Senadores manifestaram indignação nesta sexta-feira (20) pela morte de João Alberto Silveira Freitas, homem negro de 40 anos que foi espancado por dois seguranças brancos de um supermercado da rede Carrefour, em Porto Alegre (RS). O caso aconteceu na quinta-feira (19), véspera do Dia da Consciência Negra.
O presidente da Comissão de Direito Humanos (CDH), senador Paulo Paim (PT-RS), emitiu uma nota de repúdio (leia íntegra ao fim da matéria) em que manifesta "tristeza e indignação" com o acontecimento, transmite condolências à família da vítima e garante que vai trabalhar pela punição dos responsáveis. Paim também destacou não ser a primeira vez que um estabelecimento da rede Carrefour é palco de cenas de violência e discriminação racial. O senador convidou representantes da empresa para participarem de um encontro virtual para tratar do tema.
Em mensagem nas redes sociais, Paim também urgiu a apreciação da sugestão legislativa que que pune policiais que atuam motivados por preconceito (SUG 23/2020). Apresentada pela UNEafro Brasil como ideia legislativa, e apoiada por mais de 20 mil cidadãos no Portal e-Cidadania, a sugestão tem relatoria do próprio Paim e ainda precisa ser convertida em projeto de lei pela CDH. A proposta não se aplicaria ao caso em questão, pois se destina apenas à segurança pública, mas um dos seguranças responsáveis pela morte de João Alberto é um policial militar.
"Lamentavelmente a história se repete. Mais uma pessoa negra é espancada e assassinada covardemente. Ódio, violência, racismo, discriminação, intolerância... Até quando? O sangue das senzalas ainda continua a jorrar no Brasil", protestou Paim.
Já o senador Fabiano Contarato (Rede-ES) apresentou uma denúncia contra a rede Carrefour ao Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH), órgão vinculado ao Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, e um voto de repúdio contra a empresa ao Plenário do Senado (RQS 2.724/2020). Ele também classificou o ato como um "crime brutal e racista" que "precisa ser punido".
"No Dia da Consciência Negra, esse crime, de assassinato gratuito, nos faz uma advertência macabra: o sangue negro segue escorrendo pelas ruas, sem causar perplexidade. Será só mais um capítulo de um pacto tácito e naturalizado de extermínio racial?", questionou.
Também representante do estado do Rio Grande do Sul, o senador Lasier Martins (Podemos) lamentou a "inconsciência negra" demonstrada pela morte de João Alberto, e disse esperar que o caso se torne "um marco" para a conscientização da população.
"Episódios como este envolvendo o cliente de um supermercado de Porto Alegre, na véspera do Dia da Consciência Negra, são tristes e reveladores. É hora de lamentar a violência, exaltar a consciência e trabalhar por dias de mais igualdade e respeito", escreveu.
O presidente do Senado, Davi Alcolumbre, se pronunciou destacando o papel do racismo estrutural na perpetuação de casos como o da capital gaúcha.
"No Dia da Consciência Negra, o assassinato brutal de João Alberto Freitas, espancado até a morte por seguranças de um supermercado, em Porto Alegre, estarrece e escancara a necessidade de lutar contra o terrível racismo estrutural que corrói nossa sociedade".
Presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), a senadora Simone Tebet (MDB-MS) afirmou que a data de 20 de novembro fica marcada neste ano pelo ocorrido. Ela comunicou solidariedade à família de João Alberto e a outras que já passaram pelo mesmo luto.
"Gostaria de celebrar a herança cultural e o avanço das ações afirmativas em prol da comunidade negra. No entanto, o PESAR é mais forte. O João Alberto é mais uma vítima do RACISMO", escreveu.
A senadora Eliziane Gama (Cidadania-MA) criticou o silêncio da Fundação Cultural Palmares, entidade ligada ao Ministério da Cidadania que tem por missão promover e preservar a história da influência negra na formação da sociedade brasileira. A fundação, que tem sido alvo de críticas por atacar personalidades negras brasileiras nas redes sociais, não emitiu nenhuma manifestação oficial sobre o caso.
"Lamentável a omissão da Fundação Palmares ante o assassinato de João Alberto no Sul. Em pleno Dia Nacional da Consciência Negra, nenhuma palavra, nenhuma nota. A instituição é hoje uma das faces mais perversas deste governo", afirmou a senadora, que também cobrou ação do Congresso sobre o setor da segurança privada.
Outros senadores também se manifestaram sobre o assunto nas redes sociais:
Nota de repúdio do senador Paulo Paim (PT-RS):
Na condição de Presidente da Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa do Senado Federal repudio veementemente mais um ato covarde e criminoso contra pessoa negra. Assisti com tristeza e indignação mais uma vez atos de intolerância e de discriminação racial ocorridos contra um homem negro que foi espancado em instalações do Carrefour, desta vez até a morte, na capital do meu estado, Porto Alegre-RS. A vítima é João Alberto Silveira Freitas, de 40 anos.
Ao tempo que apresento minhas sinceras condolências à família do Senhor João Alberto, afirmo que não pouparei esforços para que este crime seja punido e reafirmo que combato firmemente a intolerância e a discriminação de toda espécie. Esta atitude não irá esmaecer nossas conquistas sociais.
Com tristeza, recebo há meses notícias da imprensa sobre violência, intolerância e discriminação racial acontecidas nas dependências do Grupo Carrefour.
Isto posto, convidei o Grupo Carrefour para participar de live que acontecerá hoje sobre a temática do racismo, em atendimento ao clamor da população, que acompanha estarrecida os acontecimentos dessa natureza naquela instituição, como por exemplo:
1) Em Recife, o corpo do Senhor Moisés Santos, de 53 anos, foi coberto com guarda-sóis e cercado por caixas, para que a loja seguisse em funcionamento e permaneceu no local entre 8h e 12h, até ser retirado pelo Instituto Médico Legal (IML);
2) Em setembro, deste ano, no Rio de Janeiro, a Senhora Nataly Ventura da Silva, de 31 anos, foi surpreendida com a frase "só para branco usar" escrita em seu avental e assinada por um colaborador do Grupo Carrefour;
3) Em maio de 2019, a 5ª Vara do Trabalho de Osasco identificou condições consideradas degradantes para os empregados porque o Carrefour estaria controlando a ida dos empregados ao banheiro;
4) Em dezembro de 2018, um cão que estava no estacionamento de uma das lojas da empresa, em Osasco, morreu após ser envenenado e espancado por um funcionário;
5) Em outubro de 2018, funcionários da empresa, em São Bernardo do Campo, no ABC Paulista, agrediram Luís Carlos Gomes, porque ele abriu uma lata de cerveja dentro da loja. Surpreendido pelos trabalhadores, o cliente reiterou que pagaria pelo item. Mesmo assim, ele foi perseguido pelo gerente da unidade e por um segurança e depois encurralado em um banheiro, onde recebeu um mata-leão;
6) Em 2009, seguranças da rede de hipermercados agrediram o vigia e técnico em eletrônica Januário Alves de Santana, de 39 anos, no estacionamento de uma unidade em Osasco. Ele teria sido confundido com um ladrão e foi acusado de roubar o próprio carro, um EcoSport.
Vamos continuar nossa luta pelo respeito, proteção e dignidade de cada ser humano.
Vidas negras importam.
Todas as vidas importam.
Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)