Pouco depois de a Alemanha reconhecer como genocídio as atrocidades cometidas na Namíbia durante o período colonial, os povos herero e nama, cujos antepassados foram alvos do massacre, expressaram nesta sexta-feira (28/05) sua rejeição ao pedido de desculpas feito por Berlim.
O presidente da Alemanha, Frank-Walter Steinmeier, planeja ir ao país para pedir perdão pelos crimes cometidos, em uma cerimônia no Parlamento da Namíbia, país africano que sucedeu a antiga colônia do Sudoeste Africano Alemão. Entretanto, entidades locais disseram que ele não será bem-vindo no país.
"Como gesto de reconhecimento da dor incomensurável que foi infligida às vítimas, queremos apoiar a Namíbia e os descendentes das vítimas com um programa substancial da ordem de 1,1 bilhão de euros para reconstrução e desenvolvimento", afirmou o ministro alemão do Exterior, Heiko Maas.
O gesto, porém, não foi recebido da forma como os alemães esperavam.
A oposição da Namíbia criticou o acordo e afirmou que os descendentes dos povos herero e nama não foram suficientemente contemplados. "Se a Namíbia recebe dinheiro da Alemanha, ele deveria ir para os líderes tradicionais das comunidades atingida e não para o governo", afirmou uma parlamentar da oposição.
Mutjinde Katjiua, secretário-geral da Autoridade Tradicional Ovaherero, disse que sua entidade rejeita o acordo nos moldes como foi anunciado pela Alemanha. Segundo Katjiua, eles disseram ao embaixador alemão na Namíbia que se opõem à vinda de Steinmeier.
"Os líderes disseram que o ministro ou presidente que vier à Namíbia assinar esse acordo não será bem-vindo. Alertamos o embaixador de que o presidente deve ficar na Alemanha. Faremos de tudo em nosso poder para fazer com que sua visita seja irrealizável.
"O genocídio é um crime, e como tal, é regulamentado pelas leis internacionais. Eles não assumiram a culpa pelos crimes, o que eles sabem que acarretariam em responsabilização”, disse Nandi Mazengo, da Fundação do Genocídio Herero.
"Eles assumiram a culpa por um tipo diferente de genocídio. Não sabemos quem define isso. Provavelmente, eles só sabem disso porque esse crime sobre o qual estão admitindo culpa, e pelo qual querem vir à Namíbia pedir desculpas, não traz nenhuma obrigação para eles.”
Os povos herero e nama estão divididos em várias associações e lideranças tradicionais. Alguns viram com bons olhos as negociações entre a Namíbia e a Alemanha, enquanto muitos outros se opuseram ao acordo.
A atual Namíbia foi uma colônia alemã entre 1884 e 1915. Os historiadores estimam que, entre 1904 e 1908, as tropas do imperador alemão Guilherme 2º massacraram aproximadamente 65 mil herero (de um total de cerca de 80 mil) e 10 mil nama (de cerca de 20 mil), depois que ambos os grupos se rebelaram contra o domínio colonial.
O massacre dos herero e nama é o mais grave crime na história colonial da Alemanha. O comandante, general Lothar von Trotha, ordenou o extermínio. Há anos, a ONU reconhece o massacre como o primeiro genocídio do século 20.
O plano sistemático de extermínio de homens, mulheres e crianças incluiu a morte por armas, o bloqueio do acesso à água no deserto e campos de concentração.
Em 2018, a Alemanha devolveu à Namíbia ossadas de vítimas do massacre dos povos herero e nama que estavam guardadas há décadas nos arquivos da Clínica Universitária Charité, em Berlim, entre outros lugares.
Além da Namíbia, Tanzânia e Burundi também exigem reparações por crimes cometidos durante o período colonial alemão.
A Alemanha se tornou potência colonial relativamente tarde, só ocupando solo africano na década de 1880. O Império Alemão estabeleceu colônias nos atuais territórios da Namíbia, Camarões, Togo, partes da Tanzânia e do Quênia.
O imperador Guilherme 2°, coroado em 1888, procurou expandir ainda mais as possessões coloniais através da criação de novas frotas de navios. Tais territórios foram perdidos em seguida, já durante a Primeira Guerra Mundial.
rc (DW)