A partir deste sábado (05/06) as companhias aéreas de Belarus estão proibidas de sobrevoar o espaço aéreo da União Europeia (EU) e de pousar ou decolar de qualquer aeroporto dos 27 estados-membros do bloco. A decisão foi motivada após Belarus desviar um avião da Ryanair, em maio, para prender um opositor que estava no voo.
O avião ia da Grécia à Lituânia, mas foi desviado para pousar em Belarus. A bordo estava o jornalista belarusso Roman Protasevich, crítico ao regime do presidente Alexander Lukashenko, conhecido como "o último ditador da Europa". O oposicionista e a namorada dele, a russa Sofia Sapega, foram presos logo após o pouso forçado em Minsk.
Os líderes europeus acusaram o governo belarusso de promoverem um "sequestro" descarado de um avião europeu, e a Ryanair e ativistas europeus classificaram o incidente como "pirataria aérea".
A Agência Europeia para a Segurança da Aviação (EASA) também emitiu uma diretiva que proíbe as aeronaves da UE de sobrevoarem o espaço aéreo de Belarus ou aterrissarem no seu território.
O fechamento do espaço aéreo da UE, bem como outras sanções, já haviam sido propostos pela Comissão Europeia em uma cúpula em 24 de maio. No entanto, para que as sanções pudessem ser implementadas precisavam ser aceitas por todos os países do bloco, o que ocorreu nesta sexta-feira, anunciou uma porta-voz da UE.
"O Conselho decidiu hoje [sexta-feira] reforçar as medidas restritivas existentes tendo em vista a situação em Belarus, introduzindo uma proibição de sobrevoo do espaço aéreo da UE e do acesso aos aeroportos da UE por empresas belarussas de todos os tipos", informou a UE em comunicado.
Antes da decisão, a companhia aérea estatal belarussa Belavia já havia anunciado, temporariamente, a suspensão de todos os voos para Alemanha, Polônia, Itália, Áustria, Holanda, Espanha e Bélgica. A empresa tem rotas para cerca de 20 cidades do bloco europeu.
Na última cúpula, em maio, os Chefes de Estado e de governo do bloco também concordaram em estender a lista de autoridades de Belarus sancionadas, que inclui Lukashenko e seu filho e conselheiro, Víktor, que estão proibidos de entrar no território do bloco europeu e tiveram congelados todos os bens e ativos que possuem na UE.
Além disso, foi congelado um empréstimo previsto de 3 bilhões de euros a Belarus "até que se torne um país democrático".
Após o incidente com o avião da Ryanair, várias empresas decidiram por conta própria evitar o espaço aéreo belarusso, entre elas Air France, Austrian Airlines, Lufthansa, Swiss, Finnair, KLM e a própria Ryanair.
Nesta sexta-feira, a líder da oposição belarussa Svetlana Tichanovskaya, que vive no exílio após sofrer várias ameças por parte do regime de Lukashenko, afirmou que as declarações dadas por Protasevich em uma entrevista à TV belarussa certamente foram dadas sob tortura.
Na quarta-feira à noite, a emissora estatal belarussa ONT transmitiu uma entrevista de uma hora e meia com Protasevich, na qual ele fez comentários bastante positivos sobre Lukashenko e afirmou ter convocado protestos críticos ao governo.
"Todos esses vídeos são feitos sob pressão", disse Tsikhanouskaya. Ela afirmou que o objetivo de todos os presos políticos é sobreviver e que "usando a violência você pode fazer uma pessoa dizer o que você quiser".
Tsikhanouskaya exortou a comunidade internacional a desconsiderar todas as declarações da "confissão" de Protasevich.
Anna Krasulina, porta-voz de Tsikhanouskaya, disse à agência de notícias AP que Protasevich deveria ser considerado refém. "Ele fez suas declarações sob forte pressão física e psicológica e, possivelmente, sob uso de drogas", disse ela.
A família do jornalista também acredita que a entrevista foi dada sob tortura. Natalia Pratasevich, mãe do opositor detido, disse à agência de notícias alemã dpa: "Não consigo nem imaginar os métodos de tortura - tanto psicológicos quanto físicos - a que meu filho está sendo submetido no momento".
