendeu a votação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 89/15, que propõe a criação de juizados de instrução criminal sob a presidência de delegados de polícia.