O Projeto de Lei (PL 2.159/2021) que trata da Lei Geral do Licenciamento Ambiental (LGLA) começa a ser analisado pelas comissões temáticas do Senado. A matéria, que tramitou por 17 anos na Câmara dos Deputados, busca simplificar e agilizar o processo licenciatório a partir da definição do marco legal.
A rápida aprovação do projeto no Plenário da Câmara foi criticada por organizações, entidades científicas e sociedade civil. Para alcançar o equilíbrio entre proteção ambiental e atividade econômica, os senadores terão de se debruçar em questões apontadas como controversas e que podem gerar aumento de litigiosidades, vulnerabilidade ambiental e desconfiança internacional.
Durante a ordem do dia dessa quinta-feira (12), o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, confirmou que o projeto seria analisado pelas comissões temáticas antes de ser votado no Plenário.
Pacheco disse que tomou a decisão em uma reunião com o presidente da Comissão do Meio Ambiente (CMA), senador Jaques Wagner (PT-BA), e com o presidente da Comissão de Agricultura e Reforma Agrária (CRA), senador Acir Gurgacz (PDT-RO). A relatora da matéria, senadora Kátia Abreu (PP-TO), e outros senadores também participaram da reunião.
Segundo Pacheco, a tramitação do projeto pelas comissões será uma oportunidade para ouvir a sociedade civil e especialistas, para que o tema seja estudado com profundidade. Ele ressaltou que a preservação ambiental é importante também para a questão econômica, fato reconhecido em todo o mundo.
— Temos que ter uma obstinação muito grande pela preservação do meio ambiente no Brasil. Não podemos apartar o país de uma questão que é mundial — argumentou Pacheco.
Para o senador Gurgacz, a produção agrícola e os empreendimentos são imprescindíveis para o crescimento, para o aumento da produção de alimentos e para a melhoria de toda a nossa infraestrutura, mas não serão sustentáveis sem a preservação ambiental, sem o cuidado com o meio ambiente.
— Esse é um tema da maior importância para o país e nós precisamos aprovar isso o mais rápido possível. Combinou-se de tramitar a matéria em conjunto com a CMA e a CRA e assim começaremos a fazer na próxima semana, com audiências públicas, ouvindo a sociedade, convidando os demais parlamentares para debater.
Presidente da CMA, Jaques Wagner disse que não concorda com a rapidez na tramitação do projeto. No entanto, segundo ele, a decisão de enviar o texto para análise das comissões é melhor do que simplesmente votar diretamente no Plenário.
— Apesar de discordar do encaminhamento, considero menos ruim do que estava antes proposto, de levar direto para o Plenário. Continuo não entendendo o açodamento para a votação dessa matéria — afirmou.
Kátia, que além de relatora preside a Comissão de Relações Exteriores (CRE), disse que o país precisa dar atenção à questão ambiental, sob risco de não prosperar nos acordos previstos com a União Europeia.
Kátia informou que vai buscar o consenso em torno do texto do licenciamento ambiental. Segundo a senadora, é urgente que o Brasil reduza o desmatamento. Ela é autora de um projeto que trata desse assunto (PL 1.539/2021).
— São temas muito importantes para o planeta e o Brasil é um protagonista nesses assuntos — afirmou a senadora.
A senadora Eliziane Gama (Cidadania-MA) cumprimentou Pacheco pela decisão de aprofundar o debate. Ela disse que o texto deve ser aprimorado, com mais participação da sociedade. Segundo a senadora, a fragilidade da proteção ambiental pode gerar boicote de parceiros internacionais.
— Meio ambiente e economia são duas áreas que precisam andar de mãos dadas — declarou Eliziane.
O projeto prevê questões que envolvem tipos e dispensas de licenciamento, autodeclarações, prazos, responsabilidades, entre outras particularidades extensíveis a todos os entes da Federação.
O regramento da LGLA se estende a União, estados e municípios. Se houver diferenças nas legislações dos entes federados, deve prevalecer a norma mais benéfica ao meio ambiente, explica a consultora legislativa da área de meio ambiente Karin Kässmayer.
— A Constituição Federal, no seu artigo 24, inciso VI, estabelece a competência concorrente em matéria ambiental. Então, todos os entes da federação podem legislar sobre meio ambiente, estabelecer seus regramentos próprios de licenciamento ambiental e quando surge uma norma geral, ela vai nortear todo esse regramento que está abaixo. No entendimento hoje das normas concorrentes, entre a geral e as suplementares, a norma mais benéfica, mais protetiva ao meio ambiente prevalece perante a menos restritiva — afirmou Karin.
A atual proposta do marco legal do licenciamento esbarra em uma série de discordâncias ao ampliar e abranger em esfera federal questões polêmicas como dispensas licenciatórias.
Um dos pontos mais controversos é o artigo 8º do PL 3.729/2004, que apresenta uma longa lista de 13 dispensas de licenciamento para atividades potencialmente impactantes, entre elas:
. Obras de saneamento básico (tratamento de água e de esgoto sanitário);
. Manutenção em estradas e portos (dragagens);
. Distribuição de energia elétrica com baixa tensão (até 69 Kv);
. Obras emergenciais de infraestrutura;
. Pontos de entrega de produtos abrangidos por sistemas de logística reversa;
. Usinas de triagem de resíduos sólidos;
. Usinas de reciclagem de resíduos da construção civil;
. Pátios, estruturas e equipamentos para compostagem de resíduos orgânicos; e
Ecopontos e ecocentros, destinados a entrega de resíduos de origem domiciliar para a reciclagem.
— O que chama a atenção são alguns empreendimentos ou atividades que são potencialmente poluidores e que geram impactos ambientais. Também não foi levado em consideração o porte desses empreendimentos, assim como o grau desse impacto — aponta Karin.
Algumas atividades agropecuárias também foram dispensadas de licenciamento, com as condicionantes de a propriedade estar regular no Cadastro Ambiental Rural (CAR), em processo de regularização ou ter firmado termo de compromisso para recompor vegetação ilegalmente suprimida.
Entraram nessa lista o cultivo de espécies de interesse agrícola (temporárias, semiperenes e perenes); pecuária extensiva e semiextensiva; pecuária intensiva de pequeno porte e pesquisa de natureza agropecuária, que não implique risco biológico.
O projeto de lei apresenta ainda a licença por adesão e compromisso (LAC), assim como a licença ambiental única (LAU), novidades no ordenamento federal, mas já instituídas nos estados.
O procedimento de licenciamento ambiental contempla a necessidade de as autoridades envolvidas se manifestarem em empreendimentos que estejam em áreas protegidas, em torno de unidades de conservação, terras indígenas ou áreas tituladas a remanescentes de comunidades quilombolas.
Essas manifestações precisam ser feitas por entidades como a Fundação Nacional do Índio (Funai), o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) e o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio).
Mas pelo atual texto, a manifestação das autoridades envolvidas não vincula a decisão da autoridade licenciadora, outro ponto bastante polemizado.
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