Substantivo abstrato e de efeitos concretos, a palavra soberania adentrou no vocabulário de discussões públicas, nas redes sociais, e até em inscrições em bonés e camisetas. Depois das sanções contra representantes dos três poderes do Brasil, por parte do governo dos Estados Unidos, o tema tornou-se temática principal do desfile de 7 de Setembro neste domingo.
Além do contexto da interferência estrangeira em assuntos brasileiros, especialistas ouvidos pela Agência Brasil alertam que as iniciativas de sensibilização para o tema, em momentos como esse, são importantes, mas devem fazer parte de um processo de debate e esclarecimento contínuo.
Soberania, segundo esses estudiosos, requer políticas públicas para fortalecimento do Estado, das comunidades e da cidadania. Um exemplo dessa atenção deve ser dado aos temas ambientais, conforme defende o pesquisador Helder Guimarães, do Centro Soberania e Clima, que é uma entidade independente.
Para fazer frente aos desafios concretos, é necessário que o Estado atue na conscientização para consolidar o sentido da soberania com a sociedade tendo em vista que essa é uma discussão que deve se tornar mais comum daqui para a frente. No entender de Guimarães, o caminho mais eficaz de sensibilização para a soberania é o da educação.
Guimarães contextualiza que questionamentos sobre como o País conduz questões amazônicas e ambientais também são exemplos de interferência.
“Desde o ensino básico, é fundamental que a discussão esteja na escola todos os dias. Além da educação formal, a promoção do debate público também se torna muito importante”, afirmou Helder Guimarães.
De acordo com o cientista político Leonardo Barreto, o processo de sensibilização da população deve ter relação com o pertencimento gerado pelas políticas públicas de proteção ao indivíduo. “Quando se tem garantias de que os seus direitos estão sendo preservados e que aquele lugar te protege, há a sensação de soberania. Esse é um sentido que vem da experiência”, afirmou.
Para o cientista político, a crise provocada pelos ataques à soberania brasileira torna-se um momento de reflexão para a sociedade brasileira. Esse sentido não pode ser imposto de cima para baixo.
“O que funciona é a identificação com a terra. Essa experiência é de direitos, respeito e confiança nas instituições. Uma experiência da ideia de que é bom viver num lugar e que vale a pena lutar por ele”.
Soberania, conforme abordam os estudiosos, relaciona-se com a ideia de o País ter controle de sua energia, ciência, tecnologia, cultura e também o meio ambiente.
“Esse conceito está relacionado ao dia a dia das pessoas, ao bem-estar coletivo e à dignidade dos cidadãos”, afirmou.
Para Helder Guimarães, o posicionamento a ser adotado nos temas ambientais tem reflexo interno e externo. Para isso, são necessárias políticas de fiscalização e controle na Amazônia, por exemplo. “Um dever de casa que o Brasil tem que fazer é identificar formas de desenvolvimento sustentável. O Brasil é um protagonista internacional na questão ambiental”.
Nesse campo ambiental, inclusive, segundo o pesquisador, o Brasil avançou à base de uma legislação protege os biomas e busca atacar o crime organizado. “Nós precisamos aperfeiçoar nossos mecanismos de fiscalização, no combate mais rigoroso aos crimes ambientais, aos desmatamentos e desmatamento”, afirma Guimarães.
Segundo o cientista político Leonardo Barreto, é necessário defender a soberania em ações como combate à pirataria e à mineração irregular. Para isso, torna-se necessário aperfeiçoar equipamentos como satélites e ferramentas de inteligência . “Políticas públicas também relacionadas com a transição energética, o incentivo à economia circular e à agricultura de baixo carbono."
Além disso, ele recomenda valorização das comunidades tradicionais. “Assim, se fomenta o desenvolvimento e a conservação dessas áreas”. Por isso, torna-se fundamental investir em ciência e em inovação.
A professora Albene Klemi, do departamento de História da Universidade de Brasília (UnB), nesse mesmo sentido, pondera que dependências tecnológicas ou desassistência de políticas públicas podem abrir flancos e fragilizam a soberania do país.
“Por isso que há estados mais fortes e outros mais dependentes. Daí a importância dos Estados se desenvolverem em prol do seu próprio povo”, afirmou.
Ela também insere a ideia que historicamente houve ingerências por parte de outras potências defendendo seus interesses. “Outros países tentam ter essa ingerência em cima de outros. Não é somente o caso brasileiro”. Por isso, estimular a participação do cidadão alarga o sentimento de defesa do país e de nação.
“Esse é um momento histórico”, diz a professora. A forma como o país reagirá a essas interferência pode, no entender dela, significar fortalecimento do sentido de soberania, que pode deixar de ser um conceito abstrato.