Em um dia de chuva, os dois quilômetros que separam o distrito de Jacutinga do Sítio Santa Amália exigem paciência dos viajantes e boa tração dos carros de quem precisa percorrer o interior de Ivaiporã, no Vale do Ivaí. Silvana Santos Marcomini Fávaro, produtora de café na propriedade, tem muito mais que isso. Ela carrega criatividade, visão estratégica e o destemor para empreender, ainda que pessoas próximas achem loucura muito do que ela faz.
A produtora continua sonhando alto. Ela já ressuscitou algumas vezes o pomar de café que ocupa dois alqueires da propriedade de 20 alqueires. Depois de três anos em que as geadas e a estiagem comeram a maior parte da produção, ela investiu com ajuda do Governo do Paraná e espera colher 800 sacas de café em coco na atual safra. Uma esperança animadora para quem tirou 50 e 150 sacas nos dois últimos ciclos.
Há 34 anos, desde que nasceu, aquele é o chão de Silvana, trabalhando no café com a família. Ao casar, em 2011, houve uma interrupção no convívio, quando ela tentou se adaptar à cidade. Sem a ajuda da filha, Walter Marcomini pensou em desistir da cafeicultura. No ano seguinte, Silvana estava de volta para não deixar a tradição morrer. “Mas era plantio antigo, não dava o retorno necessário”, comenta a produtora.
A primeira tarefa foi a renovação da lavoura, por partes, processo que ainda continua. A tecnologia começou a chegar com o uso de lavador e secador, e secagem ao sol em terreno suspenso, com sombrite, que mantém a qualidade da bebida. O resultado veio de imediato. Silvana, o marido Márcio, o pai Walter e a mãe Geralda ficaram com o primeiro lugar no concurso Prêmio Café Qualidade, do IDR-Paraná, realizado em 31 de outubro de 2018, em Pinhalão, no Norte Pioneiro.
De lá para cá foi um sobe e desce. “Faz três anos que não colhemos quase nada. Em 2019 pegamos uma geada grande. Sofremos muito e perdi café no pé. Em 2020, começou a seca. Depois tivemos três geadas em 2021. Isso vem quebrando a safra”, conta.
Poderia ter sido o aviso para Silvana – que já participava do grupo Mulheres do Café do Vale do Ivaí, criado em 2021 inspirado no Mulheres do Café do Norte Pioneiro, de 2013, e que hoje tem 27 participantes – parar. Acabou sendo o incentivo para ousar e inovar.
“A seca fez o café quase morrer, quase perdemos todo o plantio, então decidimos colocar irrigação”, afirma. Naquele momento, a sorte jogou a favor da família. O Governo do Estado do Paraná tinha acabado de lançar o Banco do Agricultor Paranaense , que garantia juro zero ao produtor que investisse em irrigação. O agrônomo do Instituto de Desenvolvimento Rural-Iapar-Emater (IDR-Paraná) da região, Cleversom da Silva Souza, apresentou a proposta, que foi logo aceita e o investimento de R$ 157 mil já está em pleno funcionamento na propriedade.
“Depois de anos difíceis, a irrigação foi uma resposta ao sofrimento da seca”, acentua Silvana. “Este ano temos a perspectiva de colher umas 800 sacas”.
De acordo com o especialista de café do Departamento de Economia Rural (Deral), da Secretaria de Estado da Agricultura e do Abastecimento (Seab), Paulo Sérgio Franzini, a falta de água adequada e no volume certo é responsável por perdas entre 15% e 20% do café em uma safra no Brasil. “Por isso, a irrigação é um fator interessante no processo”, afirma.
A família também instalou um sistema de energia solar, que deve contribuir para reduzir os custos na propriedade, onde Walter cria gado para corte. Por ser importado, o sistema não pode ser incluído nos benefícios do Banco do Agricultor Paranaense. Sem os gastos com irrigação, pois a energia solar veio depois, a conta de luz mensal era de cerca de R$ 400,00. No último mês, baixou para R$ 18,00, basicamente o custo do uso da fiação da empresa de energia.
APOIO DO ESTADO– “É uma família que venceu pelo trabalho, pela visão estratégica, pelo aproveitamento de algumas oportunidades”, destaca o secretário de Estado da Agricultura e do Abastecimento, Norberto Ortigara, que visitou a propriedade no começo deste ano. “É preciso também saudar o time do Sistema de Agricultura do Estado por ter tido um olhar atencioso e carinhoso, absorvendo o pensamento do agricultor para construir uma solução unificada”.
Segundo ele, o governo estadual vai continuar a agir com muita força no apoio a áreas que entende ser importantes para o crescimento do Estado e do agricultor, particularmente o familiar, como a irrigação, a energia renovável, sobretudo biogás, biometano e hidrogênio verde, as estradas rurais e tudo o que ajudar a reduzir custo e esforço do produtor, além de acrescentar renda e aumentar o poder de negociação com o mercado.
“Nunca defendemos um mar de café, mas um pomar bem cuidado, uma roça bem-feita em pequena propriedade, buscando no café o atributo que tem, que é ser uma bebida boa”, afirma Ortigara. “Precisamos muito mais, podemos muito mais e vamos fazer muito mais”.
Mesmo recado do presidente do IDR-Paraná, Natalino Avance de Souza. “A nossa função como instituição, braço da Seab, é ajudar os pequenos agricultores a ter mais qualidade de vida e mais renda na agricultura”, diz. “Quando vemos uma experiência exitosa ficamos felizes, e pensando por que não repetir isso com mais famílias, por que não usar esta propriedade como referência. Não podemos nos acomodar, precisamos ter mais exemplos como esse”.
É por isso que a equipe do Sistema Estadual de Agricultura não para de trabalhar. A assistente social do IDR-Paraná responsável por acompanhar o grupo Mulheres do Café do Vale do Ivaí, Natália Duarte Vettor, já pensa um pouco adiante ao conversar com a Sanepar para o aproveitamento do lodo gerado a partir do tratamento de esgoto como alternativa sustentável e economia em fertilizante. “As propriedades do projeto já passaram pela análise do solo nesta parceria, que tem como objetivo a melhoria da produção”, afirma.