O 3º Webinário Covid-19: reconstruções solidárias e sustentáveis foi marcado por discussões envolvendo o empreendedorismo colaborativo, a prevenção e tratamento do superendividamento, Agenda 2030, consumo consciente, arbitragem internacional e pacificação social, bem como a relevância do projeto constitucional. A terceira edição, ocorrida ontem (23/7), encerrou um ciclo de debates sobre temas relacionados ao impacto da pandemia da Covid-19 em diferentes áreas. Promovido pelo Laboratório de Inovação (Inovatchê) da Justiça Federal do RS, o evento contou com a participação dos desembargadores federais Leandro Paulsen e Roger Raupp Rios.
Empreendedorismo colaborativo
A primeira palestra do dia ficou a cargo da professora Ângela Figueiredo, que abordou as possibilidades de empreendedorismo colaborativo. O desembargador federal Roger Raupp Rios foi o moderador da palestra. Ao refletir sobre as desigualdades acirradas pela crise sanitária, Figueiredo sublinhou que “as pandemias não se instauram em campos neutros”.
Ela instigou a reflexão sobre a possibilidade de surgirem outras formas de organização como, por exemplo, no caso de empregados que assumissem as empresas para as quais trabalham caso elas decretassem falência. “Seria possível uma administração coletiva dessas firmas para além do modelo capitalista que conhecemos?”, questionou. Para a professora, o momento atual é “uma fase particularmente interessante para pensarmos outras formas possíveis de construção de um mundo mais justo, onde caibamos todos nós”.
Prevenção e tratamento do superendividamento
A segunda palestra tratou de uma questão extremamente importante, principalmente em função da crise econômica provocada pela pandemia do novo coronavírus. A professora Claudia Lima de Marques, presidente do Comitê de Proteção Internacional dos Consumidores, falou sobre o superendividamento, bem como suas formas de prevenção e de tratamento, além do projeto de lei que prevê a atualização do Código de Proteção ao Consumidor. O desembargador federal Leandro Paulsen participou como moderador dos debates.
A professora destacou que hoje há, no país, um indicador de desemprego de 13.8% e cerca de 54,4 milhões de pessoas recebem o auxílio emergencial. No início de maio, a Caixa Econômica Federal informou que 1,8 milhão de pessoas solicitou suspensão do financiamento imobiliário. “Isso nos dá uma dimensão do superendividamento em razão da pandemia”. Ela mencionou, também, que 98 milhões de pessoas tiveram redução de renda desde o começo da crise sanitária.
Marques ressaltou a importância de uma célere tramitação da atualização do Código de Defesa ao Consumidor. Segundo ela, “o artigo mais importante diz respeito às formas de negociação e pagamento. Quando a negociação é feita em bloco, preservando o mínimo existencial, o devedor consegue comer, manter um teto, talvez comprar algum remédio e, principalmente, ele consegue pagar”, apontou.
Agenda 2030
Os debates da manhã terminaram abordando a Agenda 2030. A conselheira do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) Tereza Uile Gomes, coordenadora do Comitê Interinstitucional da Agenda 2030 no Poder Judiciário e do Laboratório de Inovação, Inteligência e ODS, apresentou como os 17 objetivos do desenvolvimento sustentável perpassam as temáticas enfrentadas pelo Judiciário. A juíza federal Sayonara Gonçalves da Silva Mattos atuou como moderadora.
Segundo Uile Gomes, a Agenda 2030 “tira a questão dos direitos humanos de um aspecto de maior subjetividade e traz para um campo de ciência de dados com algumas métricas que são mensuráveis. Estamos falando de métrica, indicadores de gestão”. Para a conselheira do CNJ, a agenda trabalha de forma transversal com todos os temas que são enfrentados pelo Poder Judiciário, como questões das pessoas de maior vulnerabilidade e temáticas indígenas.
