Desde o começo de 2020, a pandemia da Covid-19 mudou o cotidiano de muitas pessoas. Mas no meio de tantas tristezas que essa doença provocou, um amor surgiu e um casal se formou. Essa é a história de Debora Leão, 29, e Caio Samura, 26, e como eles se tornaram noivos durante a pandemia sem deixar de tomar todos os cuidados possíveis, com eles e com os outros.
A história de Débora com Caio começou antes do início da pandemia em Recife, capital de Pernambuco, cidade onde eles vivem. Eles se conheceram pelo Tinder e combinaram de se encontrar nas ladeiras de Olinda, no Carnaval. "Ele deixou o celular em casa e disse que estaria por lá com um short verde limão. Já é impossível encontrar alguém no Carnaval de Olinda. Óbvio que não deu certo", conta Débora. Como não se encontraram, foi apenas em 8 de março, um mês depois, que ela comentou um "oi, sumido" em uma foto que ele publicou nos stories do Instagram. Ele respondeu e no mesmo dia, eles tiveram o primeiro encontro no Alto da Sé, também em Olinda.
"A química que rolou foi incrível e a gente já saiu de lá certos de que iriamos nos ver novamente nos próximos dias. Mas, durante a semana, eu fui a uma consulta médica e, no dia seguinte, tive que ser internada no hospital. Na sexta-feira 13, dia do aniversário dele, eu passei por uma cirurgia. A TV do quarto e as enfermeiras do hospital só falavam em uma coisa: o primeiro caso do novo coronavírus acabava de ser confirmado em Pernambuco", lembra Débora. A cirurgia que ela precisou fazer foi de emergência, para resolver um problema na coluna. Em período pós-cirúrgico e, agora, de quarentena, por causa do novo coronavírus, ela conta que pensava em não sair de casa por muito tempo. A história com o Caio ficaria em segundo plano. "Com as coisas fechando no estado, minha família e eu abraçamos mesmo a campanha #fiqueemcasa. A gente se trancou, não entrava nem iFood. Não recebemos visitas, mesmo que fossem parente. Endossamos o coro do isolamento. Estávamos muito apreensivos e com medo da pandemia, acompanhando tudo pela imprensa", diz Débora. Apesar disso, a conversa com Caio seguia continuou. Logo os dois estavam se falando diariamente. "Ele me contava as coisas dele: que havia acabado de perder o emprego por causa da pandemia, que sentia falta da academia, que estava fechada. Eu contava sobre minha recuperação. Aos poucos, a gente falava sobre família, bichos de estimação, gostos semelhantes, concordâncias e discordâncias políticas", conta ela. "Ele virou meu personal trainer à distância, me passava várias dicas de exercícios e alimentação. Na época, perdi cerca de 7kg, enquanto todo o mundo engordava em casa. Eu virei "professora de redação", ajudando ele com dicas de texto para provas que ele iria prestar. Era mais um motivo para gente se falar todo dia. A gente se aproximou muito nesse período", conta. À medida em que a conversa ia ficando mais interessante e os laços ficando mais fortes, ele começou a convidá-la para ir na casa dele. "Rolê de quarentena, sem precisar se expor na rua. Mas eu negava. Eu era ‘quarentener raiz’. Na minha casa, não saíamos nem para comprar pão. Tudo delivery e com toneladas de álcool em gel", diz ela.
As tentativas de Caio para um segundo encontro foram muitas. Mas à medida em que o tempo passava, a situação da pandemia piorava no Recife e em todo o estado de Pernambuco. O Governo do Estado chegou a decretar um lockdown para a capital. Então, Débora sempre recusava os convites e adiava a possibilidade de reencontro dos dois.
