Em trânsito pelas montanhas de Jérémie, no Sudoste do Haiti, o engenheiro civil Jac-Ssone Alerte, de 36 anos, atende a um telefonema e, logo, se assusta. Era seu irmão informando que houve, na tarde desta quarta-feira (1), uma réplica do terremoto de magnitude 7,2 que atingiu a região no dia 14 de agosto, matando mais de 2,2 mil pessoas.
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As casas do distrito onde Alerte nasceu e mora balançaram com o novo tremor, de intensidade menor. Desta vez, ninguém morreu. Mas para evitar que possíveis novos abalos sísmicos, que são constantes na pequena ilha situada no Caribe, voltem a destruir famílias locais, o engenheiro importou uma tecnologia brasileira antiterremoto.
Há 15 anos, Alerte decidiu que gostaria de estudar engenharia fora do Haiti. Por isso, procurou por Embaixadas oportunidades. Conseguiu bolsas de estudo na França e no Brasil. Mas, por conta do euro ser mais caro do que o real e pelo fato de o governo brasileiro ter oferecido a gratuidade do curso, além do alojamento, decidiu ir para o Rio de Janeiro, onde conseguiu vaga na Universidade Federal, desembarcando no aeroporto do Galeão em 2008.
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Sem saber falar absolutamente nada em português, ele chegou no Rio com mala, o endereço da universidade e muita coragem. Entregou a direção para um taxista, que rodou a cidade por mais de uma hora e cobrou cerca de 300 dólares para levá-lo até seu destino. Lá, foi ao centro de estudantes, onde foi recebido por um brasileiro, que o abrigou e ensinou, aos poucos, a língua portuguesa.
Dez anos depois, ele não só aprendeu o português, como se formou engenheiro civil pela UFRJ. No final de 2019, voltou para Jérémie, em seu país natal, para implantar uma tecnologia que aprendeu no Rio de Janeiro de construção sustentável que é a ideal para enfrentar terremotos e até mesmo furacões. É lá, em homenagem a sua mãe, que morreu enquanto ele estudava no Brasil, que encontra-se, hoje, o Village Marie.
"Fui ao Brasil pensando na minha comunidade, em poder voltar um dia. Queria ter a oportunidade de estudar e ter uma ferramenta de conhecimento, mas um conhecimento muito mais prático, para poder transformar uma realidade", afirmou Alerte.
Para isso, os próprios moradores do distrito participam ativamente. São eles mesmos quem fazem os tijolos, de maneira artesanal, e ajudam a colocar as casas de pé. Só a telha veio do Brasil, diretamente de São Paulo. E ela também é projetada, estratégicamente, para, caso haja um furacão, ela se desprenda da casa, voe para longe e se despedace.
Além disso, a energia elétrica é solar, e o esgoto é tratado por meio de um biodigestor. Para que o projeto caminhe, Alerte contou com a colaboração de doações de muitas pessoas, incluindo alguns brasileiros. Mas também é contínuo através de uma plantação que preserva a vegetação nativa, uma agrofloresta. Na próxima safra, no mês que vem, serão colhidos feijão, milho e inhame.
Gislaine Jules, de 36 anos, perdeu a casa, na região do village, no terremoto de 14 de agosto. Além dela, outras 14 pessoas serão agraciadas com a moradia tecnológica contra terremoto em Jérémie. Ao lado da filha, e em frente à antiga casa, ela afirma estar ansiosa pelo término da construção da nova casa. "Sei que vou ter uma casa bem bonita", disse.
Para Alerte, além de oferecer uma solução sustentável para as pessoas do seu distrito, as construções antiterremotos aplicadas na região podem se espalhar para outras comunidades do Haiti. "Meu sonho é que as pessoas deixem de viver em fábricas de mortes e passem a viver em lares de verdade", afirmou o engenheiro.
Para que o projeto continue, Alerte e a comunidade de Jérémie necessitam de doações. Por isso, uma vaquinha online foi aberta no: www.voaa.me/haiti-terremoto-vaquinha.