Em sua tradicional conversa com jornalistas no avião papal, em seu último dia no Canadá, o Papa Francisco não descartou uma possível renúncia por conta dos problemas de saúde. De cadeira de rodas ou muleta durante toda a viagem, Francisco vem sofrendo de dores no joelho direito que o impedem de andar longas distâncias. Por conta disso, cancelou viagens internacionais e a participação em alguns ritos católicos no Vaticano e na Itália.
— Não acredito que eu possa manter o mesmo ritmo de viagens de antes. Acredito que com a minha idade e com essa limitação, devo me preservar um pouco para poder servir à Igreja. Ou, ao contrário, posso pensar em ficar um pouco mais de lado. Não é uma catástrofe, não. Se pode mudar o Papa, isso não é um problema — disse no avião, de volta à Roma.
Embora a principal missão do pontífice no Canadá fosse o que ele chamou de “peregrinação de penitência” para pedir desculpas aos indígenas pelos horríveis abusos que sofreram em escolas residenciais administradas pela Igreja Católica, também foi uma peregrinação em que Francisco, de 85 anos, usou sua própria vulnerabilidade para exigir dignidade para os idosos em um mundo cada vez mais povoado por eles.
Ao ser novamente questionado se pensava em renunciar, assim como seu antecessor, o Papa emérito Bento XVI, o Pontífice voltou a ser ambíguo.
"Se eu já pensei em renunciar? A porta está aberta. É uma das opções normais. Mas, até hoje, eu não empurrei essa porta. Não cheguei a pensar nessa possibilidade. Mas, talvez isso não quer dizer que depois de amanhã começarei a pensar. Mas, nesse momento, sinceramente, não", pontuou.
Segundo o Pontífice, a viagem ao Canadá foi "uma espécie de teste". Ele admitiu que talvez precisará "mudar um pouco" o estilo de suas visitas internacionais para "pagar a dívida" que tem com alguns países.
"Acredito que preciso limitar um pouco esses esforços. A cirurgia no joelho não pode ser feita porque, no meu caso, tem o problema da anestesia geral que sofri há 10 meses. Foram seis horas de anestesia e ainda tenho os traços disso. Não se brinca com anestesia e é por isso que a cirurgia não é conveniente. Mas, eu vou tentar e continuar a fazer viagens para ficar próximo às pessoas porque essa é uma maneira de servir", acrescentou.
Sobre as próximas viagens internacionais, o líder católico voltou a repetir que quer ir neste ano para Kiev, na Ucrânia, país que está em guerra desde fevereiro, além do Cazaquistão — "que seria uma viagem tranquila, sem muito movimento" — e também ao Sudão do Sul:
"É uma viagem que o arcebispo de Canterbury e o bispo da Igreja da Escócia, todos os três juntos, devem ir", declar.
Francisco também voltou a falar sobre o assassinato de milhares de indígenas canadenses em internatos e instituições geridas pela Igreja Católica, que ele classificou como "genocídio" pela primeira vez.
"É verdade, eu não usei a palavra porque ela não veio em minha mente, mas eu descrevi o que é genocídio. Pedi desculpas a eles, por esse trabalho, e é genocídio", disse.
"Por exemplo, eu condenei isso: retirar as crianças, mudar a cultura, mudar a mente, mudar as tradições, mudar uma raça, digamos assim, toda uma cultura. Se há uma palavra técnica é genocídio, mas acabei não usando porque não veio em minha mente. Mas, sim, tranquilamente posso dizer que sim, foi um verdadeiro genocídio".
Do final do século XIX até a década de 1990, o governo canadense enviou cerca de 150 mil crianças para 139 internatos administrados pela Igreja, onde foram separadas de suas famílias, idioma e cultura. Muitas sofreram abusos físicos e sexuais nas mãos de diretores e professores, e acredita-se que milhares tenham morrido de doenças, desnutrição ou negligência.