A segunda semana de depoimentos na CPI da Pandemia começou nesta terça-feira (11) com o diretor-presidente da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), Antonio Barra Torres. Durante quase seis horas ele foi questionado pelos senadores principalmente sobre o processo de aprovação de vacinas no Brasil. Os parlamentares demonstraram especial interesse nas negativas da agência reguladora para o uso dos imunizantes Sputnik V, da Rússia; e Covaxin, de origem indiana.
Em relação à vacina russa, a Anvisa está com a análise parada, segundo Barra Torres, para que o fornecedor, por meio de seu representante, a União Química, forneça uma série de informações que estão faltando.
— É muito importante que se entenda que esse processo de interrupção ou de negativa da autorização excepcional de importação não deve somar a esta marca Sputnik V um pensamento negativo. Isso faz parte do processo [...] O que conclamo é que, tão logo essa situação seja resolvida, não se credite a essa vacina nenhuma característica ruim. Nossa preocupação é que, amanhã ou depois, a nossa população tenha receios. Não é essa a nossa intenção — afirmou, lembrando que não cabe à Anvisa fazer a análise laboratorial de imunizantes, mas da documentação apresentada pelo desenvolvedor.
O presidente da Anvisa negou que tenha sofrido algum tipo de pressão do governo sobre o assunto e ressaltou que se trata de uma situação puramente regulatória, que não pode e nem deve prejudicar a boa relação entre Brasil e Rússia.
— É um processo que tem começo, meio e fim e esperamos que chegue a um bom fim. Esperamos que isso não impacte a relação entre os dois países — avaliou.
Perguntado pelo senador Marcos Rogério (DEM-RO) sobre a aplicação da Sputnik V em outros países, o presidente da Anvisa disse que a agência entrou em contato com 58 países nos quais o imunizante estaria sendo usado. Deste total, 11 não responderam; 24 negaram o uso do imunizante e os países que efetivamente estão usando, com exceção de México e Argentina, não têm estrutura regulatória madura, sênior, a exemplo do Brasil.
Ainda segundo Barra Torres, na Argentina, por exemplo, a Sputnik V responde por 57% do total de vacinas aplicadas, mas aparece com 92% dos efeitos adversos em geral.
— Isso é esclarecedor a esta CPI e aos brasileiros. Pelo que eu apurei e a testemunha confirma aqui, a Anvisa foi a primeira autoridade de peso regulatório no mundo que avaliou com alguma seriedade os documentos disponíveis sobre a Sputnik. Foi a primeira agência a fazer uma crítica séria à vacina russa — disse Marcos Rogério.
Já o senador Angelo Coronel (PSD-BA) afirmou que a vacinação segue normalmente na Argentina, sem que se tenha notícias de maiores efeitos adversos. Ele disse esperar que a Anvisa possa liberar a Sputnik V o quanto antes. Além dele, outros representantes do Nordeste, como os senadores Otto Alencar (PSD-BA) e Rogério Carvalho (PT-SE), questionaram o panorama apresentado pela testemunha em relação ao uso da Sputnik V em outros países. O Consórcio do Nordeste tem estado à frente da busca de autorização da Sputnik V para aquisição e imunização da população. Rogério Carvalho chegou a levantar a hipótese de um preconceito contra o imunizante pelo fato de ser russo.
— O presidente recentemente disse que a China tinha sido responsável pela criação do vírus. Disse também que a vacina da China não prestava. Por isso pergunto se a Sputnik V não estaria sofrendo deste preconceito [...] Será que é esse tipo de preconceito que está impedindo que a gente tenha no território brasileiro 66 milhões de doses? — indagou Rogério Carvalho.
Barra Torres negou tal possibilidade e recebeu o apoio do presidente da CPI, senador Omar Aziz (MDB-AM), que disse não acreditar em tal possibilidade.
— Acho impossível ter havido boicote contra A ou B porque esse tipo de coisa vazaria. Além do mais, tem uma equipe técnica grande trabalhando, que não se prestaria a isso. São tantas pessoas que seria impossível fazer boicote a vacina A ou B — avaliou.
O chefe da Anvisa também deu explicações sobre a situação da indiana Covaxin. Segundo ele, entre outros problemas, houve ausência de relatório técnico que apontasse a qualidade, segurança e eficácia; falta de precauções necessárias para a esterilidade do produto e de estratégia adequada de controle para garantia de pureza.
— A avaliação clínica dos dados disponíveis não permitiram, portanto, estabelecer um risco-benefício favorável à vacina. O uso emergencial já é uma situação de certa excepcionalidade. A situação confortável é o registro, que estabelece perfeitamente qualidade, segurança e eficácia. Mas, no caso do uso emergencial, sempre se avalia o risco-benefício. Quando é favorável, o uso emergencial é autorizado com uma série de condicionantes, inclusive de uma monitorização intensa — explicou.
Barra Torres informou ainda que a Índia tem tradição de responder rápido a questionamentos, e o Ministério da Saúde tem feito reuniões com a Anvisa a respeito de um novo pedido de importação.
— São reuniões prévias justamente para que essas discrepâncias sejam sanadas, através de documentos que chegam. E acreditamos que, nos próximos dias, poderá haver uma assunção de um novo pedido por parte do Ministério — avaliou.
Ao encerrar a reunião desta terça-feira, o presidente da CPI, senador Omar Aziz (MDB-AM) disse que ficou claro o posicionamento da Anvisa a favor da ciência.
O próximo encontro da comissão de inquérito é nesta quarta-feira, às 9h30, para depoimento do ex-secretário de Comunicação Social da Presidência da República Fabio Wajngarten.