A primeira-ministra da pequena ilha caribenha de Barbados, Mia Mottley, é um dos destaques do evento organizado pelo presidente francês, Emmanuel Macron, que começa nesta quinta-feira (22), em Paris. Chamado de Cúpula para o Novo Pacto Financeiro Global, o encontro deve contar com a participação de mais de 300 entidades públicas, privadas ou não governamentais, incluindo mais de 100 chefes de Estado, entre eles, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
O destaquede Barbados, que deve abrir o evento juntoao presidente Macron, se deve ao fato de opaísliderar a chamada “ Iniciativa de Bridgetown ”.A ex-colônia britânica, que se tornou independente em 1966, lidera proposta que exigeque os países mais industrializados e desenvolvidos arquem com as despesas eosfinanciamentos necessários para fazer frente às mudanças climáticasnos países em desenvolvimento.
Entre as propostas, estãoa suspensão de dívidas para os países mais pobres,aexpansãodos empréstimos do Banco Mundial e do Fundo Monetário Internacional (FMI) em US$ 1 trilhão para países em desenvolvimentoinvestiremem “resiliência climática”, além da criação de um fundo globaldeaté US$ 5 trilhões para mitigar os efeitos das mudanças climáticas.Nesse último caso, osrecursosnão passariampelas atuais instituições multilaterais como Banco Mundial e FMI, tornando,em tese, mais democráticoo acesso aos recursos.
“Problemas globais como acriseclimática nos mostram que simplesmente não podemos abordar questões modernas com instituições que foram criadas para um mundo muito diferente, há quase 80 anos”, defendeu a primeira-ministra de Barbados,Mia Mottley.
Continua após a publicidade
Jáo presidente Emmanuel Macron defendeque é preciso criar“melhores meios para enfrentar esses desafios nos países pobres e emergentes do mundo em desenvolvimento, no que diz respeito à quantidade de investimento, à reforma abrangente da infraestrutura como o Banco Mundial, o FMI e instituições públicas e fundos privados”.
A ilha de Barbados tem 432 km² –área menor queo município de Porto Alegre(495 km²)–e fica localiza em uma região que costuma ser afetada por fortes tempestades. Por isso, é apontado como exemplo de país mais vulnerável aos eventos extremos causados pelas mudanças climáticas.
O professor-associadodo Instituto de Economia da Unicamp, Pedro Paulo Bastos,destaca queo aquecimentoglobalresulta basicamente docrescimentoeconômico dos países desenvolvidos. “Os países desenvolvidos são largamente responsáveis pelo problema, mas calcula-se que 97% dos problemas vão ocorrer sobretudo nos países pobres”. O especialista explica que esses países estão localizados nas zonas tropicais mais vulneráveis a secas ou inundações provocadas pela elevação das temperaturas.
“Mais de 50% dos gases de efeito estufa do planeta são emitidos por não mais do que cinco ou seis países, e por não mais que 20 grandes empresas multinacionais”,apontaa pesquisa do professor José Luís Fiori , da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Entre esses países, estãoChina, Estados Unidos, Índia, Rússia, Japão e Alemanha.
“Então existe uma base científica para exigir uma enorme transferência de recursos dos países que são culpados, responsáveis pelo problema, para os países que, não tendo nenhuma responsabilidade significativa no aquecimento global, vão ser os mais prejudicados”,analisouo professor Pedro Paulo Bastos.
Para o especialista, a proposta francesa não está muito clara,enquantoa proposta de Barbadostem mais força“Macron está tentando tomar a iniciativa para moderar e esvaziar as propostas que vêm do Sul (global)”.Bastos avalia queo presidente francêsquer,por prestígio político,se apresentar como liderança global mais que a Mia Mottleye, ao mesmo tempo, mitigar a radicalidade da proposta de Bridgetown.
Uma das principais propostas da iniciativa de Bridgetown éa dereformular o FMI e o Banco Mundial para favorecer os países com menor capacidade financeira, além da criação de um novo fundo com regras mais igualitárias. Atualmente, a capacidade decaptar empréstimosvia mecanismos multilaterais depende,em boa medida,dos depósitos préviosque os paísesfazem nessas instituições.
Esse modelo de financiamentoreproduz as desigualdades de poder entre os países, segundo avalia o professor de Sociologia Econômica Edemilson Paraná, da LUT University da Finlândia. “Um mecanismo de compensação, financiamento, apoio e reparação climática precisa levar em consideração esse limite estrutural desses organismos”,destacou.
O sociólogo acrescenta queos mecanismos de financiamento não podem mais tomar decisões somente com base na maximização dos ganhos típica da racionalidade de mercado que governaessas instituições. “É preciso então adotar critérios políticos que governem a decisão eaação econômica para mitigar os efeitos e reparar as injustiças climáticas”, avaliouEdemilson Paraná.
Opresidente Lula vaidefenderna Cúpula em Parisqueo combate às mudanças climáticas precisa ser acompanhado de açõescontra apobreza .
“Quando você discute financiamento para o desenvolvimento sustentável, você não deveria,segundo nós defendemos, apenas canalizar esse financiamento para questões de clima.Você tem que olhar o desenvolvimento sustentávelcom base em três pilares:oeconômico,osocial eoambiental”, explicouo embaixador Philip Fox-Drummond Gough, diretor do Departamento de Política Econômica, Financeira e de Serviços do Ministério das Relações Exterioresbrasileiro.O embaixador brasileiro, ponderou, contudo, que a Cúpula tem “um caráter relativamente limitado em termos de participação, uma vez que não é um exercício de todos os países”.
Além do presidente brasileiro, estão previstas falas do primeiro-ministro da China, Li Qiang; da secretária do Tesouro dos Estados Unidos, Janet Yellen; do chanceler da Alemanha, Olaf Scholz; do príncipe da Arábia Saudita, Mohammed bin Salman; do presidente do Egito, Abdul Fatah Khalil Al-Sisi, entre outros.