Participantes de debate na Câmara dos Deputados discordaram a respeito de artigo no projeto de combate às fake news (PL 2630/20), que trata sobre a guarda de registros dos envios de mensagens em encaminhamentos em massa pelos serviços de mensageria privada, como o Whatsapp.
O papel dos aplicativos de mensagens na desinformação foi discutido nesta quinta-feira (26) pelo grupo de trabalho criado para elaborar um parecer à proposta.
De acordo com o “PL das fake news”, as empresas deverão guardar, pelo prazo de três meses, os registros dos envios de mensagens veiculadas em encaminhamentos em massa. São enquadrados como encaminhamentos em massa os envios de uma mesma mensagem para grupos de conversas e listas de transmissão por mais de cinco usuários em um período de 15 dias, que alcançarem pelo menos mil usuários.
Os registros devem conter a indicação dos usuários que realizaram encaminhamentos em massa da mensagem, com data e horário do encaminhamento e o quantitativo total de usuários que receberam a mensagem. O acesso aos registros somente poderá ocorrer com ordem judicial, para fins de responsabilização penal pelo encaminhamento em massa de conteúdo ilícito.
O professor da Universidade de São Paulo (USP) Pablo Ortellado defendeu a medida. “É uma medida equilibrada e limitada por todos os lados. Ela guarda metadados apenas da comunicação de massa, só reencaminhamentos para múltiplos usuários, então, qualquer comunicação que não tenha esse formato, não precisará ser guardada", explicou.
Ortellado disse ainda que esses metadados são guardados por um período muito curto, de apenas três meses, metade do prazo de guarda de dados previsto no Marco Civil da Internet, e que determina sua destruição posterior.
Direitos Humanos
Já para Veridiana Alimonti, analista de Políticas Públicas para América Latina da Electronic Frontier Foundation, a proposta de guarda dos registros de envios de mensagens em encaminhamentos em massa é problemática, sob o ponto de vista dos direitos humanos.
“Esse padrão de guarda é, sim, problemático do ponto de vista de parâmetros internacionais de direitos humanos. E já foi estabelecida de diferentes formas, em diferentes relatórios de organizações das Nações Unidas, a necessidade de esse tipo de guarda ser feita de forma específica, caso a caso, para pessoas especificamente investigadas", disse.
Segundo Veridiana, esses parâmetros refletem as preocupações em relação ao "vigilantismo", que se intensificaram e ganharam projeção mundial com as declarações do Edward Snowden, reveladas em junho de 2013.
Pontos positivos
Por outro lado, Ivar Hartmann, professor do Instituto de Ensino e Pesquisa (Insper), citou pontos que considera positivos no artigo debatido, como a não exigência de quebra de criptografia, e o escopo específico de atuação. Ele citou ainda quais dados são de fato retidos: a identidade do usuário que fez o envio, a data e o horário do envio, e o total de usuários que receberam a mensagem.
"A identidade dos usuários que receberam a mensagem não faz parte do conjunto de dados retidos. Os dados retidos não abrangem o conteúdo da mensagem. A finalidade também não é aberta, é absolutamente restrita, nós estamos falando exclusivamente da produção de prova em inquérito ou processo criminal”, observou.
Críticas
O diretor de Políticas Públicas do Whatsapp, Dario Durigan, considera o texto uma resposta ruim ao problema das notícias falsas. “O Whatsapp é contra a rastreabilidade porque ela altera um produto seguro e privado, que é utilizado por mais de dois bilhões de pessoas", ressaltou.
Para Durigan, a proposta viola direitos fundamentais. Ele também alertou para a diferença entre "rastrear uma determinada cadeia de mensagem" e "identificar o criador original de um conteúdo.”
O grupo de trabalho que analisa o Projeto de Lei das Fake News é relatado pelo deputado Orlando Silva (PCdoB-SP) e coordenado pela deputada Bruna Furlan (PSDB-SP), que presidiu a audiência.
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