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Violência e ação policial levam fluxo da Cracolândia para novas áreas
Prefeitura de SP aponta recuo; especialistas criticam repressão
13/01/2025 16h20
Por: Redação Fonte: Agência Brasil

A repressão e violência sistemática em cenas abertas de uso de droga, no centro da capital paulista, leva à dispersão das pessoas para não serem vítimas da violência, porém elas continuam a fazer uso de substâncias em outros espaços públicos da cidade. A avaliação é da antropóloga Amanda Amparo, pesquisadora em Antropologia Social da Universidade de São Paulo (USP).

A prefeitura de São Paulo divulgou que houve redução do fluxo de pessoas na Rua dos Protestantes, na Cracolândia, local que já reuniu a principal concentração de pessoas em situação de desproteção social no centro da cidade. Entre janeiro e dezembro de 2024, a média de pessoas no local caiu 73,14%, conforme nota.

No período, a prefeitura calcula que as ações na região resultaram em 18.714 encaminhamentos para serviços e equipamentos municipais. Segundo o levantamento, no período, 679 pessoas alcançaram autonomia financeira, 308 conquistaram autonomia de moradia e 261 reconstruíram vínculos familiares. O Programa Operação Trabalho Redenção registrou 1.802 participantes.

Amanda Amparo, especialista em analisar a situação da Cracolândia, concorda que a quantidade de pessoas na região caiu, o que não quer dizer que o território, como um todo, tenha observado essa redução.

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“A concentração de pessoas ali, por conta do índice de repressão e infração de direitos humanos sistemáticas com as pessoas, obviamente tem feito com que elas não fiquem mais no mesmo local”, explicou, acrescentou que muitas saem durante o dia, mas retornam à noite.

A antropóloga diz ser frequente agressões contra os usuários e que no sistema de fechamento com grade, "as pessoas ficaram ali como se estivessem num zoológico”.

Ainda segundo a prefeitura, foram ampliadas as operações policiais no local e o número de prisões e apreensões passou de 5.455 para 6.074 no período de janeiro a setembro de 2024.

Cercadinho e limpeza

Integrante da Craco Resiste, a antropóloga Roberta Costa avalia que o levantamento da prefeitura é “reflexo da tortura cotidiana" vivida por quem não tem opção e pela falta total de estrutura da sociedade com as pessoas em situação de vulnerabilidade.

“A política do Poder Público, com certeza, espalha as pessoas pela cidade. Não há dúvida de que a população em situação de rua da cidade de São Paulo aumentou. As condições de vida da população, como um todo, piorou. Isso leva muitas pessoas para a rua e essa política de violentar pessoas que já foram tão violentadas ao longo da vida não as ajuda”, pontuou.

Ela critica também a limpeza feita pela prefeitura diariamente no local. A Secretaria Executiva de Projetos Estratégicos do município informou que são realizadas diariamente duas ações de limpeza na Rua dos Protestantes e que deslocamentos momentâneos, próximos a esses horários, são acompanhados pelas forças de segurança.

“Na Cracolândia, independentemente de operação [policial], todos os dias, de manhã e à tarde, tem a limpeza. O que é a limpeza? É a institucionalização da humilhação de pessoas que já estão desprotegidas socialmente e com um monte de problemas, que deveriam ser cuidadas”, relatou Roberta Costa.

Ela conta que, no momento da limpeza, todas as pessoas são retiradas do local e obrigadas a voltar para o cercadinho pela Guarda Civil Metropolitana (GCM).

“Inclusive vários usuários relatam que esse é o momento de maior violência, em que rasgam dinheiro deles, pegam cigarro, várias torturas físicas e psicológicas. Às 15h, eles fazem a limpeza de novo”, disse.

De acordo com Amanda Amparo, a maior circulação das pessoas não significa "que a prefeitura conseguiu implicar positivamente na vida dessas pessoas a ponto delas conseguirem se reorganizar".

Vias como a avenida Duque de Caxias, Rua dos Gusmões, Rua Helvétia, Rua Barão de Piratininga e Avenida São João têm sido locais de concentração de pessoas que fazem uso abusivo de drogas. “Quando a gente vai olhar também para o grande centro, a República já tem uma cena de uso muito maior do que tinha antes”, disse.

Considerando o modelo das políticas públicas implementadas na região, Amanda Amparo ressalta que a dinâmica de buscarem ficar concentradas, ainda que em outros pontos da cidade, é uma forma também de proteção. “O mecanismo de disseminação das pessoas, de fazer com que elas fiquem circulando sem parar, fez com que existissem várias cenas de concentração de uso problemático de drogas. Então, tem várias cenas, não é mais uma única”.

A dispersão resultante das ações de repressão na região, explica Roberta Costa, cria inclusive maiores dificuldades para o cuidado das pessoas em situação de vulnerabilidade. “O problema de espalhar essas pessoas é que, para cuidar delas, a gente precisa de vínculo, precisa saber de quem elas são. A gente tem anos de história de troca e cuidado com as pessoas que estão no fluxo da Cracolândia. O Poder Público, que não ajuda a cuidar, ainda faz o desfavor de violentar e espalhar as pessoas”, lamentou.

A Agência Brasil entrou em contato com a prefeitura de São Paulo para manifestação sobre o tema, mas não recebeu resposta até o momento. O espaço segue aberto.