Críticas a governantes não representam lesão à integridade territorial, à soberania nacional, ao regime representativo e democrático, à federação ou ao Estado de Direito. Dessa maneira, não podem ser investigadas com base na Lei de Segurança Nacional (Lei 7.170/1983).
Com esse entendimento, o vice-presidente do Superior Tribunal de Justiça, Jorge Mussi, no exercício da presidência, concedeu neste sábado (23/1) liminar para suspender o interrogatório do advogado Marcelo Feller na Polícia Federal.
Durante um programa da CNN, Feller afirmou que o presidente Jair Bolsonaro era parcialmente responsável pelas mortes por Covid-19 no Brasil. A pedido do ministro da Justiça e Segurança Pública, André Mendonça, a PF abriu inquérito com base na LSN e intimou o advogado. O depoimento estava marcado para 1º de fevereiro.
A defesa de Feller, feita pelo advogado Alberto Zacharias Toron, impetrou na quinta-feira (21/1) Habeas Corpus solicitando o trancamento do inquérito e a consequente suspensão do depoimento à PF. Segundo Toron, "criticar o governo Bolsonaro, ou mesmo tachar de criminosa sua política, é parte do debate político que, longe de ameaçar o Estado, engrandece-o; engrandece a democracia".
Em sua decisão, Jorge Mussi apontou que a jurisprudência dos tribunais superiores entende que a LSN só pode ser aplicada se o suspeito tiver agido com objetivos políticos e se tais atos puderem causar lesão, real ou potencial, à integridade territorial, à soberania nacional, ao regime representativo e democrático, à federação ou ao Estado de Direito.
Conforme o ministro, ainda que se possa discordar dos comentários de Feller, não é possível extrair de seu comentário lesão real ou potencial à integridade territorial, à soberania nacional, ao regime representativo e democrático, à federação ou ao Estado de Direito, “mas tão somente severa crítica à postura do presidente da República frente à pandemia da Covid-19”.
Além disso, Mussi disse ser necessário valorizar a liberdade de imprensa. Afinal, ela viabiliza “o debate de ideias, a concretização dos valores republicanos e a responsabilidade dos governantes que, por sua posição proeminente, devem se submeter e tolerar um escrutínio mais intenso da sociedade.
Na visão do ministro, a conduta do advogado é atípica, até porque não há provas de que ele agiu com o dolo específico necessário para configurar crime.
O Ministério Público Federal se manifestou na noite de quinta-feira (21/1) para arquivar o inquérito contra Marcelo Feller. Porém, como não há notícia da confirmação do arquivamento pelo órgão revisor do MPF, Jorge Mussi disse que o pedido do advogado não perdeu o objeto e concedeu a liminar para suspender o depoimento.
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HC 640.615
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