Além de pedir apoio do Senado para a negociação, compra e entrega de vacinas contra a covid-19, os governadores dos estados do Espírito Santo, Renato Casagrande, do Maranhão, Flávio Dino, do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite, e de São Paulo, João Dória denunciaram ameaças a familiares durante manifestações deste final de semana contra as medidas para conter o avanço da pandemia. Ele participaram nesta segund-feira (15) de audiência pública da comissão de acompanhamento das medidas contra a covid-19.
Todos prestaram solidariedade ao governador Renato Casagrande, cuja mãe, de 88 anos, foi atacada verbalmente neste domingo por apoiadores do governo Bolsonaro: manifestantes com carro de som fizeram ameaças em frente ao seu endereço.
— Isso coloca em risco a vida de uma pessoa com a idade da minha mãe. É inaceitável! — disse Casagrande, recebendo o apoio dos demais participantes da reunião, como o presidente da comissão, senador Confúcio Moura.
Os governadores voltaram a apontar a inexistência de uma coordenação nacional que atue para referendar as medidas preventivas aplicadas pelos governos estaduais. E pediram a participação do Senado negociações diplomáticas com outros países para aquisição das vacinas.
Este é o segundo grupo de governadores ouvidos pela comissão para relatar como está a situação da pandemia nos seus estados.
Casagrande, disse que, além da guerra contra o vírus, o país enfrenta uma tensão político-ideológica que atrapalha o combate à pandemia. Ele classificou de contraditórios os discursos e ações do governo federal, impedindo a união nacional no combate a propagação do vírus.
— O governo tem que passar a exercer uma coordenação dessa ação, o que não fez até agora, contraditoriamente. O governo federal ajudou estados e municípios no ano passado com recursos e vai continuar ajudando-os neste ano, mas, contraditoriamente, na política e na ideologia, o governo acaba tendo um comportamento que atrapalha muito o enfrentamento à pandemia. Então, é preciso que o governo mude, mas nós não acreditamos muito na mudança — disse Casagrande.
O governador de São Paulo, João Dória, afirmou que os 21 gestores que integram o Fórum de Governadores têm feito um “esforço gigantesto” para alinhar ações de enfrentamento ao momento mais crítico da crise sanitária. Diante disso, têm recebido ameaças pessoais por adotar medidas de combate à disseminação do coronavírus. Por outro lado, disse, o presidente da República, Jair Bolsonaro, adota postura negacionista e tem dificultado a aquisição de vacinas.
— Nós acertamos e fizemos o nosso acordo com o laboratório Sinovac [que produz a vacina Coronac em parceria com o Instituto Butantan] em abril do ano passado. Em outubro, já tínhamos aqui a vacina. Poderíamos ter iniciado a imunização dos brasileiros em novembro do ano passado. Hoje já teríamos mais de 40% da população brasileira imunizada e teríamos salvo milhares de pessoas que, infelizmente, foram a óbito — disse Dória, ressaltando que nove de cada 10 brasileiros vacinados têm recebido a vacina do Butantan.
Os participantes da audiência integram um grupo de 21 governadores que assinaram uma carta por um pacto nacional entre os poderes da União, estados e municípios no combate à crise. Para eles, o Senado Federal, tem legitimidade para auxiliar nas relações diplomáticas com outros países para acelerar as entregas das vacinas, inclusive contanto com a solidariedade de organismos internacionais, já que o país se tornou o epicentro mundial da crise sanitária.
O governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite, creditou ao governo federal o atraso da oferta de imunizantes no Brasil
— Existe a culpa do governo, que colocou o Brasil no final da fila porque ficou negando durante muito tempo a importância da vacina, não é? Foi negacionista, criticou, atacou as vacinas, então o Brasil pegou o fim da fila para conseguir vacinas. Negociou já mais de 500 milhões de doses, mas a maior parte dos 500 milhões de doses vai chegar só no final, no segundo semestre — lamentou.
Eduardo Leite também pediu apoio dos senadores para buscar, junto ao presidente da República, uma mudança de comportamento quanto às medidas para conter a pandemia, como distanciamento social. E também na retomada de medidas econômicas que ajudem a mitigar os efeitos econômicos e sociais da pandemia.
— Aí vem a questão do auxílio emergencial, vem a questão de outras medidas mitigatórias para os negócios, para os setores econômicos, de forma a reduzir essa tensão, a reduzir o nível de pressão que nós estamos sofrendo na ponta aqui, porque o fôlego econômico do restaurante, do bar, do comércio, enfim, é muito curto, se é que há fôlego ainda para eles conseguirem parar — afirmou.
A mudança de comportamento do presidente Jair Bolsonaro, segundo os governadores, é fundamental, inclusive, para que o ministro da Saúde possa ter autonomia e consiga desempenhar um plano efetivo de combate ao cenário pandêmico em sintonia com estados e municípios.
— O que eu vi, depois de três trocas de ministros que o presidente já fez, é que o problema está nas orientações que o presidente dá. Infelizmente, se não houver mudança nas atitudes do presidente, não há ministro que consiga trabalhar com a sabotagem feita pelo próprio presidente da República às medidas necessárias para o combate ao coronavírus — disse Eduardo Leite ao ser questionado sobre a possibilidade da saída de Eduardo Pazzuelo da pasta da Saúde.
A mesma opinião foi compartilhada pelo senador Otto Alencar (PSD-BA).
— Agora se anunciam mudanças de um novo ministro. Foi o [Luiz Antôni] Mandetta; foi o Nelson [Teich]; agora, o general Pazuello. E essa instabilidade cria grandes dificuldades, até porque qualquer ministro que quiser assumir o Ministério da Saúde, antes de tudo, tem que ter a autonomia dada pelo presidente da República — afirmou.
O governador do Maranhão, Flávio Dino, ressaltou a importância da Lei 14.125, sancionada na semana passada e que estabelece marcos legais que facilitam a aquisição de vacinas por estados, municípios e iniciativa privada, mas alertou para a necessidade de regulamentação da norma. Para ele, é preciso assegurar que todas as negociações e contratos para aquisição dessas vacinas deem preferência ao Plano Nacional de Imunização (PNI), capitanteada pelo SUS, e assim possa evitar “uma espécie de salve-se quem puder”.
— Apenas na eventualidade de o Ministério da Saúde não cumprir esse papel, aí, sim, estados e municípios devem consumar as contratações. Aliás, é esse o sentido da lei aprovada por vossas excelências, e nós consideramos que o Programa Nacional de Imunizações é o instrumento institucional que melhor concretiza os princípios constitucionais do SUS. Então, os estados e municípios devem ter um papel subsidiário em relação a isso.
O relator da comissão, senador Wellington Fagundes (PL-MT), fez o mesmo alerta. Ele informou que muitas pessoas não estão entendendo a eficácia da lei.
— Todos os empresários com que eu conversei nesta semana, ou seja, a área da iniciativa privada, não estão entendendo a eficácia dessa lei, já que eles iriam comprar para doar para o PNI sem nenhuma atenção aos seus funcionários. Os empresários estão dizendo que isso não terá eficácia. Da minha parte, eu gostaria também de dizer que eu entendo que comprar vacinas é uma responsabilidade do governo federal, porque nós não podemos levar prefeitos e governadores a buscar vacinas sem uma coordenação e sem saber como isso será entregue.
Ainda na audiência pública desta segunda-feira, os governadores alertaram para o risco de colapso total na rede hospitalar, com a falta de leitos para atender pacientes de covid-19.