“Só haverá, porém, verdadeira reconstrução se a pobreza se reduzir, os focos de carência alimentar extrema desaparecerem, as desigualdades se esbaterem, a exclusão diminuir, a clivagem entre gerações e entre territórios for superada”, defendeu Marcelo Rebelo de Sousa, na cerimónia em que tomou posse para um segundo mandato, na Assembleia da República.
Na sua intervenção, o chefe de Estado considerou que a pandemia de covid-19 “convidou a revisitar”, entre outras matérias, “a descentralização – toda aquela que os portugueses quiserem”.
Relativamente ao combate à propagação da covid-19 em Portugal, Marcelo Rebelo de Sousa afirmou: “Sabemos todos o que queremos: queremos encurtá-la e não alongá-la, estancar o número dos nossos mortos, baixar a contaminação, ampliar a vacinação, a testagem e o rastreio, evitar nova exaustação das estruturas de saúde e dos seus heróis, desconfinar com sensatez e sucesso”.
“Reduzir o temor, reforçar a confiança, recuperar os adiamentos nos doentes não covid, estabilizar o Serviço Nacional de Saúde (SNS), permitir de forma duradoura a reconstrução da vida das pessoas”, completou, apontando estes objetivos como a sua prioridade “mais imediata” e prometendo atuar “em espírito da mais ampla unidade possível, num tempo de inevitáveis cansaço e ansiedade”.
Sobre os fundos europeus, o Presidente da República apelou a que sejam usados “com clareza estratégica, boa gestão, transparência e eficácia, na resiliência social, na qualificação, na transição energética, no digital, mas nunca esquecendo o que a pandemia desvendou de problemas de fundo, de competitividade, de saúde, de solidariedade social, de sua articulação”.
“A pandemia fez ressaltar a existência de vários Portugais cada vez mais distantes entre si, todos eles dentro do mesmo Portugal. Urge reconstruir um só Portugal. Queremos mais crescimento e para isso investimento, exportações e mercado interno. Mas queremos, no entanto, mais do que isso, políticas que corrijam o que a liberdade, a concorrência e o mercado, ‘de per si’, não permitem corrigir, e que se agravou drasticamente com a pandemia”, acrescentou.
Reforçando esta mensagem, Marcelo Rebelo de Sousa argumentou que “reconstruir a vida das pessoas sem a economia a crescer é impossível, mas reconstruí-la só com a economia, sem corrigir as desigualdades existentes, é reconstruir menos para todos, porque sobretudo para alguns privilegiados”.
Segundo o chefe de Estado, a pandemia de covid-19 “convidou a revisitar” também “reforma administrativa, justiça e luta contra a corrupção, papel das Forças Armadas, forças de segurança, proteção civil, bombeiros”, bem como “instituições de solidariedade social, movimentos associativos, formas de trabalho”.
No discurso de posse, o Presidente de Portugal prometeu defender uma “melhor democracia”, com tolerância e respeito por todos, rejeitando o “mito do português puro”, com convergência no regime e alternativa de governação, e “estabilidade sem pântano”.
Na sua intervenção, o chefe de Estado afirmou que assegurar estes objetivos será a sua “primeira prioridade” nos próximos cinco anos.
Marcelo Rebelo de Sousa realçou que “pela primeira vez em democracia um Presidente da República toma posse em estado de emergência” e que durante a pandemia de covid-19 o parlamento “nunca deixou de funcionar ao serviço dos portugueses”, e agradeceu aos deputados “o exemplo de dedicação à democracia, nunca aceitando calá-la, nunca aceitando suspendê-la, nunca aceitando fazê-la refém”.
“Que seja essa a primeira lição do dia de hoje: vivemos em democracia, queremos continuar a viver em democracia, e em democracia combater as mais graves pandemias. Preferimos a liberdade à opressão, o diálogo ao monólogo, o pluralismo à censura, e demonstrámo-lo realizando duas eleições em pandemia, de uma das quais resultou a subida da oposição ao Governo”, afirmou, referindo-se às eleições regionais nos Açores, e observando: “Isto é democracia”.
Em seguida, o Presidente da República defendeu que é preciso “melhor democracia, onde a liberdade não seja esvaziada pela pobreza, pela ignorância, pela dependência ou pela corrupção, onde a inclusão, a tolerância, o respeito por todos os portugueses, para além do género, do credo, da cor da pele, das convicções pessoais, políticas e sociais não sejam sacrificados ao mito do português puro, da casta iluminada, dos antigos e novos privilegiados”.
“Queremos uma democracia que seja ética, republicana, na limitação dos mandatos, convergência no regime e alternativa clara na governação, estabilidade sem pântano, justiça com segurança, renovação que evite rutura, antecipação que impeça decadência, proximidade que impossibilite deslumbramento, arrogância, abuso do poder. Assegurá-lo é a primeira prioridade do Presidente da República para estes cinco anos”, acrescentou.