Um navio com 230 migrantes resgatados no Mar Mediterrâneo se tornou o centro de novos desentendimentos entre a França e a Itália, após o novo governo italiano de extrema direita impedir o acesso da embarcação da ONG SOS Méditerranée aos portos do país.
Durante semanas, o navio Ocean Viking viveu uma verdadeira odisseia, enquanto buscava autorização para atracar em algum porto seguro. A procura levou a embarcação até a costa da França, onde finalmente recebeu permissão para desembarcar os migrantes em Toulon.
O navio chegou ao porto militar no sul da França nesta sexta-feira (11/11), mas a crise entre Paris e Roma não demonstra sinais de abatimento. O governo francês e as ONGs acusam a Itália de violar leis marítimas internacionais ao negar refúgio às pessoas resgatadas.
O ministro francês do Interior, Gérald Darmanin, em retaliação, anunciou o reforço dos controles nas fronteiras terrestres com a Itália.
Na passagem entre Ventimiglia, no lado italiano, e Nice, na parte francesa, a polícia fazia a verificação de automóveis, embora os dois Estados-membros da União Europeia (UE) façam parte do Espaço Schengen, a zona de livre fronteira do continente europeu. Outros dez postos de fronteiras serão monitorados por cerca de 500 policiais.
O ministro francês para Assuntos Europeus, Laurence Boone, disse que a fronteira com a Itália seria fechada, com a imposição de controles de passaporte. Além disso, Darmanin informou que a França decidiu não acolher 3,5 mil migrantes que chegariam ao país vindos do território italiano no próximo ano, como previsto em um acordo entre os países da UE.
Violação das leis internacionais
A primeira-ministra italiana, Giorgia Meloni, impôs limites às embarcações de resgate de refugiados no Mediterrâneo, a quem chamou de "serviço de taxi de migrantes". Ela criticou Paris por reclamar da chegada de 230 migrantes, quando "desde o começo do ano, quase 90 mil chegaram à Itália".
Em outubro, o novo ministro italiano do Interior, Matteo Piantedosi, sugeriu que a Itália teria o direito de proibir os navios de resgate de entrarem em suas águas territoriais com base no artigo 19 da Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar (Unclos), que afirma que as embarcações não devem ser "prejudiciais à paz, à ordem ou à segurança" do país que as recebem.
As ONGs, no entanto, rejeitam essa interpretação da lei. Especialistas afirmam que negar ou atrasar o acesso às águas italianas usando a migração ilegal como justificativa seria uma violação das leis internacionais.
Em 2 de novembro, Meloni disse que os Estados representados nas bandeiras dos navios devem ser os responsáveis pelos migrantes resgatados. Esses países seriam, no caso, a Alemanha e a Noruega. Piantedosi descreveu as embarcações como "ilhas", ou seja, extensões dos territórios ao qual pertencem.
Juristas nas duas nações rejeitam essa afirmação. A lei, segundo afirmam, explicita que "um navio não é um território". Especialistas também condenaram a alegação de que os navios poderiam ser considerados locais de segurança, ou que os pedidos de asilo possam ser processados nas próprias embarcações.