O texto da reforma tributária aprovado na Câmara dos Deputados e que tramita agora no Senado vai beneficiar ao menos 82% dos 5.568 municípios brasileiros e 60% dos estados. A avaliação consta de estudo divulgado nesta segunda-feira (28) pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), ligado ao Ministério do Planejamento e Orçamento.
O documentoImpactos Redistributivos da Reforma Tributária: Estimativas Atualizadasfoi elaborado pelos pesquisadores Sérgio Gobetti e Priscila Monteiro e faz uma comparação de como ficará a arrecadação de estados e municípios.
O estudo comparou as receitas do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) e do Imposto sobre Serviços (ISS) obtidas em 2022 por todos os municípios e estados do país com as que teriam sido verificadas em caso de vigência do novo modelo tributário, que prevê um imposto sobre bens e serviços de base ampla e cobrado no destino, ou seja, no local de consumo.
O levantamento detalha que, apesar de a reforma beneficiar 60% dos estados individualmente, se for levado em consideração que alguns governos estaduais perderão participação no bolo tributário, porém cidades desse mesmo estado ganharão participação, compensando as perdas, o percentual de unidades federativas (UFs) beneficiadas será de 78%.
O Ipea constata que os entes ganhadores com a reforma são, em geral, estados menos desenvolvidos e municípios mais pobres. De todas as cidades que têmProduto Interno Bruto (PIB)per capita(valor de todas as riquezas produzidas dividido pelo número de habitantes) inferior à média brasileira, 98% serão beneficiadas. Do grupo das 108 cidades populosas e pobres (G100, criado pela Frente Nacional dos Prefeitos – FNP), 98% serão ganhadoras com a reforma.
Entre as grandes cidades, registram-se ganhos para 59% das capitais e 72% das que têm população superior a 80 mil habitantes.
“A redistribuição de receitas prevista na esfera municipal reduziria em 21% o grau de desigualdade entre os municípios, medido pelo Índice de Gini. A grande diferença hoje existente entre os municípios mais ricos e mais pobres deve cair em todas as UFs”, diz o levantamento, que aponta um exemplo em Goiás: a disparidade de receita tributáriaper capitaentre Alto Horizonte (considerado o mais rico) e Santo Antônio do Descoberto (o mais pobre), que atualmente é de 127 vezes, pode ser reduzida para quatro vezes.
O Ipea fez simulações também com a regra de transição. De acordo com a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 45/19, como foiprotocolada a reforma tributária, a transição prevê que, em cinco anos, 90% da receita do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS, a ser criado) ainda estarão sendo distribuídos pela regra antiga; e 10%, segundo as novas regras. Esses percentuais vão cair e aumentar, respectivamente, 2 pontos percentuais ao ano (a.a.), de modo que, apenas no quinquagésimo ano, toda receita será integralmente entregue ao destino.
Além disso, o modelo prevê um fundo (seguro-receita) constituído com 3% da receita livre de IBS (ou seja, a receita não retida para distribuição segundo as regras atuais), que será repartido entre os estados e municípios que apresentarem maior perda relativa de receita, cuja receitaper capitanão exceda a três vezes a média nacional.
Pelos cálculos do Ipea, com o período de transição, nenhum estado e poucos municípios correm o risco de ter queda de arrecadação em algum momento do processo. “Mesmo quando consideramos um cenário mais pessimista para o crescimento econômico nas próximas décadas, de taxa média em 1,5% a.a. (ante uma média de 2,1% a.a. desde 1995), apenas 32 cidades chegariam ao final da transição com receita menor que hoje, em termos reais”, descreve a pesquisa.
“Em cenários mais otimistas, com economia crescendo em média 2,5% a.a. depois da reforma tributária (um pouco acima da média), nenhum município terá perdas até o trigésimo ano, e apenas cinco terão perdas até o quinquagésimo ano”, completa.
Os pesquisadores apontam que, pelas próximas duas décadas, a combinação entre impactos positivos da reforma sobre a economia e regra de transição deve restringir o universo de perdedores a uma centena de cidades, e a ampla maioria delas não deve ter queda de arrecadação, mas apenas crescimento inferior ao que teriam na ausência das mudanças tributárias que, para os autores do estudo, são “essenciais para o país”.
O relatório indica que as cidades que correm o risco de ter queda de arrecadação são, em geral, sedes de refinaria de petróleo ou hidrelétricas (como São Francisco do Conde/BA, São Gonçalo do Rio Abaixo/MG, Paulínia/SP e Alto Horizonte/GO), que hoje concentram um volume desproporcional de receitas de ICMS. Para os autores, “essas cidades terão um tempo razoável de adaptação à nova realidade, sem riscos de queda abrupta de receita”.
O pesquisador do Ipea Sérgio Gobetti e a economista Priscila Monteiro concluem que “a redução gradual de desigualdade, principalmente pela ampliação das receitas dos municípios mais pobres, em todos os cantos do Brasil, deve ter impacto ainda imensurável sobre o bem-estar de suas populações, com possíveis desdobramentos sobre o ambiente econômico a serem detectados nas próximas décadas”.
Após ser aprovada em dois turnos na Câmara dos Deputados, a PEC 45/19 tramita na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado. O relator é o senador Eduardo Braga (MDB-AM). AAgência Brasilpreparou uma reportagem sobre o texto que está sendo analisado pelo Congresso.