O diretor do Instituto Butantan, o médico Dimas Covas, afirmou nesta quinta-feira (27) em depoimento na CPI da Pandemia que a tendência é que a crise sanitária se estenda até o início de 2022. Ele também disse que há indícios de que estamos diante de um agravamento da pandemia de covid-19, agora impulsionada por novas variantes. Para frear a terceira onda, Dimas Covas aponta que é necessário combinar a vacinação com o uso das chamadas medidas não farmacológicas de proteção, como o uso de máscaras e o distanciamento físico.
— Os primeiros meses deste ano mostraram a face mais agressiva dessa pandemia. E nós estamos agora em um momento em que tudo indica que teremos de novo um recrudescimento, e é um recrudescimento agora turbinado por algumas variantes que estão circulando entre nós. Então essa pandemia ainda vai persistir durante 2021. Ainda vamos lutar com ela em 2021, quiçá no começo de 2022.
Dimas Covas ponderou que ainda há "muitas pessoas suscetíveis no Brasil", o que exige a adoção de medidas não farmacológicas. Ele criticou não haver uma coordenação central nessas ações.
— A vacina, neste momento, ajudaria muito, mas não resolveria o problema da epidemia. Ela não teria abortado a segunda onda e ela seguramente não vai abortar a terceira onda, porque nós temos ainda muitas pessoas suscetíveis no Brasil. Portanto, as outras medidas, as medidas que são chamadas de não farmacológicas, de enfrentamento à epidemia são fundamentais. Isso foi feito por todos os países do mundo civilizado que conseguiram o controle da epidemia. Alguns estados fizeram isso, mas de uma forma heterogênea; não houve uma coordenação central — ressaltou.
Dimas Covas informou que que estudos já estão sendo feitos sobre a necessidade de uma “terceira dose da vacina contra o coronavírus”. Segundo ele, seria a dose de reforço anual, assim como ocorre com o imunizante contra a gripe, por exemplo.
— A dose de reforço será necessária para todas as vacinas. A própria Pfizer já está estudando uma dose de reforço. O Butantan já tem estudos previstos em andamento com a dose de reforço.
Ao ser questionado pelo senador Eduardo Girão (Podemos-CE) sobre a morte do músico Nelson Sargento, figura histórica da Estação Primeira de Mangueira, por covid-19, mesmo após ter recebido as duas doses da CoronaVac, Dimas Covas respondeu que não há nenhuma vacina capaz de garantir proteção total e que vacina não é "escudo".
— Nenhuma vacina, até este momento, tem demonstrado que protege contra a infecção. Ela protege contra as manifestações clínicas, principalmente as manifestações clínicas mais graves. A vacina não é uma proteção absoluta. A pessoa que se vacina está relativamente protegida, tem os fatores individuais que entram se ela eventualmente pegar a infecção, e esses fatores são preponderantes, inclusive, para determinação da gravidade — argumentou.
Em resposta ao senador Humberto Costa (PT-PE), Dimas Covas concordou com o parlamentar ao rechaçar a tese da imunidade de rebanho (de permitir que a população se contamine com o coronavírus para que se crie uma imunidade natural). O diretor do Butantan afirmou que essa teoria já foi descartada por cientistas.
— Vou falar como médico, como especialista: a tese da imunidade de rebanho já foi descartada há muito tempo. No começo da pandemia, alguns países da Europa até chegaram a sugerir a possibilidade de ter a questão da imunidade de rebanho, mas, naquele momento, sabia-se muito pouco ainda do curso da própria epidemia.
Estudos de vacinação em massa contra a covid-19 em Serrana (SP), cidade com cerca de 45 mil habitantes, apontam que o município registra uma média de mortes causadas pela doença até quatro vezes menor que outros municípios com população de tamanho semelhante. O caso foi citado por Dimas Covas ao reforçar a necessidade de acelerar a vacinação. Segundo Dimas, foram vacinados 97% do público-alvo de Serrana com as duas doses. O relatório final será divulgado em breve.
— Em toda a população vacinada isso vem caindo progressivamente, mostrando que o efeito da vacina, quando se vacina em massa, ele é de fato um efeito direto sobre a evolução da epidemia. Isso é o objetivo: enquanto nao tiver essa vacinação de 97% das pessoas em risco, como foi o caso em Serrana, não vamos ter esse decréscimo natural da epidemia — disse.
Questionado por Luis Carlos Heinze (PP-RS) sobre o "não reconhecimento" da CoronaVac na Europa, Dimas Covas ponderou que a Europa não usa a CoronaVac, o que não significa que não "reconheça" o imunizante. Covas espera que a Coronavac venha a ser reconhecida pela Organização Mundial de Saúde (OMS) e logo distribuída pelos membros da iniciativa Covax Facility.
Questionado pelo relator da CPI da Pandemia, Renan Calheiros, sobre a vacina Butanvac, a primeira produzida no Brasil, Covas disse que ela já está em produção e e abrange novas variantes do vírus.
— É a vacina 2.0, que já é a segunda geração de vacinas. Essa vacina é a grande esperança dos países pobres, porque ela tem baixo custo e é a segunda versão; ela já incorpora os conhecimentos científicos [obtidos] com a primeira geração de vacinas — explicou.
Segundo Dimas Covas, a Butanvac estará disponível no último trimestre deste ano, mas ainda não há tratativas com o Ministério da Saúde para a compra desse imunizante. De acordo com ele, o Butantan tem 6 milhões de doses em processo e aguarda a aprovação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para iniciar os estudos clínicos. A expectativa, ressaltou, é produzir ao menos 40 milhões de doses até o final do ano.
Após Fernando Bezerra (MDB-PE), líder do governo no Senado, e Luis Carlos Heinze afirmarem que o governo federal transferiu bilhões para o Butantan, Dimas declarou que o governo federal não investiu um real no desenvolvimento da vacina e só pagou pelas doses entregues em fevereiro de 2021.
— Nós não contamos com recursos federais até que houvesse a assinatura, no dia 7 de janeiro. E aí é pagamento; não houve investimento.
Para a senadora Leila Barros (PSB-DF), o presidente Jair Bolsonaro atuou para desacreditar o Instituto Butantan e trabalhou contra a aquisição de vacinas.
— Fica evidente para mim que, em relação à CoronaVac, não apenas o governo federal não aportou nenhum recurso para o seu desenvolvimento, como foi além: o governo federal trabalhou publicamente para desacreditar a vacina — assinalou ela.