O presidente Jair Bolsonaro sancionou com vetos a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), que define regras para a elaboração do Orçamento de 2022. Além de vetar o fundo especial de R$ 5,7 bilhões para o financiamento das eleições do ano que vem, o Palácio do Planalto decidiu barrar também itens que previam recursos para o enfrentamento da pandemia de coronavírus. A Lei 14.194, de 2021, foi publicada no Diário Oficial da União desta segunda-feira (23), com mais de 40 dispositivos vetados.
A reserva de R$ 5,7 bilhões para o fundo eleitoral constava do projeto de LDO aprovado pelos senadores e deputados (PLN 3/2021). De acordo com o Ministério da Economia, o governo precisaria reduzir despesas primárias e emendas de bancadas estaduais para conseguir alocar o valor para o fundo especial. Segundo o Poder Executivo, isso “teria impacto negativo sobre a continuidade de investimentos plurianuais” — inclusive nos gastos previstos para o combate à covid-19.
O Poder Executivo também vetou um dispositivo que previa aumento de 50% em relação a 2021 no orçamento previsto para o desenvolvimento de vacinas. Para o Ministério da Economia, o dispositivo contraria o interesse público por fixar um índice de reajuste “em patamar excessivamente superior ao estabelecido na Constituição para as demais ações e serviços públicos de saúde”.
Jair Bolsonaro barrou ainda um conjunto de dispositivos que estabeleciam prioridades e metas da administração pública para o próximo ano. Entre as ações previstas, o projeto listava programas emergenciais, ampliação da infraestrutura da rede de atendimento contra o câncer e tratamento de sequelas causadas pela covid-19.
Segundo o Palácio do Planalto, a medida “contribuiria para a elevação da rigidez orçamentária, que já se mostra excessiva”. De acordo com a mensagem encaminhada ao Congresso, o excesso de vinculações e a existência de inúmeras regras de aplicação de despesas “dificultam o cumprimento da meta de resultado primário.
Outro dispositivo suspenso previa que as transferências para o custeio de hospitais universitários federais e prestadores privados seriam depositadas em contas correntes específicas. O mesmo valeria para emendas destinadas àquelas instituições.
Segundo a mensagem de Jair Bolsonaro, a medida contraria a organização do Sistema Único de Saúde (SUS). “Não poderia a União definir, no momento da transferência de recursos do Fundo Nacional de Saúde aos fundos de saúde de estados, municípios e Distrito Federal, se esses recursos seriam utilizados para custeio da rede própria ou para contratação de entidades privadas, sob pena de ferir a autonomia dos demais entes federativos”, argumenta o presidente da República.
Veja a seguir outros pontos vetados da LDO:
O PLN 3/2021 proibia o bloqueio de restos a pagar relativos ao Ministério da Educação. Os restos a pagar são despesas já empenhadas pela União, mas que não foram pagas até o dia 31 de dezembro. Para o Poder Executivo, a previsão “traria prejuízo à sistemática de contenção do crescimento dos restos a pagar inscritos, o que contraria recomendações diversas emanadas pelo Tribunal de Contas da União, e aumentaria a pressão fiscal pelos recursos disponíveis em exercícios futuros”.
O projeto também previa regras específicas para a limitação de empenho e a movimentação financeira do Ministério da Educação. De acordo com o texto, o corte deveria ser proporcional. Ou seja: não poderia ser maior do que a média geral de limitação imposta pela União a todo o Orçamento de 2022. Isso valeria tanto para as despesas gerais da pasta, quanto para universidades, hospitais universitários e institutos federais. Para o Palácio do Planalto, a medida restringiria a “discricionariedade alocativa do Poder Executivo” e aumentaria a rigidez do orçamento.
De acordo com o projeto, a execução das emendas parlamentares deveria observar a ordem de prioridades feita por senadores e deputados. Ainda segundo o texto, o ministro responsável pela despesa poderia pedir informações adicionais sobre cada dotação incluída por emenda. O Poder Executivo teria prazo de 180 dias para empenhar os gastos. Para Jair Bolsonaro, a regra “não tem previsão constitucional” e “investe contra o princípio da impessoalidade, ao fomentar cunho personalístico nas indicações”.
O presidente da República também vetou um dispositivo que considerava impositivas as emendas apresentadas por bancadas estaduais. Para Bolsonaro, a medida “incorre em vício de inconstitucionalidade” porque a mudança não poderia ocorrer por meio de lei, mas sim por meio de emenda à Constituição — como ocorre no caso das emendas individuais impositivas.
O PLN 3/2021 previa ainda uma regra específica para emendas direcionadas ao Ministério da Educação. A pasta poderia alocar recursos para qualquer programação de custeio de natureza discricionária. O Palácio do Planalto alertou para a “ambiguidade” do dispositivo. “Sua manutenção permitiria a interpretação de que o mesmo não poderia ser aplicado às emendas direcionadas às programações dos demais órgãos”.
O projeto aprovado pelo Congresso previa que o Orçamento da União e os créditos adicionais de 2022 deveriam classificar as despesas em categorias específicas. A regra valeria para gastos relacionados a abastecimento de água, esgotamento, manejo de resíduos sólidos e saneamento básico em municípios de até 50 mil habitantes. O texto previa ainda a classificação das despesas em áreas como conservação de infraestrutura, recuperação de malhas ferroviárias, ressarcimento das emissoras de rádio e televisão pela inserção de propaganda partidária e reajuste do piso salarial de agentes comunitários de saúde e de combate às endemias.
