Apesar de reconhecerem a necessidade da participação da sociedade civil em parcerias com o poder público para a concretização de políticas para os idosos, representantes de várias entidades se posicionaram contra o projeto de lei (PL 4416/19) que obriga as organizações com mais de cinco projetos sociais a destinarem um deles para a população mais velha.
Em debate na Comissão de Defesa dos Direitos da Pessoa Idosa da Câmara dos Deputados nesta segunda-feira (12), eles afirmaram que a proposta é uma interferência indevida do Estado no trabalho das organizações e pode surtir o efeito inverso do pretendido, diminuindo o atendimento à população vulnerável e passando para a sociedade civil uma obrigação que é governamental.
O projeto, de autoria do deputado Ossésio Silva (Republicanos-PE), modifica o Marco Regulatório das Organizações da Sociedade Civil, estabelecendo essa obrigatoriedade de um projeto para idosos às entidades que tenham mais de cinco atividades no segmento social.
Uma nova versão do texto, feita pelo relator, deputado Roberto Alves (Republicanos-SP), especifica que o objeto da proposta são projetos de interesse público e cunho social, diante da impossibilidade do Estado de atender a todas as demandas e do envelhecimento acelerado da população.
Liberdade e autonomia
A estimativa é que existam cerca de 800 mil organizações da sociedade civil em todo o País. Para Laís Lopes, consultora da plataforma que acompanha a implementação do marco regulatório, a proposta fere o princípio da liberdade de associação e a autonomia das organizações.
“Na letra da lei, quando a gente menciona atividades ou projetos, a gente está falando desses tipos de objetos que possam ser feitos em parceria com a administração pública. Então, como a lei vai poder obrigar a organização da sociedade civil a destinar algo que o orçamento, por exemplo, eventualmente não esteja vinculado, o edital não trate sobre esse tema? ”
A representante da Federação Nacional das Associações Pestalozzi, Edna Alegro, destacou algumas dificuldades práticas para se adequar à mudança, como a falta de orçamento para custear as modificações necessárias e a falta de qualificação para atender a uma parcela da população que não estava na proposta original da entidade.
“Hoje, por baixo, nós temos uns 20 projetos. Então vou deixar de fazer um deles para atender a pessoas idosas? Quem vai dar conta desse público que eu atendia antes? O que será dele? Eu vou atender a um público novo, sem conhecimento, vai ter que ter toda uma readequação, uma reordenação, contratação de equipe nova", declarou.
A Pestalozzi atende a pessoas com deficiências intelectuais e múltiplas, além de autismo.
Baixo investimento
Os debatedores defenderam o fortalecimento do marco regulatório das Organizações da Sociedade Civil e criticaram a redução de investimentos do governo em ações sociais por conta do equilíbrio fiscal do País.
A deputada Tereza Nelma (PSDB-AL), que mediou a audiência pública sobre o tema, propôs novo encontro para fazer um diagnóstico sobre a situação das organizações da sociedade civil, utilizando, por exemplo, um mapeamento já feito pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).
Ela ressaltou a vocação dos brasileiros para a solidariedade, ao mesmo tempo em que, muitas vezes, falta capacitação para atuar no chamado terceiro setor.
“Quando alguém diz assim: ‘Eu quero criar uma associação’, digo: ‘Você sabia que uma associação é uma família? Você sabia que uma associação tem despesas? Você sabia que uma associação vai fazer parte da sua vida, você deixa de ser uma pessoa física para ser uma pessoa jurídica? ”, observou.
Durante a audiência, a parlamentar pediu ajuda aos integrantes da sociedade civil para elaborar uma nota técnica com sugestões que aprimorem o projeto em discussão na Comissão de Defesa dos Direitos da Pessoa Idosa.
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