A manhã nublada e tranquila da capital paulista é irrompida pelo som metálico do gargarejo de um motor V8. É possível ouvir este som, rouco como um torcedor do Flamengo após dois títulos no mesmo final de semana, a muitos metros de distância. Imediatamente, todas as cabeças se viram na direção do novo Mustang Black Shadow , um veículo que dispensa apresentações, mas ainda não cansa de surpreender - mesmo quem o conhece tão bem.
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Como um fantasma, o Black Shadow devora o trânsito. Quem se atreve a ficar alguns segundos à sua frente logo dá a seta para a direita e abre caminho. A imponência que este ícone americano tem para reivindicar o seu espaço é, talvez, uma das coisas mais divertidas sobre ele. Mais alguns segundos de silêncio, e o 5.0 V8 da família Coyote volta a rugir.
Com a evolução da engenharia automotiva, os carros estão se tornando cada vez mais conectados, assistentes e tecnológicos. A bela Audi RS4 Avant que tanto amo tem a tração Quattro que praticamente a torna à prova de idiotas. Da mesma forma, o Kia Stinger GT prefere emular o gargarejo do motor cinco cilindros para dentro da cabine, zelando pela redução das emissões sonoras.
O Mustang parece olhar para ambos os casos enquanto pensa: "que se dane". Ele é muito barulhento (gritando a apenas 40 km/h) e pode ser difícil de controlar em seus modos mais permissivos. É o tipo de veículo que não coloca barreiras na relação entre homem e máquina, algo raro na atualidade.
Claro, é necessário ter braço para segurar um carro de tração traseira na hora de sentar o chinelo; por isso, decidi deixá-lo em seus modos menos indulgentes. Ainda assim, o Mustang não deixa de ser um carro equilibrado, com discos de freio nas proporções 380 mm x 34 mm, pinças de alumínio e seis pistões na dianteira. Basta pincelar o pé para que o alazão, mesmo em alta velocidade, reduza com violência.
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A suspensão magnética é uma verdadeira obra de arte, e talvez um de seus grandes trunfos ante o principal rival. A Ford preparou um arranjo adaptativo MagnaRide, onde os amortecedores se ajustam de acordo com as condições do motorista. Basicamente, o campo eletromagnético é aplicado via eletroímãs ao óleo viscoso da suspensão, dotado de micropartículas, alterando completamente o seu comportamento. Essa característica ajuda não apenas na hora de acelerar, mas também para ir à padaria sem que suas obturações saltem pela janela.
Os muscle cars sempre estiveram no imaginário popular como veículos imponentes, dotados de grandes motores, porém quase indirigíveis. Neste quesito, o Mustang se aproxima bastante de um carro europeu, e parece pronto para dar muito trabalho aos AMGs e Ms da vida. Já tive a oportunidade de acelerá-lo no Autódromo Velo Città, onde este esforço minucioso de engenharia para deixá-lo ainda mais equilibrado ficou bem evidente. Se você é fanboy dos esportivos da Mercedes-Benz ou da BMW, ele se aproximou bastante!
Uma das coisas mais legais sobre o Mustang é o leve destracionamento que acontece nas rodas traseiras durante as saídas de curva. Basta apontar a dianteira na direção da tangência para que a traseira - dependendo da dose no acelerador - saia "limpa". A rolagem da carroceria é outro ponto forte que não deve para nenhum europeu. Nessa categoria que sempre sofreu nas curvas, o Mustang é impressionante.
O Mustang aposta em uma entrega de força muito linear. Ao todo, são 466 cv de potência a 7.000 rpm e 56,7 kgfm de torque a 4.600 rpm. Sem aquela impulsão característica dos carros turbinados europeus, o Black Shadow pode girar até 8 mil sem fraquejar. De acordo com a Ford, o alazão pode atingir 100 km/h em apenas 4,3, com velocidade máxima de 250 km/h. Um verdadeiro tiro.
Outro grande trunfo do modelo é o câmbio automático de dez marchas. De início, pode-se até torcer o nariz. afinal, este tipo de transmissão não costuma cair tão bem em esportivos com motores grandes. O Jaguar XE V6 é um bom exemplo disso, onde a impressão que fica é que o conjunto não é capaz de extrair o máximo do motor.
A situação é diferente no Mustang, que aposta na elasticidade das transições. Ele é capaz de reduzir da oitava marcha diretamente para a terceira, se o motorista exigir. Em acelerações mais fervorosas, o Mustang ainda dá aquele leve solavanco nas trocas de marcha, característica que lembra bastante os esportivos da Porsche.
Outro ponto em que o esportivo americano e a fabricante de Stuttgart têm em comum é a sensibilidade da direção. Poucos conjuntos elétricos podem emular tão bem os antigos sistemas hidráulicos. Se você curte uma pegada mais "raíz" de condução, o Mustang Black Shadow comemorativo pode ser um prato cheio.
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Você dificilmente encontrará uma sensação parecida com a do Mustang Black Shadow por R$ 315.900 em uma marca alemã ou inglesa. Neste caso, sua guerra eterna com o Camaro continua. Talvez o modelo da GM seja mais "muscle" e menos "rua" que o alazão da Ford, agradando aqueles que procuram um veículo mais visceral. Enquanto você toma sua decisão, vamos acelerar um pouco mais…
Ficha Técnica - Ford Mustang GT 5.0 V8 Black Shadow
Preço: a partir de 315.900
Motor: 5.0, V8, 32 válvulas, gasolina
Potência: 466 cv a 7.000 rpm
Torque: 56,7 kgfm a 4.600 rpm
Transmissão: Automático, dez marchas, tração traseira
Suspensão: Independente, McPherson (dianteira) / Independente (traseira)
Freios: Discos ventilados (dianteiros e traseiros)
Pneus: 255/40 R19 (dianteiros) e 275/40R 19 (traseiros) Michelin Pilot
Dimensões: 4,79 m (comprimento) / 1,92 m (largura) / 1,38 m (altura), 2,72 m (entre-eixos)
Tanque: 60 litros
Porta-malas: 382 litros
Consumo gasolina: 5,9 km/l (cidade) / 8,9 km/l (estrada)
0 a 100 km/h: 4,3 segundos
Velocidade máxima: 250 km/h