Ela conta que a situação não era fácil para ela. Em abril, um tio de Débora faleceu por causa da Covid-19. Ela não foi ao enterro. Em maio, a mãe de uma grande amiga chegou a ser entubada, também vítima do novo coronavírus. "Cada notícia que chegava, eu adiava o encontro com Caio. Cheguei a achar que não ia rolar mais. Eu lembro de mandar vários textões explicando a ele que não rolaria, achando que ele ia ‘morgar’ comigo. Mas ele sempre entendia e esperava", afirma Débora. Ela conta que em nenhum momento teve medo de contrair a doença e ficar mal, mas sim de transmitir para os pais, idosos, e para a irmã, todos morando na mesma casa. "Isso me impedia de sair". Sem conseguir mais lidar com a vontade de encontra-lo e o medo do vírus, Débora tomou uma decisão, convidando-o para dar uma volta no calçadão, que estava interdidado, da orla de Olinda. Para isso, ela impôs três condições: eles não iriam se abraçar, ficariam de máscara o tempo todo e apenas andariam lado a lado.
"Cheguei a colocar um vinho na bolsa e dois copos. Frascos de álcool gel e máscaras reservas. Fomos à praia de Uber, numa sexta-feira à noite e, ao chegarmos na orla, demos um abraço estranhíssimo. Ele queria me abraçar, mas eu me lembrava da regra número 1. Então foi um quase abraço, uma coisa esquisita", conta Débora. De acordo com ela, eles caminharam pela orla e sentaram em uma faixa de areia onde não havia ninguém e estava escuro. "De frente para o mar, completamente sozinhos, conversamos por algum tempo, até que começou a chover muito forte e a gente não tinha como se proteger. De repente, a gente estava se beijando, se agarrando, rolando pela areia na chuva, tal qual filme americano ou novela. As regras foram todas por água abaixo. Saímos da praia quase de madrugada e voltei para casa com uma mistura de sentimentos. Parte de mim estava em êxtase pelo encontro maravilhoso e outra parte em pânico por ter furado a quarentena", relata. Durante a semana seguinte, Débora afirma que tentou se isolar no próprio quarto para evitar as possibilidades de contaminação dos parentes, caso ela estivesse infectada e assintomática. Mas a vontade de sair de novo e encontrar Caio mais uma vez era grande. A mistura de sensações, sentimentos e pensamentos a levou a fazer uma segunda proposta para ele: eles deveriam se isolar juntos por 15 dias. "Falei 'bom, para sair de casa agora, só se eu ficar de quarentena por 15 dias'. Era uma brincadeira com fundo de verdade. Soltei e ele topou: ‘e se a gente alugar um Airbnb para ficar juntos em quarentena nesse tempo?’", conta Débora. Os dois alugaram um flat no bairro de Boa Viagem, na zona sul do Recife, com uma boa estrutura para que ela pudesse trabalhar e viver normalmente durante os 15 dias, incluindo três fins de semana, em que estariam juntos. "Foi tudo muito novo e muito doido. Era bem empolgante, tipo viagem de escola, mas ao mesmo tempo, lembro que no segundo dia a gente olhou um para a cara do outro e falou ‘que doideira da porr* (risos)’", relembra Débora. Até então, Débora Leão nunca tinha morado sozinha ou tido a experiência de dividir um apartamento com namorados ou amigos. Sempre havia morado com os pais e a irmã.
"Éramos apenas "conhecidos" dividindo uma casa. Só nós dois. Esse período foi muito intenso e fez a gente acelerar as coisas. Aprendi a estar com uma pessoa e ver como é o dia a dia na prática, as tarefas domésticas, rotina, gostos pessoais, preferências... Foi uma aventura inédita para nós dois, mas foi fantástica. Quando saímos do flat, no final de julho, a gente já era um casal. Oficializamos tudo na semana seguinte", afirma Débora. Depois que saíram do flat, a relação seguiu cuidadosa. Decidiram que só sairiam de casa para visitar um ao outro. O medo continuava o mesmo: transmitir o coronavírus para as famílias em casa. Juntos desde o início de agosto, ele passou o Dia dos Pais na casa dela e ela conheceu a família dele inteira. Em outubro, ele a pediu em casamento e ficaram noivos. Agora, neste mês de janeiro, de férias, alugaram outro flat, também em Boa Viagem, para poderem ficar juntos novamente. "Está sendo bem incrível", conta Débora. "Para 2021, a gente quer a vacina, seguida de uma festa de casamento com todo mundo que a gente gosta entre os convidados. E, claro, já estamos procurando apartamento para morar juntos", finaliza.