A Comissão Mista de Combate à Violência contra as Mulheres (CMCVM), o Observatório da Violência contra a Mulher (OVM) e o DataSenado lançaram, nesta quarta-feira (24), o Processo de Monitoramento e Avaliação das Políticas de Enfrentamento à Violência contra Mulheres. O evento consolida os esforços do Senado na busca institucional de criar uma infraestrutura nacional mais efetiva no combate a este problema.
Diversas representantes de secretarias estaduais, promotorias públicas e ONGs ligadas à luta feminista acompanharam o lançamento do relatório. As senadoras Zenaide Maia (Pros-RN) — que presidiu a comissão nos últimos dois anos — e Leila Barros (PSB-DF) — também da comissão — destacaram que o objetivo do trabalho foi destrinchar a realidade particular de cada estado brasileiro, suas experiências e práticas, além de identificar as lacunas existentes nas políticas de enfrentamento às diversas formas de violência.
— Foram realizadas diversas reuniões on-line, com os estados e instituições que trabalham na temática de proteção e defesa da mulher. Todos os dias mulheres são violentadas e perdem suas vidas. Isso precisa mudar, e é neste sentindo que criamos esta ferramenta. A continuidade do monitoramento e a constante atualização dos dados torna-se fundamental para os próximos colegiados da CMCVM, para que possamos trabalhar pra acabar com a epidemia da violência de gênero — alertou Zenaide.
Para a diretora da Secretaria de Transparência do Senado, Elga Lopes, "o DataSenado é o único instituto de pesquisas em todo o país que monitora e oferece à sociedade civil, e a todos os órgãos públicos, pesquisas bianuais sobre o fenômeno da violência contra as mulheres". Ela explicou que estas pesquisas mostram que "30% das mulheres brasileiras já sofreram violências, e que, nos últimos oito anos, aumentaram em 300% as agressões perpetradas por ex-maridos e ex-companheiros". São homens que agridem as mulheres no momento em que a relação se dissolve, disse Elga.
Enfrentamento da violência
Henrique Marques, da OVM, explicou que o relatório é o “marco zero” do Processo de Monitoramento e Avaliação. Traz um retrato do contexto atual do problema da violência contra mulheres no Brasil, e das políticas públicas voltadas a seu enfrentamento.
— É preciso destacar a ênfase na prevenção, pois em lugar de simplesmente aceitar ou reagir à violência, as políticas públicas devem ser construídas sob a forte convicção de que o comportamento violento e suas consequências podem ser evitados — destacou.
Visando mudar essa realidade, o trabalho elenca os desafios que devem ser enfrentados. O primeiro é aumentar o alcance dos serviços especializados disponibilizados às mulheres em situação de violência.
Outro desafio é que a lógica de intervenção por trás da disponibilização destes serviços seja adequada à realidade das mulheres em situação de violência. Tanto no que diz respeito a que o serviço disponibilizado seja adequado às suas necessidades, quanto que a implementação leve em consideração questões federativas e as implicações no funcionamento de subsistemas, redes e comunidades de políticas públicas envolvidas. Já o último desafio trata da qualificação dos dados e análises disponíveis como insumo para auxiliar na transposição dos desafios anteriores.
Parte do relatório dedica-se a apontar pesquisas recentes, mostrando o quadro de dramaticidade que a violência contra as mulheres atingiu no Brasil.
Uma delas é a Pesquisa Violência Doméstica e Familiar, do DataSenado. Em sua edição 2019, o estudo constatou que, desde 2017, houve um aumento significativo no número de mulheres que declararam já ter sido vítimas de algum tipo de violência ao longo da vida, passando dos 18% verificados em 2015, para 29% em 2017.
A mesma pesquisa, em relação à 2019, constatou que 31% das mulheres, ao serem agredidas, "não fez nada". Índice superior à pesquisa de 2017, em que esta alternativa foi a escolhida por 27% das consultadas. E o caso de agredidas que denunciou o crime à delegacia comum caiu de 24% para 17% entre 2017 e 2019.
Também é citada a pesquisa "Raio X do Feminicídio em SP: é possível evitar a morte", do Ministério Público de São Paulo. Esta pesquisa constatou que em apenas 3% dos casos a vítima de feminicídio possuía alguma medida protetiva. E que, em apenas 4% dos casos, a vítima havia registrado um boletim de ocorrência contra o agressor.
Apesar do quadro de violência, o relatório do Senado cita levantamento recente do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) apontando a redução nos serviços especializados no atendimento à mulheres, disponibilizados tanto por estados quanto por municípios. O percentual de municípios com organismo executivo de políticas para mulheres, por exemplo, caiu de 27,5% em 2013 para 19,9% em 2018. E equipamentos municipais especializados no atendimento à mulheres em situação de violência são realidade em apenas 3,7% dos municípios com até 5 mil habitantes; em 7,1% dos municípios com população entre 5 mil e 10 mil habitantes; e em 14,1% dos municípios com população de 10 mil a 20 mil habitantes.
Por fim, o relatório também detecta a baixa execução orçamentária de políticas federais voltadas às mulheres em 2020. As políticas voltadas ao programa Casa da Mulher Brasileira tiveram execução de 0,09%, e as políticas de igualdade e enfrentamento à violência, de apenas 7,91%.