Milhares de mulheres negras participaram neste domingo (27), da XI Marcha das Mulheres Negras do Rio de Janeiro , na Praia de Copacabana. O evento reuniu coletivos de todo o estado e trouxe o lema “Contra o racismo, por Justiça e Bem-Viver” .
A data da marcha foi escolhida pela proximidade com o Dia da Mulher Negra Latino-Americana e Afro-caribenha, celebrado na última sexta-feira (25), e também porque 27 de julho era o aniversário da vereadora Marielle Franco, que se tornou um ícone da luta das mulheres negras.
A ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco, irmã de Marielle, participou da marcha, ao lado da mãe Marinete da Silva e da sobrinha Luyara Franco.
“Hoje a gente celebra à frente do Instituto Marielle Franco e do Ministério da Igualdade Racial e estamos aqui com um monte de mulher preta gritando por resistência. A gente sabe o que é estar de todos os lados da trincheira e não podíamos deixar de estar aqui”, declarou a ministra.
A filha de Marielle, Luyara Franco, também lembrou que os ideais da vereadora seguem como pauta do instituto criado após o seu assassinato, em 2018: “Hoje a minha mãe estaria completando 46 anos de vida e boa parte dessa vida foi dedicada às lutas que nos unem. Então estar aqui é muito simbólico pra gente, reafirma a nossa luta e a luta do Instituto Marielle Franco pelas mulheres negras”.
“Marielle vive na vida de cada uma dessas mulheres e celebrar a vida dela é estar na rua”, complementou Marinete Silva.
A manifestação do Rio também foi preparatória para a II Marcha Nacional das Mulheres Negras, que será realizada em Brasília, no dia 25 de novembro.
A coordenadora de Comunicação do Fórum Estadual de Mulheres Negras, Jupi Conceição, explicou o conceito de bem-viver, que há décadas, ocupa papel de destaque nas reivindicações.
“O bem-viver abrange o direito de ir e vir, de se alimentar, de botar comida no prato da sua família, sabendo que a maioria das famílias são sustentadas por mulheres, o direito de poder caminhar aqui nessa marcha, de poder se divertir com respeito, sem sofrer violência, o direito de não sofrer violência doméstica, nem feminicídio.”
Nesta edição, a faixa à frente da marcha foi carregada por meninas e jovens negras, representando a continuidade e o futuro do movimento .
A estudante Ana Julia, de 17 anos, era uma delas. “Eu venho para a marcha desde que eu era criança, porque a minha mãe me ensinou que com a marcha, a gente poderia ter voz, para lutar pelo que a gente quer. Para o futuro, eu quero oportunidades de estudo, de trabalho digno e menos preconceito no Brasil."
Logo em seguida, as mães que tiveram filhos mortos por agentes do Estado pediam Justiça . Uma delas era Rafaela Mattos, mãe do adolescente João Pedro Mattos, morto em 2020, durante uma operação policial.
Há cerca de um mês, a Justiça reformou uma decisão que havia inocentado os policiais envolvidos e decidiu que eles devem passar por júri popular, mas o julgamento ainda não foi marcado. Segundo Rafaela, a decisão trouxe uma esperança de conclusão para o caso, mas não afastou totalmente o medo.
“A nossa expectativa é que seja marcado o júri o mais rápido possível, mas os réus ainda podem recorrer, então estamos no aguardo. A gente deu um passo importante, mas eu ainda tenho medo sim que essa justiça não aconteça, porque já foram muitos anos, e durante esses cinco anos, os réus continuam soltos, nós não vimos nenhum tipo de punição. A gente sabe que a justiça é muito morosa, mas com certeza, o racismo e o fato do João ter sido morto numa favela contribuem para essa demora”
A co-fundadora do Movimento Moleque, Mônica Cunha, que teve um filho morto enquanto cumpria medida de ressocialização em uma unidade do Degase, lembrou que o racismo é determinante para explicar quais mães perdem os filhos por violência estatal.
“A gente está marchando nesse lugar, que é um dos IPTUs mais caros do Rio de Janeiro para mostrar que somos mulheres diversas, mas ainda estamos nesse local da dor, de precisar ir do luto à luta. E isso acontece por causa do racismo que impera sobre as nossas vidas. A marcha é para dizer que isso tem que acabar”
A importância de aumentar a representação política das mulheres negras também foi destacada . Richelle da Silva Costa era uma das participantes do movimento Mulheres Negras Decidem, que busca enfrentar essa ausência, com formação de lideranças e capacitação política.
“Nós somos o maior grupo demográfico do país e nós queremos estar nos espaços de poder para construir e pensar políticas. Não ter mulheres negras nesses espaços fortalece uma política que nos vulnerabiliza”, defendeu.