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Polícia invade jornal de oposição em Hong Kong e faz cinco prisões por violação à lei de segurança nacional

O jornal Apple Daily, de Hong Kong, que vem resistindo ao endurecimento da censura imposta pelo governo chinês a ativistas e imprensa, foi invadido por forças policiais na manhã desta quinta-feira (17/6).

Redação
Por: Redação
17/06/2021 às 20h15
Polícia invade jornal de oposição em Hong Kong e faz cinco prisões por violação à lei de segurança nacional

O jornal Apple Daily, de Hong Kong, que vem resistindo ao endurecimento da censura imposta pelo governo chinês a ativistas e imprensa, foi invadido por forças policiais na manhã desta quinta-feira (17/6). O editor-chefe e quatro executivos foram presos sob acusação de violarem a lei de segurança nacional do território. Computadores e anotações de repórteres foram examinados e apreendidos, e ativos do jornal foram congelados. 

O jornal é de propriedade de Jimmy Lai, principal empresário de mídia de Hong Kong, de 73 anos, com patrimônio estimado em US$ 1 bilhão, que está cumprindo uma sentença de 14 meses de prisão desde 16 de abril por “assembleias não autorizadas” durante os protestos pró-democracia de 2019.

O jornal transmitiu ao vivo a operação policial em suas mídias sociais.

Segundo divulgou o Apple Daily no Twitter, o CEO Cheung Kim-hung, o COO Royston Chow, o editor-chefe Ryan Law, o editor associado Chan Pui-man e o diretor da plataforma do Apple Daily Digital, Cheung Chi-wai, foram levados por policiais, sob acusação de violar o Artigo 29 da lei de segurança nacional imposta por Pequim, que proíbe “conluio com um país estrangeiro ou com elementos externos para pôr em perigo a segurança nacional”.

O jornal relatou que por volta das 7h30 de quinta-feira, centenas de policiais invadiram a sede, bloqueando todas as entradas. Os funcionários foram obrigados a registrarem-se com RG e dados pessoais antes de serem autorizados a entrar. Só podiam entrar na cantina e eram impedidos de ir a outras áreas da redação. Os jornalistas não foram autorizados a regressar às suas mesas e foram impedidos de filmar ou transmitir ao vivo a operação.

Autoridade acusa jornal de incentivar boicote à China 

Em uma coletiva de imprensa na manhã de quinta-feira, Steve Li, superintendente sênior da unidade de segurança nacional, disse que as autoridades congelaram HK $ 18 milhões (US $ 2,32 milhões) em ativos pertencentes à Apple Daily Limited, Apple Daily Printing Limited e AD Internet Company .

Li acusou o jornal de publicar mais de 30 artigos, tanto online quanto impressos e em chinês e inglês, que buscavam sanções estrangeiras. “Os artigos questionáveis ​​desempenham um papel crucial na conspiração”, disse Li. 

John Lee, Secretário de Segurança, acusou o Apple Daily de usar “o jornalismo como uma ferramenta para colocar em risco a segurança nacional” e um “guarda-chuva” para se proteger. Ele disse que a polícia está investigando ativamente se pessoas dentro ou fora do Apple Daily participaram ou instigaram atos que colocam em risco a lei de segurança nacional. 

Lee evitou perguntas repetidas sobre se os artigos são reportagens ou artigos de opinião. Ele ressaltou que a operação não tem como alvo a imprensa em geral e pediu aos” jornalistas normais” que “mantenham distância dos criminosos”.

Policiais foram filmados vasculhando computadores da redação

A Associação de Jornalistas de Hong Kong expressou preocupação com a operação e a prisão. “Na transmissão ao vivo da operação, policiais foram vistos ligando os computadores nas mesas dos repórteres, disse o presidente Chris Yeung.

Ele disse que não conseguia entender porque o jornalismo violaria a lei de segurança nacional e questionou os objetivos da apreensão de materiais jornalísticos. O mandado de busca e apreensão de materiais jornalísticos mostra que a liberdade de imprensa está seriamente comprometida pela lei de segurança nacional. “Não há proteção zero para as notícias”, ele rebateu, segundo o Apple Daily reportou. 

Repressão ao grupo de comunicação está ligada a protestos

A repressão que está sufocando o Apple Daily é consequência da reação da China aos protestos pró-democracia que começaram em  2019, estimulados pelo aperto cada vez maior de Pequim sobre as amplas liberdades prometidas a Hong Kong após seu retorno ao domínio chinês em 1997. 

