No ano em que busca emplacar um sucessor para a chanceler federal Angela Merkel, que já anunciou aposentadoria, a União Democrata Cristã (CDU) deu um passo importante ao obter uma vitória surpreendente no pleito local no estado da Saxônia-Anhalt, no leste da Alemanha.
O resultado foi surpreendente porque as pesquisas de intenção de voto colocavam a CDU, um partido conservador da centro-direita democrática, tecnicamente empatada com a Alternativa para a Alemanha (AfD), uma legenda de ultradireita que flerta com o negacionismo pandêmico e a xenofobia.
Mas, no domingo eleitoral, a CDU conseguiu ao final expressivos 16 pontos percentuais de vantagem. Os eleitores da Saxônia-Anhalt, estado que fazia parte da antiga Alemanha Oriental, deram 37% de apoio ao partido de Merkel, sete pontos a mais que no pleito de 2016. Os 21% da AfD, por sua vez, ficaram três pontos abaixo de quatro anos atrás.
"É claro que isso muda o vento em Berlim", disse Ralph Brinkhaus, chefe da bancada da CDU no Parlamento alemão, ao canal de TV ARD. Para ele, o resultado é um bom presságio: o sucesso conservador nas últimas eleições gerais, em 2017, também havia sido precedido por uma vitória estadual inesperada, no Sarre, alguns meses antes.
Mas, como sempre nas eleições estaduais, o peso dos fatores locais lança uma dúvida sobre se a CDU pode tirar lições da vitória regional para a eleição nacional de setembro.
O atual governador da Saxônia-Anhalt, Reiner Haseloff, parece ter sido um fator importante na vitória. Sua popularidade é alta, e sua gestão da pandemia foi amplamente respeitada, ao contrário da criticada política do governo federal.
Haseloff, além disso, ficou preservado das acusações de corrupção contra outros políticos da CDU, e pelas dúvidas levantadas sobre a competência do ministro da Saúde, seu correligionário Jens Spahn.
Outro fator no resultado do domingo pode ter sido o medo do eleitorado de uma vitória da AfD, o que parece ter levado muitos a recorrer ao único partido que poderia vencê-los, a CDU.
Haseloff passou os últimos dias da campanha eleitoral batendo exatamente nesse ponto – que um voto para qualquer um, que não fosse ele, só fortaleceria a AfD.
Na noite de domingo, todos os candidatos dos outros partidos foram rápidos em expressar o alívio com o fato de a AfD ter sido derrotada, e muitos descreveram o resultado como uma importante vitória para a democracia.
Mas a CDU talvez não devesse prestar muita atenção nisso. A AfD é especialmente forte nos estados do leste da Alemanha. É importante lembrar que, mesmo com a derrota, um em cada cinco eleitores da Saxônia-Anhalt escolheu um partido de ultradireita.
Mas a AfD tem apenas 12% de apoio em toda a Alemanha, o que significa que é improvável que o medo de sua ascensão venha a desempenhar um papel importante em setembro.
A CDU espera que o sucesso do domingo possa impulsionar seu candidato a chanceler, Armin Laschet. Mesmo na Saxônia-Anhalt, uma pesquisa de opinião pública mostrou que apenas 18% dizem que ele seria um bom chefe de governo. O resultado o colocou atrás de seus dois principais concorrentes, do Partido Verde e do Partido Social-Democrata.
O Partido Verde, por sua vez, parece ter perdido o ímpeto, após a vitória eleitoral do início do ano em Baden-Württemberg, estado no sul do país. Algumas pesquisas nacionais chegaram nos últimos meses a colocar os verdes em pé de igualdade com a CDU, com Annalena Baerbock provando ser uma candidata popular à chancelaria em comparação com seu concorrente da CDU, Laschet.
Nas eleições de domingo, os verdes aumentaram seu apoio em relação a 2016 (de 5% para 6%), mas falharam em sua própria meta de obter duas cifras no estado. "Defendemos a estabilidade, para manter o centro democrático", disse Baerbock à ARD.
Na verdade, os verdes não pareciam esperar grandes ganhos no pequeno estado de 2,2 milhões de habitantes. A indústria carbonífera da região perdeu empregos através da transição energética da Alemanha, algo que o Partido Verde apoia, e a própria Baerbock praticamente não fez nenhuma aparição na Saxônia-Anhalt durante a campanha.
Os verdes também podem ter marcado um gol contra nos dias anteriores à eleição, quando Baerbock propôs um plano para aumentar o preço da gasolina em 0,16 euro por litro. Isso foi, como observaram especialistas, claramente impopular num estado com uma densidade populacional extremamente baixa, onde muitas pessoas vivem longe dos centros urbanos.
Baerbock não aderiu a essa teoria. Ela defendeu que os potenciais eleitores verdes eram simplesmente mais propensos a votar na CDU quando havia uma ameaça real de uma vitória da ultradireita. "Vimos isso em outras eleições na antiga Alemanha Oriental", comentou ela no domingo.
O resultado na Saxônia-Anhalt foi especialmente difícil para os dois partidos de esquerda – o Partido Social-Democrata (SPD), que terminou com apenas 8,4%, e especialmente o partido A Esquerda, que perdeu um terço de seu eleitorado e terminou a eleição com 11%, o pior resultado de sua história.
Houve boas notícias para o liberal FDP, que voltou ao parlamento da Saxônia-Anhalt após uma ausência de dez anos. O ressurgimento da legenda tem sido uma característica do "superano eleitoral" até agora.
"Esta é uma boa noite para os democratas-livres de toda a Alemanha", disse o líder do partido, Christian Lindner, a repórteres. Alguns observadores sugeriram que as críticas do FDP às restrições relacionadas à pandemia podem ter valido a pena.
O governador da Saxônia-Anhalt agora tem várias opções de coalizão: no momento, suas escolhas mais prováveis são continuar a composição tripla com o Partido Social-Democrata, de centro-esquerda, e o Partido Verde, ou se unir aos liberais do FDP e verdes.
Esta última coalizão seria a escolha preferida de Laschet, que atualmente lidera o governo do estado da Renânia do Norte-Vestfália em parceria com o FDP.
Algum tipo de cooperação entre a CDU e os verdes no próximo governo federal parece inevitável. Mas com pesquisas de opinião indicando que essa combinação pode não ser capaz de assegurar uma maioria no Parlamento nacional, o próximo governo em Berlim também pode muito bem ser uma coalizão tripla.
Na era pós-Merkel, a nova coalizão da Saxônia-Anhalt pode vir a ser um teste para o governo federal da Alemanha.