Ativistas e jornalistas estão entre os principais alvos da junta que vem governando o país, que agora passou também a confiscar telefones celulares de pessoas nas ruas como forma de intimidação e bloqueio de comunicações pessoais que possam ameaçar o regime.
O golpe depôs o governo eleito da líder civil Aung San Suu Kyi. Ela foi detida na sequência dos atos que interromperam uma década de governo democrático.
A Associação de Assistência para Prisioneiros Políticos (AAPP), um grupo de defesa baseado no exterior, afirma que pelo menos 5, 1 mil pessoas estão detidas no país, que vive seu pior período de opressão em uma história marcada por autoritarismo.
Todos os jornais independentes foram fechados ou levados a suspender atividades, restando à população poucos sites de notícias com acesso restrito devido a bloqueios de sinal de internet. Jornalistas vêm sendo presos e condenados no país e até fora dele, como ocorreu com três repórteres que conseguiram fugir para a Tailândia e acabaram sentenciados a sete meses de prisão pelo governo aliado de Mianmar.
O confisco de telefones de pessoas andando nas ruas, mais nova ação do governo para inibir os que ainda tentam assumir posição contra o golpe, foi noticiado por um dos poucos veículos que resiste à censura, o site Mianmar Now. De acordo com a AAPP, citada pelo jornal, o regime está “transformando os telefones celulares dos cidadãos em armas para serem usados contra eles”.
A entidade afirma que a junta introduziu mudanças legislativas que tornaram mais fácil realizar a vigilância eletrônica.”Embora nenhuma nova lei tenha sido promulgada ainda, a Lei de Proteção à Privacidade e Segurança dos Cidadãos já foi alterada para permitir que ela intercepte e inspecione livremente os serviços de telecomunicações”, disse a organização.
Menos de duas semanas depois do golpe, a junta revogou artigos da lei que exigiam a presença de testemunhas durante buscas domiciliares e que tornavam ilegal a interceptação de ligações telefônicas sem mandado.
Em Yangon, a antiga capital, os jovens dizem que correm um risco especial porque é a geração deles – conhecida como “Geração Z” – que está na vanguarda do movimento anti-golpe.
“Qualquer coisa que mostre que apoiamos o movimento, como uma foto da saudação de três dedos, é o suficiente para nos prender e torturar”, disse um jovem morador de Yangon ao site Mianmar Now.
Uma mulher da cidade de Mandalay, segunda maior do país, contou ao jornal que caminhava na em uma rua movimentada quando foi parada por um membro das forças armadas e recebeu ordem de entregar o celular. Ela disse que o militar examinou a galeria de fotos, leu mensagens e verificou a conta do Facebook Messenger.
Como o conteúdo que pudesse ser tomado como incriminatório já tinha sido removido, ela escapou de ser presa como tantos outros. Mas o susto fez com que adotasse autocensura, deixando de compartilhar fotos e mensagens nas redes.
“O objetivo é instilar medo em todos, violando sua privacidade em todos os níveis, seja invadindo suas casas ou confiscando seus telefones”, disse um membro da AAPP que não se identificou por mede de represálias.
A comunidade internacional e entidades como a ONU vêm denunciando seguidamente as violações dos direitos humanos, incluindo execuções extrajudiciais, detenções arbitrárias, tortura, maus-tratos e desaparecimentos forçados.
O coordenador residente e humanitário da ONU em Mianmar, Ramanathan Balakrishnan, destacou o sofrimento de pessoas. severamente afetadas no país. O cenário é agravado pela terceira onda de Covid-19.
O sistema de saúde de Mianmar enfrenta “extrema pressão” por causa da crise do coronavírus, bem como ataques a equipes médicas e instalações. Alguns funcionários integram um “movimento de desobediência civil”, que interrompeu serviços básicos em todo o país.
A organização aponta que as minorias étnicas estão sob risco ainda maior, por resistirem às forças de segurança. Segundo a ONU, mais de 200 mil pessoas foram expulsas de suas casas.
O Plano de Resposta Humanitária feito antes da crise contabilizada cerca de 1 milhão de pessoas precisando de ajuda humanitária. Após a ação dos militares, outros 2 milhões de birmaneses passaram a precisar de apoio urgente, principalmente em grandes cidades como Yangon e Mandalay.