A suposta demora do governo federal para adquirir vacinas contra a covid-19 dominou a primeira parte do depoimento do ex-secretário-geral do Ministério da Saúde Antônio Elcio Franco Filho, à CPI da Pandemia, nesta quarta-feira (9). O depoente defendeu as ações do governo.
Franco, que é coronel da reserva, foi o segundo nome da hierarquia da pasta entre junho de 2020 e março de 2021, na gestão do general Eduardo Pazuello. As perguntas dos senadores centraram fogo na relutância do governo federal em adquirir e financiar a CoronaVac, vacina produzida após acordo entre a China e o Instituto Butantan, de São Paulo; e nas idas e vindas nas negociações para a compra das vacinas da Pfizer, multinacional do setor farmacêutico com sede nos Estados Unidos.
O ex-secretário-executivo atribuiu a demora na compra da CoronaVac a dois fatores principais. O primeiro era a incerteza quanto à eficácia da vacina; o segundo, a necessidade de adequar a legislação.
— Informamos ao pessoal do Butantan que não podíamos usar a 'encomenda tecnológica', instrumento para a compra da vacina da AstraZeneca, porque ela se presta a tecnologias inéditas, e no caso da CoronaVac era uma vacina de vírus inativado, tecnologia que o Butantan já domina. Houve necessidade de adequação do marco legal, o que ocorreu com a MP 1.026, em 6 de janeiro. Ato contínuo, foi assinado o contrato com o Butantan no dia 7.
Senadores apontaram que as negociações entre a União e o Butantan foram suspensas por vários meses a partir de outubro de 2020, depois que o presidente Jair Bolsonaro mandou cancelar um protocolo de intenções assinado pelo Ministério da Saúde para aquisição de 46 milhões de doses da CoronaVac. O coronel afirmou que, apesar das declarações do presidente, a negociação não foi interrompida, e deu a entender que a falta de iniciativa foi do Butantan.
— O doutor Dimas Covas [diretor do Butantan] tinha meu telefone. Eles poderiam ter mandado mensagem para meu WhatsApp, poderiam ter conversado comigo. O problema que aconteceu era a politização pelo governo do Estado de São Paulo — disse Franco.
Em relação à Pfizer, o ex-secretário-executivo atribuiu a demora na compra às "cláusulas leoninas" impostas, segundo ele, pela empresa. Quanto à falta de resposta para as reiteradas ofertas da Pfizer por e-mail, Franco alegou, entre outros motivos, problemas técnicos.
— A Pfizer às vezes mandava um e-mail e reiterava no mesmo dia três ou quatro vezes. A minha caixa de e-mails, e a de todo o ministério, ficou inoperante entre 5 e 12 de novembro. Também o senhor Carlos Murillo [presidente da Pfizer Brasil] tinha meu telefone e podia ter se comunicado se tivesse algum gap.
Foram exibidos vídeos de entrevistas coletivas concedidas pelo ex-secretário em 2020, em que ele declarava não haver "intenção" de compra de "vacinas chinesas" e chamava de "verdadeiros negacionistas" os que negavam a eficácia do tratamento precoce com medicamentos defendidos pelo governo, como a hidroxicloroquina.
O relator da CPI, senador Renan Calheiros (MDB-AL), chamou a atenção para as aparentes "contradições" no depoimento de Franco. Após a exibição de um vídeo de uma reunião de Bolsonaro com o suposto "gabinete paralelo", o depoente afirmou desconhecer a atuação do grupo que aconselharia o presidente sobre a pandemia. Renan se mostrou surpreso com a resposta.
— Era uma espécie de 'Ministério da Doença', em contraposição ao Ministério da Saúde. Pelo que estamos vendo, paralelo era o Ministério da Saúde — disse o relator.
O senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), vice-presidente da CPI, observou que Franco se reuniu com um dos participantes da reunião com Bolsonaro, Antônio Jordão Neto, apenas um dia depois.
— Eu não me lembro, não sei de quem se trata. Posso ter me reunido, eu não sei qual foi a pauta — respondeu o ex-secretário-executivo.
Mais informações a seguir