A cidade portuária foi colônia britânica por 150 anos e virou um importante centro financeiro e de negócios. Um acordo entre a China e o Reino Unido devolveu Hong Kong ao controle chinês, prevendo uma administração sob o modelo “um país, dois sistemas”, em que o regime comunista não seria estendido ao território. 

Mas, gradativamente, a China passou a adotar iniciativas para limitar críticas, gerando uma onda de protestos que explodiu em 2019, com a população tomando as ruas da cidade. A repressão foi severa, e em 2020 entrou em vigor a nova Lei de Segurança Nacional, com penas severas até de prisão perpétua para crimes como secessão, subversão, terrorismo ou conluio com forças estrangeiras. 

O motivo alegado para a invasão desta quinta-feira foi a cobertura do Apple Daily sobre as relações entre a China e Hong Kong e o pedido de sanções ocidentais. Em uma entrevista coletiva, Li Kwai-wah, chefe da força policial, declarou ter “fortes evidências de que os artigos questionáveis ​​desempenham um papel crucial na conspiração, que fornece munição para países estrangeiros”. 

Next Digital vem sendo alvo do governo chinês

O grupo Next Digital, que além do Apple Daily de Hong Kong tem outro jornal de mesmo nome em Taiwan e diversos negócios em mídia, virou um dos principais alvos da repressão chinesa sobre os que querem a manutenção da democracia em Hong Kong.

Em 14 de maio, o gabinete de segurança da cidade havia anunciado o congelamento das ações de Jimmy Lai no grupo, bem como ativos nas contas bancárias locais de três empresas pertencentes a ele. O magnata da mídia detém atualmente 71,26 por cento das ações da Next Digital, avaliadas em mais de US$ 44 milhões.

A medida tinha o objetivo de evitar que “bens relacionados ao crime” fossem removidos de Hong Kong, disse o departamento de segurança em um comunicado. O congelamento pode ter dificultado o envio de recursos para o jornal do grupo em Taiwan, levando à decisão de suspender o impresso, com a demissão de mais de 300 profissionais. O diretor de redação, Chang Ye-Shing, renunciou ao cargo. 

Jimmy Lai criou a empresa em 1995, quando lançou o Apple Daily Hong Kong, em chinês e inglês, tornando-se uma das principais vozes a favor da democracia local. A condenação do empresário, junto com ativistas contrários ao governo de Hong Kong controlado pela China, gerou críticas de governos ocidentais e de grupos de direitos humanos. 

A condenação injusta desses ativistas sublinha a intenção do governo de eliminar toda a oposição política”, disse a diretora da Anistia Internacional para a Ásia, Yamini Mishra.

A organização Repórteres sem Fronteiras também protestou, pedindo libertação imediata de Lai e o fim do assédio judicial contra ele. O empresário foi premiado com o 2020 RSF Press Freedom Awards (Prêmio de Liberdade de Imprensa). 

Um ano e dois meses de prisão por participar de dois protestos pacíficos é uma punição totalmente desproporcional que revela como o governo está desesperado para silenciar Jimmy Lai, um símbolo da liberdade de imprensa em Hong Kong ”, disse Cédric Alviani, chefe da RSF no Leste Asiático.

Após contatos com governo dos EUA, Jimmy Lai foi preso e processado

Segundo a organização, a condenação é parte de uma campanha de assédio judicial de longa duração contra Lai, que está detido desde dezembro de 2020. O empresário enfrenta seis outros processos por fraude, conspiração para perverter o curso da Justiça e por conspirar com forças estrangeiras, correndo o risco de prisão perpétua à luz da nova Lei de Segurança Nacional.

Lai tinha trânsito livre em Washington, tendo se encontrado com autoridades como o ex-secretário de Estado Mike Pompeo, para angariar apoio ao movimento pela democracia de Hong Kong, levando Pequim a rotulá-lo de “traidor”.

Em 12 de abril, em uma carta escrita em sua cela de prisão,  ele pediu os funcionários do Apple Daily para “se manterem firmes”: “É nossa responsabilidade como jornalistas buscar a justiça. Contanto que não estejamos cegos por tentações injustas, contanto que não permitamos que o mal passe por nós, estaremos cumprindo nossa responsabilidade. ”

Hong Kong, que segundo a RSF  já foi um bastião da liberdade de imprensa, caiu do 18º lugar em 2002 para o 80º lugar no Índice Mundial de Liberdade de Imprensa da organização. A República Popular da China, por sua vez, estagnou em 177º de 180º.

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