Em conferência de imprensa, representantes das ONG Associação Mãos Livres, Fórum Regional de Desenvolvimento Universitário (FORDU) e a Associação OMUNGA, ligadas à defesa dos direitos humanos e ao exercício da cidadania, informaram que a queixa foi apresentada junto do Departamento Central de Investigação Penal (DCIAP) português.
Segundo Salvador Freire, da Mãos Livres, porta-voz do grupo, os factos ocorreram entre 2005 e 2012 e além dos ex-quadros diretivos da Sonangol está envolvido o Banco Millenium BCP (Banco Comercial Português S.A.).
O representante das três ONG referiu que a queixa foi apresentada, no dia 07 deste mês, em Portugal, considerando que o país europeu “serviu de lavandaria” para o dinheiro supostamente desviado de Angola.
As denúncias são contra Baptista Muhungo Sumbe, José Pedro Benge, Manuel Domingos Vicente, Fernando Osvaldo dos Santos e outras pessoas presentemente desconhecidas, incluindo atuais ou ex-funcionários do Millenium BCP.
Em resposta aos jornalistas, Salvador Freire disse que o banco onde as ações ocorreram está baseado em Portugal e as organizações possuem evidências suficientes sobre este facto, embora os fundos provenham da corrupção envolvendo atores angolanos.
“Portugal foi a lavandaria, aliás, há vários anos que Portugal tem servido como lavandaria para fundos ilícitos provenientes da corrupção em Angola, evidenciando que este tipo de criminalidade transcende as fronteiras nacionais em detrimento dos angolanos, por isso esta é uma iniciativa de responsabilizar os beneficiários e os facilitadores do esquema de corrupção”, referiu.
O advogado e ativista frisou que o processo poderia ter sido intentado em Angola, mas as organizações decidiram avançar com a ação “numa esfera em que fosse possível responsabilizar os diferentes atores”.
Apesar de a queixa ter sido apresentada em Portugal, o anúncio hoje feito em Luanda visa que a Procuradoria-Geral da República de Angola investigue as denúncias, salientou Salvador Freire.
Na denúncia feita, as organizações não-governamentais angolanas referem que há indícios de pagamentos em dois esquemas, efetuados entre 2005 a 2012, por uma empresa multinacional de serviços petrolíferos e de construção – SBM Offshore N.V. – e pagos através das contas portuguesas de duas empresas ‘offshore’ similares – Madrill Inc. (Madrill) e Sonangol Internacional, Inc. (SII) – cada uma detida e administrada por um ou mais executivos seniores da empresa angolana de hidrocarbonetos paraestatal Sonangol E.P..
De acordo com as denúncias, os pagamentos foram recebidos e geridos pelo Banco Comercial Português (BCP) sem o exercício da devida diligência anti-branqueamento de capitais.
“Os denunciados Baptista Muhongo Sumbe [executivo da Sonangol], José Pedro Benge [executivo da Sonangol] e Fernando Osvaldo dos Santos [empresário da indústria do setor petrolífero] foram diretores e responsáveis da empresa fantasma no Panamá, a Madrill Incl. [Madrill] desde pelo menos abril de 2010”, disse Salvador Freire.
Os denunciados Baptista Sumbe, José Pedro Benge e Manuel Domingos Vicente, prosseguiu Salvador Freire, ao mesmo tempo que eram executivos seniores da Sonangol eram também diretores e/ou responsáveis da empresa fantasma no Panamá.
“Baptista Sumbe supostamente foi presidente-fundador e diretor executivo da SII, incorporada a 07 de abril de 1998, apenas dois meses depois da Madrill. Sumbe foi mais tarde adicionalmente designado como secretário e tesoureiro a 01 de janeiro de 2010”, frisou.
Já José Pedro Benge e Manuel Domingos Vicente, então diretor executivo da Sonangol, foram nomeados, a 01 de janeiro de 2010, diretores da SII e uns dias mais tarde, a 04 de janeiro, uma reunião de acionistas aprovou a abertura de uma conta bancária empresarial no Banco Privado Atlântico (BPA-Europa).
A Baptista Sumbe foi concedido o poder de signatário exclusivo, tendo a José Benge e Manuel Vicente sido concedida a autoridade signatária conjunta.
“O primeiro esquema, negócio da Madrill Inc. envolve 52 pagamentos no total de 17,4 milhões de dólares [14,8 milhões de euros] ao longo de seis anos, pagos à empresa fantasma do Panamá Madrill Inc, sem bases legais para o receber”, indicou Salvador Freire.
“O acordo da SBM para efetuar estes pagamentos aparenta ter resultado de ameaças expressas de que os negócios da SBM com a Sonangol e outros potenciais negócios em Angola seriam gravemente afetados se os pagamentos não fossem efetuados”, continuou.
Salvador Freire disse que o segundo esquema, envolvendo negócios da Sonangol International Inc envolve 35 milhões de dólares (29,7 milhões de euros), que se suspeita terem sido ilicitamente pagos em 2012 pela subsidiária da SBM, a SBM Holding Inc. S.A. à segunda empresa fantasma no Panamá, a Sonangol International Inc e sob circunstâncias muito similares as dos pagamentos da Madrill.
O advogado e ativista angolano disse acreditar na justiça angolana e explicou que a queixa surge nove anos depois dos factos, depois de um “processo aturado [de investigações]”.
“Nós tivemos que trabalhar muito neste processo e encontrar elementos suficientes que sustentassem a denúncia, portanto, levou-nos tempo e tivemos que fazer investigações aqui e não só, por isso é que levou esse tempo todo. Trouxemos provas suficientes, quer provas documentais e testemunhais”, sublinhou.