Para o Poder Executivo, a exigência “poderia promover a sobreposição de ações e prejudicar a qualidade da classificação programática do orçamento”. Isso porque algumas ações orçamentárias são realizadas por órgãos diferentes dentro da administração pública.
Bolsonaro cita como exemplo a Política Nacional de Saneamento, que é executada pelo Ministério do Desenvolvimento Regional. No entanto, em municípios com até 50 mil habitantes, as ações de saneamento cabem à Fundação Nacional de Saúde. “Segregar os recursos em programação específica criaria riscos para a eficiência orçamentária, favoreceria a fragmentação da estratégia de atuação, violaria o conceito de orçamento-programa”, argumenta.
O projeto ampliava a possibilidade de transferência de recursos a entidades privadas sem fins lucrativos. De acordo com o texto original, o dinheiro poderia ser usado para construção, ampliação ou conclusão de obras. Jair Bolsonaro vetou o dispositivo por entender que ele “amplia de forma significativa” o rol de despesas repassadas para entidades privadas. “Tal transferência promoveria o aumento do patrimônio dessas entidades sem que houvesse obrigação de continuidade na prestação de serviços públicos por período mínimo condizente com os montantes transferidos”, argumenta o chefe do Poder Executivo.
A LDO também permitia a transferência de recursos a organizações sociais por meio de termo de colaboração, fomento ou convênio firmado com entidade filantrópica ou sem fins lucrativos. Para o Palácio do Planalto, a medida contraria a legislação em vigor, que prevê apenas o contrato de gestão como instrumento válido para parcerias entre o Poder Público e as organizações sociais.
O presidente da República vetou um dispositivo que autorizava o reajuste de valores para conclusão de obras paralisadas. A regra valeria apenas para projetos com equilíbrio no cronograma físico financeiro e execução física igual ou superior a 30%. Para o Palácio do Planalto, a proposta “poderia gerar incentivos para o aumento generalizado do custo dessas obras. Além disso, esse ponto “poderia trazer prejuízos à eficiência, à economicidade e à qualidade da despesa pública”.
O PLN 3/2021 previa uma regra especial para a transferências voluntárias referentes a obras de engenharia com valor de até R$ 3 milhões. De acordo com o texto, o montante seria liberado em parcela única. Além disso, os instrumentos de transferência em vigor teriam prazo prorrogado por mais 240 dias.
Para o Poder Executivo, aumentar o limite de liberação de recursos em parcela única “poderia causar o empoçamento de recursos” nas contas de estados, Distrito Federal, municípios e organizações da sociedade civil. A limitação em vigor foi estabelecida em 2016, quando se verificou um empoçamento de aproximadamente R$ 9 bilhões.
Ainda de acordo com o texto, os bancos oficiais e órgãos federais responsáveis por transferências financeiras devem homologar em 90 dias a síntese de projetos aprovados para obras e serviços de engenharia acima de R$ 10 milhões. Segundo o Palácio do Planalto, a medida foi vetada porque iria retomar um “trâmite burocrático desnecessário”, que foi suprimido em 2019.
O projeto aprovado pelo Congresso permitia transferência de recursos, assinatura de convênios e doação de bens para municípios de até 50 mil habitantes, mesmo que inadimplentes com a União. O dispositivo foi vetado por contrariar o interesse público. “Esses municípios representam cerca de 88% dos municípios brasileiros, o que tornaria ineficazes os instrumentos de controle e boa gestão fiscal”, argumenta Bolsonaro.
Jair Bolsonaro vetou um dispositivo que obrigava o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) a destinar 30% dos recursos do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) para financiamento a pequenas e microempresas. Para o Poder Executivo, “a obrigação de destinar parcela específica de recursos criaria amarras para a operação e a alocação adequada dos recursos do FAT destinados aos financiamentos”. Além disso, a vinculação “inviabilizaria a adoção de políticas anticíclicas ou de incentivo a setores estratégicos”.
O PLN 3/2021 estabelecia regras para a publicidade do chamado Orçamento Mulher. De acordo com o texto, o Poder Executivo deveria divulgar até 31 de janeiro um relatório anual sobre a execução orçamentária do Orçamento Mulher referente ao exercício anterior. Para o Palácio do Planalto, “as políticas públicas de redução das desigualdades de gênero integram o Orçamento Fiscal e não há previsão constitucional para a criação de outros orçamentos”.
O texto previa ainda a inclusão de informações específicas para despesas do chamado Orçamento da Criança e do Adolescente. A peça orçamentária deveria esclarecer critérios para distribuição de recursos nas áreas de assistência social, primeira infância, educação, desporto, habitação, saúde e saneamento, entre outros. Segundo Jair Bolsonaro, “grande parte das despesas relacionadas a esse público encontram-se alocadas em políticas de caráter universal, que não são previamente segregadas por faixa etária ou grupo atendido”.
A LDO dispensava a apresentação de estimativa de impacto orçamentário para projetos de decreto legislativo editados para sustar atos do Poder Executivo que exorbitem do poder regulamentar. De acordo com a mensagem de veto, a medida contraria a Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei Complementar 101, de 2000).
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