Como exemplo, ela relatou que grande parte da população de rua de São Paulo sequer tinha documentos para acessar a renda emergencial disponibilizada pelo Governo Federal. “Foi feito um trabalho com a participação do Judiciário, do Ministério Público, das instituições, da OAB, com apoio do CNJ, para criar uma rede para atender essas pessoas no momento de pandemia”.
Negócios como força de transformação positiva
A programação da tarde iniciou ressaltando a importância do consumo consciente. O colíder e cofundador do Cidades+B Tomás de Lara abordou o papel do consumidor e do investidor em escolher produtos e negócios de empresas que também se guiem pela responsabilidade social e ambiental. A professora Aurélia Adriana de Melo teve o papel de moderadora da palestra.
Lara pontuou que “nós, como consumidores, temos um voto, que é o nosso dinheiro. Quando a gente colocar dinheiro em uma empresa, a gente está dando um voto, está dando energia e vida pra essa empresa. Se essa empresa não tem responsabilidade social e ambiental, o nosso dinheiro está indo pra uma empresa que está jogando contra o nosso bem estar, o bem comum, o valor integral. O momento, agora, é de pensar como as empresas podem criar valor integral”.
Arbitragem internacional e solução de controvérsias
A sequência da programação abordou a arbitragem internacional com a palestra do advogado e professor Jorge Luiz Fontoura. Ele iniciou pontuando o papel da arbitragem como ferramenta de pacificação social. O juiz federal Friedmann Anderson Wenpap foi o mediador do painel.
Fontoura acredita ser um “erro da formação jurídica construir o fazer jurídico voltado para o conflito, para o embate, para a aniquilação do adversário a qualquer preço. Não é isso. A ordem civilizada que pressupõe o Poder Judiciário é a mesma que pressupõe o caráter civilizado das partes. Isso é essencial quando se trabalha na arbitragem internacional”.
Reconstrução pós-pandemia
Encerrando o Webinário, a subprocuradora-geral da República aposentada Deborah Duprat enalteceu a relevância do projeto constitucional para se enfrentar os efeitos da crise sanitária e econômica de forma digna e eficiente. O procurador Regional da República Douglas Fischer participou como moderador.
Segundo ela, a Constituição Federal “busca um acerto de contas com um passado de violência, dominação e privilégios, que se inaugura com a conquista do território por europeus brancos que chegam invadindo os territórios indígenas”. Para Duprat, a Constituição Federal de 1988 é uma luta das populações que estão à margem contra o centro. “O art. 3º projeta uma sociedade mais igual, justa, livre de todos os tipos de discriminação, que consubstancia o princípio da solidariedade, porque a Constituição envolve todos os atores da vida social nacional nesse projeto coletivo”.
Conforme Duprat, é em um contexto de enfraquecimento das políticas públicas que a pandemia chega ao país. Ela aponta que “o mercado em crise não funciona e toda a atividade econômica está comprometida, com quase metade dos domicílios brasileiros vivendo do auxílio emergencial. Isso mostrou que, não há como encolher o Estado pensando que ele funciona sempre em condições ideais”. Para alterar essa realidade, a palestrante defende a revogação ou declaração de inconstitucionalidade da Emenda Constitucional nº 95, além de uma reforma tributária que melhore as condições dos mais desfavorecidos da sociedade.
Solidariedade
Online e gratuito, o evento também incentivou doações por meio de uma plataforma eletrônica de captação de recursos. O valor arrecadado tem sido convertido em cestas básicas e auxílio financeiro a mais de 60 entidades do sul do Brasil.
Ainda na abertura do Webinário, a juíza federal Daniela Tocchetto Cavalheiro, coordenadora do Inovatchê, reforçou a importância de pensar naqueles que estão sofrendo os efeitos da crise proveniente da pandemia de Covid-19. “Vamos ajudar porque só assim conseguiremos fazer a reconstrução solidária e sustentável necessária acontecer de verdade”, conclamou.
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