Steffen Seibert, porta-voz da chanceler federal da Alemanha, Angela Merkel, classificou as declarações coagidas de Protasevich como "vergonhosas e implausíveis".
"Isso é vergonhoso para a emissora que o transmitiu e para a liderança belarussas, que mais uma vez mostram seu completo desrespeito pela democracia e - realmente, é preciso dizer isso - seu desrespeito pela humanidade", disse Seibert.
O ministro das Relações Exteriores britânico, Dominic Raab, também condenou o vídeo e usou o Twitter para exigir que os culpados sejam responsabilizados.
Os Estados Unidos também ameaçaram endurecer ainda mais as sanções que haviam introduzido contra Belarus. O governo de Joe Biden, já havia aprovado medidas punitivas contra nove empresas belarussas em abril, mesmo antes do incidente com o avião da Ryanair. Além das medidas já anunciadas nas últimas semanas, a Casa Branca disse na semana passada que está elaborando com a União Europeia "uma lista de sanções direcionadas contra membros-chave do regime de (Alexander) Lukashenko".
O voo da Ryanair FR4978 partiu de Atenas, na Grécia, com destino à capital da Lituânia, Vilnius, no domingo. O avião sobrevoava o espaço aéreo de Belarus quando, a cerca de dez quilômetros da fronteira com a Lituânia, mudou de direção e seguiu para Minsk, capital belarussa.
Segundo a Ryanair, a tripulação da aeronave foi alertada pelos controladores de voo de Belarus sobre uma possível ameaça de bomba contra o avião. Os pilotos foram então ordenados a pousar em Minsk. Um caça MiG-29 do Exército belarusso interceptou o avião, numa aparente tentativa de encorajar a tripulação a cumprir as ordens dos controladores de voo.
Assim que a aeronave pousou no aeroporto de Minsk, agentes de segurança belarussos prenderam o jornalista Roman Protasevich, um dos 170 passageiros do voo.
Agentes de segurança com cães farejadores verificaram o interior da aeronave e as bagagens dos passageiros. Horas depois, o voo foi autorizado a seguir viagem para a capital lituana.
Em pronunciamento no parlamento belarusso, Lukashenko disse que agiu dentro da lei e acusou o Ocidente de lançar uma "guerra híbrida moderna" contra Minsk.
Para ele, Belarus é um "campo de teste" do Ocidente para um futuro conflito contra a Rússia.
Roman Protasevich, de 26 anos, é um jornalista e ativista belarusso que deixou seu país em 2019. Em Belarus, ele é alvo de uma série de acusações criminais, incluindo incitação ao ódio contra o governo.
Protasevich cobriu ativamente as contestadas eleições presidenciais belarussas em agosto do ano passado, bem como os protestos que seguiram o pleito. Ele é um dos fundadores do Nexta, um popular canal no aplicativo de mensagens Telegram, que teve um papel-chave na organização das manifestações anti-Lukashenko.
Conhecido como o último ditador da Europa, Lukashenko comanda a nação de 9,3 milhões de habitantes com mão de ferro há mais de um quarto de século. As eleições de 2020 garantiram um sexto mandato ao presidente, mas a oposição e alguns funcionários eleitorais afirmam que o voto foi manipulado. A União Europeia não reconheceu a validade do pleito.
Meses de protestos se seguiram, representando o mais forte desafio enfrentado por Lukashenko desde que ele assumiu o poder em 1994, após o fim da União Soviética. As autoridades belarussas promoveram uma repressão violenta contra as manifestações, com milhares de pessoas detidas e vários relatos de brutalidade policial e tortura.
Protasevich foi acusado à revelia de incitar motins em massa e pode ser condenado a até 15 anos de prisão por esse crime. Mas o serviço secreto belarusso, que ainda atende pelo nome da era soviética KGB, também o incluiu numa lista de pessoas suspeitas de envolvimento com terrorismo, o que significa que ele pode enfrentar penas mais graves. Terrorismo é punível com morte em Belarus, o único país europeu que ainda tem pena de morte.
le (lusa, efe, ots)